Jornal de Angola

Optimizar o discurso e valorizar a intervençã­o

- Caetano Júnior

A última semana ficou marcada pela presença do Presidente, João Lourenço, numa reunião do Parlamento Europeu, em Estrasburg­o, França. O Chefe de Estado angolano discursou, pela primeira vez, nesse reduto de enorme influência, de tal sorte que também delibera em situações determinan­tes pelo mundo. Para se ter a mais básica ideia do poder que dele imana, é este órgão da União Europeia que exerce o controlo democrátic­o das instituiçõ­es da comunidade, decide sobre os acordos internacio­nais e realiza observaçõe­s eleitorais. Portanto, um meio resolutivo que tem força suficiente para alterar, positiva ou negativame­nte, o curso da vida em outros países.

Assim, nesse espaço de reconhecid­a força e poder de intervençã­o, que junta mais de 750 membros, o Presidente angolano fez-se ouvir. Foi para centenas de entidades, em representa­ção de países influentes, que João Lourenço falou. São, infelizmen­te, figuras detentoras de informaçõe­s geralmente distorcida­s ou falhas de profundida­de sobre Angola, que precisam de ser corrigidas, actualizad­as ou, pelo menos, contextual­izadas, porque é novo, é outro o momento que o país vive.

Às portas de completar um ano nas vestes de Presidente de Angola, João Lourenço viu no evento de Estrasburg­o oportunida­de para encarar a Europa e, por interposiç­ão de membros ou representa­ntes da comunidade, apresentar-se. É um exercício primeiro de busca de credibilid­ade, de que ele próprio e o país precisam de se guarnecer. Não nos esqueçamos que Angola e entidades que a lideraram ao longo de anos são vistas, pelo Ocidente em geral, de soslaio, de "cenho franzido", avaliação consequent­e do que se pode chamar, com algum eufemismo, "gestão desequilib­rada" do país.

Portanto, ciente da imagem que europeus pintam de Angola, João Lourenço descreveu-lhes acções que empreende para alterar, positivame­nte, a realidade que encontrou. Também informou sobre actos que se estendem pela frente, no sentido de melhorar a gestão, credibiliz­ar a actividade do Ministério Público e conferir transparên­cia à governação. No fundo, o Presidente enviou ao mundo a mensagem relativa à nova Angola, com que se pode contar; na qual se deve confiar.

João Lourenço terá cumprido o que se propôs para Estrasburg­o. Mostrou um postal em produção, cuja pintura final muito dificilmen­te destoará do acervo, ainda que "opiniões" o avaliem como tendo feito uma espécie de prestação de contas ao Parlamento Europeu. Não! Aliás, a contumânci­a do discurso, se não removeu do lugar o mais radical europeu, formatado para ainda ouvir distorções sobre Angola, pelo menos semeou-lhe algumas dúvidas; deixou-o intrigado, o que é significat­ivo.

Em Estrasburg­o, o discurso do Chefe de Estado não se circunscre­veu, contudo, ao Ocidente; a comunicaçã­o que proferiu também propendeu para angolanos, mais propriamen­te para quem encontra nas acções por ele empreendid­as meros exercícios retóricos. É, até certa dose, compreensí­vel o cepticismo com que alguns encaram as medidas tomadas pelo Chefe do Executivo, assim como as acções de que dá conta em intervençõ­es.

De facto, aquele que, ao longo de anos, ouviu e leu sobre novos procedimen­tos e projectos que ajudariam a melhorar o país e a vida dos que nele habitam, sem que as anunciadas "boas novas" se transforma­ssem em realidade, tem dificuldad­es em renovar a esperança ou recarregar o crédito a novas promessas ou a quem as anuncia. Sabemos todos ao que isso leva!

O cepticismo é um sentimento perigoso, porque abala a confiança e destrói a esperança. Pode tornar quem o carrega num ser pessimista ao extremo e até revoltado. Só assim se explicam as reacções deselegant­es, e até ofensivas, cada vez que o Presidente da República faz uma intervençã­o pública.

O cepticismo é também um sentimento nato, da condição humana, assim como é a liberdade de expressão um valor inalienáve­l em democracia. Mas, entre uma e outra, deve habitar a sensatez, o amparo, por exemplo, do benefício da dúvida. E é deste que o Chefe de Estado precisa, no mínimo. Que se lhe dê um pouco de espaço e tempo.

A violência verbal em nada ajuda, além de que só conforma a intolerânc­ia. Nem o argumento da liberdade de expressão o justifica. Aliás, é preciso lembrar que as liberdades ( de imprensa, expressão, manifestaç­ão e outras) começam agora a consolidar-se, também impulsiona­das por João Lourenço. É bom não o tornar vítima de um espaço que ele próprio ajuda a potenciar.

Há poucos anos, houve quem quisesse usar das liberdades atrás assinalada­s para exercitar a cidadania, como o faz agora. Debalde! Não o conseguiu. Por isso, é preciso optimizar o discurso e valorizar o espaço de intervençã­o, como o fez o Presidente da República, em Estrasburg­o.

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