As migrações africanas
O drama que constitui a actual saga de migração africana e a vergonha que o continente sente ao ver partir em condições desumanas milhares dos seus filhos para uma Europa que já demonstrou, das mais variadas formas, que não os quer lá, é um assunto que deveria mobilizar a atenção das suas diferentes lideranças.
O assunto não é novo, mas ganha maior actualidade depois que se conhecem algumas das propostas que países europeus, que se dizem “amigos” de África, acabam de apresentar.
De Itália, país cuja politica acaba de guinar à direita, por força da entrada em cena de um novo governo, chega a oferta de oito barcos para que a guarda costeira líbia faça com mais eficácia o papel de impedir que imigrantes que usem a sua vasta zona costeira se façam ao mar em direcção a águas europeias.
Devido à sua proximidade geográfica com a Líbia, a Itália é dos países que mais imigrantes africanos tem recebido e também aquele onde acabam de ser tomadas as medidas mais drásticas para os rejeitar, mesmo que isso configure a violação de direitos humanos.
A França, através de Emmanuel Macron, apresentou na Nigéria uma proposta que visava a construção, também em território líbio, de quatro “centros de acolhimento” para africanos que cheguem ao país com o objectivo de se fazerem ao mar em busca de uma vida melhor.
Nesses “centros de acolhimento” ficariam – caso a ajuda seja aceite – homens, mulheres e crianças que fossem apanhados em “trânsito” para o sonho europeu.
Os conflitos internos e a generalizada crise económica do continente são, reconhecidamente, as razões que levam ao fomento do terrorismo, da fome e da pobreza.
A conjugação desses factores, dá como resultado a existência de barcos cheios de pessoas desesperadas por uma vida melhor e que não hesitam em arriscar as vidas num processo migratório recheado de dramas humanos, nalguns dos casos fatais.
Até ao momento, África surge como simples fornecedora de uma mão de obra barata para a manufacturação de produtos e fonte exportadora de matérias primas. O nosso continente é, também, palco para grandes e pequenos negócios, maioritariamente favoráveis às empresas europeias.
As ajudas que a Europa tem oferecido a África não têm sido suficientemente efectivas para travar o fluxo migratório ou para ajudar a anular os fenómenos que o originam, uma vez que se ficam por medidas paliativas que apenas salvaguardam a manutenção das condições para que prevaleça a actual dependência que está na base de um relacionamento factualmente desequilibrado.
Para a Europa, o problema da migração resolve-se prendendo as pessoas, em terra ou no mar. Uma tarefa que a Europa entende dizer essencialmente respeito a África e que deve ser resolvido dentro das suas fronteiras continentais.
A Europa ainda não entendeu que precisa manter com África um tipo de relacionamento diferente do actual, mais vocado para a ajuda na resolução dos seus problemas de fundo, que começam muito antes dos imigrantes entrarem em barcos para se fazerem ao mar. Para reverter essa situação e melhor obrigar a Europa a ver o problema de modo correcto, os países africanos mais vergastados pelo actual fluxo migratório deveriam ter a coragem de dizer “não” ao fatalismo da sua pobreza, estabelecendo parcerias efectivas para a criação de estruturas básicas que fixem as suas populações, deixando de ser meros pedintes de ajudas pontuais destinadas apenas a enriquecer as suas respectivas elites.
Além do mais, a união e a solidariedade entre os africanos continua a ser um factor que, no caso da migração, não foi ainda suficientemente explorado para que se possa dizer que foi completamente esgotada a possibilidade de a uma só voz África impôr um novo tipo de parceria com a Europa.
Uma parceria mais igualitária e que salvaguarde aquilo que são os verdadeiros interesses dos dois continentes, tando do ponto de vista político como social e humano.