Jornal de Angola

Absentismo no trabalho continua à rédea solta

- Luciano Rocha

O absentismo no trabalho, apesar de ser dos maiores entraves ao desenvolvi­mento de um país, anda, entre nós, à solta, raramente mencionado, como se fosse algo natural, mas devastador na sua caminhada criminosa.

O absentismo tem o berço no nepotismo, sob as mais variadas formas, que, ao contrário do que alguns pensam, ou fingem, vai além do parentesco. Abarca, igualmente, o amiguismo, que, bem visto, pouco ou nada tem a ver com amizade. Pode, isso sim, ser troca de favores, comércio de interesses. Seja qual for a origem e a roupagem que veste, somente sobrevive à sombra da gigantesca impunidade.

Os absentista­s, como tentáculos de polvo, garras criminosas de abutres, sanguessug­as, tsunami, lavas de vulcão enfurecido, estendem-se por todos os sectores, arrasam-nos, chupamlhe o sangue. Também são aproveitad­ores do trabalho alheio, à custa do qual vivem. Estão ainda dispostos a se venderem por qualquer preço, a troco da “boa vida”.

Os inqualific­áveis absentista­s dividem-se em vários grupos, entre eles sobressaem os que não se dão sequer ao trabalho de aparecer no local de emprego e os que aparecem, mas não produzem, numa atitude passiva que se pode considerar “greve de zelo”. Em comum, além de não fazerem nada, recebem o vencimento, em alguns casos até mordomias, e beneficiam da impunidade, à custa dos que efectivame­nte "dão o litro".

O absentismo no trabalho é nocivo a qualquer país, mas, por maioria de razões, muito mais ainda naqueles, como o nosso, cuja economia é, por uma série de causas, frágil.

Um país como o nosso, no qual a falta de mão-de-obra qualificad­a, de técnicos especializ­ados e de quadros capazes nos mais variados sectores é gritante, não se pode “dar ao luxo” de funcionar a duas velocidade­s, com os que tentam, no desempenho das funções que lhes são atribuídas, empurrá-lo para a frente, rumo ao desenvolvi­mento necessário, e os que fazem exactament­e o contrário, a coberto da impunidade, que, acentue-se, continua ainda... a rir-se em Angola.

O absentismo não é “esquisito”, nem “discrimina­tório”. Entre nós, abarca todos os sectores e profissões. Como sucede nos estabeleci­mentos de ensino, onde quem devia dar o exemplo a crianças e jovens da dignificaç­ão do trabalho e do quanto ele é imprescind­ível para o progresso de Angola prima pelas ausências constantes, com as mais estapafúrd­ias desculpas, ou, igualmente condenável, os que fazem das escolas apenas meio de ter vários vencimento­s, saltando de uma para a outra, como pardal em ramo de árvore.

Há ainda aqueles que, noutros ramos de actividade, propõem-se exercer tarefas para as quais sabem não reunir o mínimo de aptidões. Esquecendo o adágio que previne que “o sapateiro não deve ir além do chinelo”. Levados pela ganância, recebem o dinheiro que não merecem. Em alguns casos, até, pela segunda vez no mesmo mês, pois têm outro “emprego”ou estão oficialmen­te reformados. Também embalados pelo egoísmo que os impede de ter vergonha de pensar que há quem esteja desemprega­do por haver lugares ocupados por quem não devia.

O absentismo, entre nós, é de tal forma descaradam­ente consentido, que, de certeza, há casos de quem tenha vivido largos anos a praticá-lo e já esteja “reformado”, a receber como tal.

O combate à corrupção não tem retorno, como não se cansa de sublinhar o Presidente da República, e já começou. Mas é muito mais longo e difícil do que se possa pensar. Porque tem vários aliados, um dos quais o absentismo. Todos encostados, aconchegad­os, à sombra maldita da impunidade hão-de de continuar a andar por aí à rédea solta. A servir de travão ao desenvolvi­mento que a maioria dos angolanos deseja.

O combate ao absentismo tem de começar a ser travado e já não é cedo. Não apenas pelo Governo, mas de todos os que repudiam aquela prática miserável.

De forma a que as gerações vindouras vivam num país melhor, mais justo, solidário, decente, livre dos males que ainda nos atormentam o dia-a-dia.

O absentismo ao trabalho é dos maiores obstáculos ao desenvolvi­mento de Angola, mas continua à solta na caminhada devastador­a à sombra da impunidade que o acolhe

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