Jornal de Angola

Habitantes tomam controlo de município

- Victor Carvalho

Cansados da má governação que afectava o quotidiano de um município da cidade de Koster, na província sul-africana de North West, os habitantes decidiram desafiar as autoridade­s, tomando o controlo da gestão, de modo a satisfazer as necessidad­es básicas. Trata-se de uma decisão inédita, no país, mas que se pode alastrar a um ano da realização de eleições

Há dois meses a província sul-africana de North West, a mais rica do país em platina, esteve nas páginas dos jornais por força do braço de ferro entre o então Governo local e o Presidente Cyril Ramaphosa tendo por fundo as queixas da população relacionad­as com práticas de corrupção.

Na altura, o Presidente sulafrican­o foi obrigado a chamar a si a solução do problema demitindo o primeiro-ministro local, Supra Mahumapelo, criando uma equipa de trabalho dependente do Governo central que se encarregar­ia de administra­r a província até às próximas eleições.

De início a situação melhorou, com a população a aplaudir as mudanças registadas em sectores como a Educação e a Saúde, bem como no início de trabalhos para a recuperaçã­o de algumas estradas e no abastecime­nto de água e de energia eléctrica.

Porém, na pequena cidade de Koster as coisas foram diferentes, pois os responsáve­is das respectiva­s municipali­dades não conseguira­m resolver os problemas, sobretudo no que respeita ao saneamento básico e nos sectores de abastecime­nto de água e de energia eléctrica.

No topo das críticas está a actuação de Kim Medupe, a "mayor", do município de Kgetlengri­vier, com 50 mil habitantes, e que acaba de ser expulsa pela população, depois de violentas manifestaç­ões nas quais era acusada de corrupção.

Kim Medupe havia sido das poucas responsáve­is municipais a escapar à purga ordenada pelo Presidente Ramaphosa para repor a boa governação em North West, permanecen­do oito anos no cargo.

Durante os protestos, que a obrigaram a fugir para a cidade de Koster, os populares incendiara­m tudo o que sabiam estar em seu nome: a residência, uma clínica e um pequeno empreendim­ento turístico.

Uma questão de prioridade

A população acusa-a de ter priorizado o uso dos dinheiros públicos para asfaltar uma estrada que dava ligação directa às suas propriedad­es, em detrimento do pagamento às empresas que estavam a reabilitar o abastecime­nto de água e de energia eléctrica, obras que entretanto paralisara­m por falta de verbas para a aquisição de material.

Na sequência das manifestaç­ões foram detidas 30 pessoas, que aguardam julgamento por desacato e incitament­o à destruição de bens materiais de uma entidade com responsabi­lidades públicas.

Entretanto, a população juntou-se e resolveu assumir a liderança pela recuperaçã­o técnica de alguns dos serviços básicos do município, tendo já entregue junto dos tribunais de Koster uma petição para legalizar a sua acção.

Numa decisão surpreende­ntemente rápida, tendo em conta a habitual lentidão da Justiça sul-africana, o tribunal respondeu favoravelm­ente à petição estando agora uma equipa indicada pela população a gerir os serviços de abastecime­nto de água para os cerca de 50 mil habitantes do município.

Com a mayor do município “refugiada” em Koster, o exemplo do que se está a passar em Kgetlengri­vier pode alastrar-se a outros municípios sul-africanos onde a má governação está a ser vivamente contestada nas ruas por milhares de habitantes locais.

O partido no poder, o ANC, ainda não tem definida uma política em relação a estas contestaçõ­es, mas ao absterse de intervir no caso de Kgetlengri­vier como que legitima as populações a erguerem a voz para denunciar casos de corrupção e de má governação e, em casos pontuais e legalmente aceites, poder mesmo tomar em mãos sectores locais de governação.

Por isso, o eventual sucesso no exemplo de gestão governativ­a no pequeno município de Koster pode ser determinan­te para aquilatar a possibilid­ade de outras populações também chamarem a si a responsabi­lidade de resolução de alguns dos seus problemas básicos.

Isto, a um ano da ida às urnas, pode ter um impacto determinan­te para a divisão de votos, com uma clara vantagem para o ANC por ser o partido que está a permitir esta nova forma de gestão municipal.

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DR A um ano das eleições uma nova forma de gestão pode favorecer o partido governamen­tal

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