Jornal de Angola

Cuanza-Norte abre campanha do café

Campanha de colheitas deste ano foi aberta ontem na fazenda Paiva Castro, em Cacanga, no município do Golungo-Alto num momento de cepticismo, a julgar pela recusa dos comerciant­es em comprar café por 200 kwanzas o quilo

- Isidoro Natalício | Ndalatando

A campanha de colheita do café, na província do Cuanza-Norte, foi aberta ontem, no município do Golungo- Alto, pelo governador José Maria dos Santos. Este ano a produção baixou por razões de ordem financeira.

Produtores de café robusta no Cuanza-Norte esperam colher 600 toneladas, menos 200 em relação ao ano passado, colocando a província no terceiro lugar no contexto nacional, superada pelo Cuanza-Sul e Uíge, com 3.500 e 1.600 toneladas.

A colheita do corrente ano, aberta ontem na fazenda Paiva Castro, em Cacanga, Golungo Alto, acontece num momento de cepticismo, a julgar pela recusa dos comerciant­es em comprar o café ao produtor no valor de 200 kwanzas o quilo.

“Recusamos porque não temos capacidade para comprar a 200 kwanzas, mas sim a 120”, disse o representa­nte da empresa Mafecom, Félix Nunda.

Por falta de entendimen­to em torno dos preços, alguns cafeiculto­res preferem manter o produto em armazém, a exemplo de Maurício Pedro, que cultiva na região do Bumba, Golungo Alto. “As 2.500 toneladas do ano transacto continuam à espera de comerciali­zação e este ano prevejo produzir mais 3.000 toneladas”, disse.

Além da redução da produção, a retracção na comerciali­zação do bago vermelho reduziu de 719 para 600 o número de produtores, no dizer do chefe do Departamen­to do Cuanza-Norte do Instituto Nacional do Café, Costa Neto.

Os problemas na produção de café são uma constante desde 1974, quando os portuguese­s abandonara­m as fazendas que foram nacionaliz­adas, o que resultou na criação de 33 empresas estatais, que tinham como principal função a gestão das plantações.

As empresas territoria­is de café então criadas tiveram debilidade­s de gestão, por inexperiên­cia do pessoal e insuficiên­cia de matériapri­ma. A crise produtiva atingiu o clímax entre 1985 e 2002, devido à guerra civil que provocou um novo abandono das fazendas, ausência de capina e outros procedimen­tos agrotécnic­os, destruição e avaria dos sistemas de descasque, máquinas agrícolas, bem como das infraestru­turas de apoio, como hospitais, lojas, sistemas de água e estradas.

Com produção residual e valor comercial nulo, vastas extensões de café começam a ser substituíd­as por culturas de subsistênc­ia, como a banana e a mandioca. “Era a luta pela sobrevivên­cia, devido á perda de valor comercial do café”, disse Cândida José, uma camponesa de 74 anos.

A idade dos cafeiculto­res, a maioria acima dos 65 anos, começa a tornar-se um obstáculo à prática da cafeicultu­ra. Por isso, numa mensagem lida na cerimónia solene de abertura da campanha de colheita, Maurício Pedro pediu ao Governo para adoptar medidas que incentivam a juventude a envolver-se na produção de café.

As cifra actuais de produção no Cuanza-Norte e no país em geral são baixíssima­s, se comparadas com as da década de setenta, quando Angola tinha 525 mil hectares plantados, rendimento de 400 quilos por hectare e uma produção de 220 mil toneladas, convertend­ose no maior produtor de África e o terceiro do mundo, só superado pelas Repúblicas do Brasil e Colômbia.

O café robusta tinha em 1973 uma área global de 496.300 hectares, com rendimento de 407 quilos por hectare, hoje reduzidos a cinco por cento, estando abandonado­s noventa e cinco de área de cultivo.

Relançamen­to da produção

O relançamen­to da produção tarda a chegar, mas algumas iniciativa­s acontecem nas regiões tradiciona­is de cultivo de café robusta, como Bengo, Cabinda, Cuanza-Norte, Cuanza-Sul e Uíge.

Por exemplo no CuanzaNort­e, os cafeiculto­res Paiva Castro e Maurício Pedro estão a substituir o cafezal velho com a produção em média de duas mil mudas por ano no último quinquénio. Maurício Pedro disse que 65 hectares, nos seus 100 em produção, já são cafeeiros com dois anos de idade.

O governador do CuanzaNort­e, José Maria dos Santos, anunciou que o Governo Provincial, em colaboraçã­o com o Ministério da Agricultur­a, levará a cabo um programa na região, que visa a promoção do cultivo de café, traduzido em apoios práticos.

Segundo o governador, está em projecção a produção de 500.000 mudas de cacau, café e palmar.

Na Gabela, Cuanza-Sul, há o projecto-piloto “Reabilitaç­ão das plantações de café abandonada­s em pequenas unidades de produção familiar em Angola”, no valor de oito milhões e meio de dólares, financiado­s pelo Governo de Angola e a Common Fund for Comodities (CFC) da Holanda. Atribuíram-se parcelas de dois a cinco hectares a quatro mil agricultor­es, que receberam crédito bancário (dos quais 50 por cento não reembolsou). Mais de dois mil produtores, extensioni­stas e cientistas foram formados em vários aspectos da produção de café, processame­nto e marketing, espelha um relatório da multinacio­nal Nestlé.

“Foi adquirido equipament­o, incluindo kits de prova de café, de amostra de terra, tractores e outros veículos. O projecto-piloto terminou em 2013 e o alcance foi muito limitado, relativame­nte ao resto das áreas de cultivo, e não foi ampliado para um programa maior de desenvolvi­mento do café.”, lê-se no documento.

Em relação ao café arábica cultivado no Huambo, Bié, Huíla e em Cassongue (Cuanza-Sul) salienta-se a entrega recente de 300 mil mudas, que podem atingir 150 hectares. Os maiores entraves centram-se na existência de solos ácidos e ausência de fertilizan­tes.

Previsões para a colheita

As previsões para a presente campanha de colheitas no país cifram-se em 5.840 toneladas, sendo 5.680 toneladas de robusta repartidas pelas províncias do Uíge, Cabinda, Cuanza-Norte, Bengo e Cuanza-Sul e 160 toneladas de arábica no Bié e Huambo.

A província do CuanzaSul pode ter novamente a maior colheita (3.510 toneladas) e na base de um preço médio de 300 kwanzas por quilo esperaram-se receitas globais no valor de um bilião 752 milhões de kwanzas.

O rendimento médio por hectare fixado para as famílias camponesas da região é 280 quilos.

“O ideal seria uma tonelada por hectare”, no dizer do agrónomo Pedro João.

O relatório de balanço do Instituto Nacional do Café (IINCA) referente à campanha passada o país arrecadou um milhão 289 mil e 909 dólares, resultante da exportação de 714.300 quilos.

Especialis­tas estimam que o país necessitou de 985 toneladas e meia para o consumo interno. A Organizaçã­o Internacio­nal do Café (OIC) revela que em África só um por cento da população consome café.

Com produção residual e valor comercial nulo, vastas extensões de café começam a ser substituíd­as por culturas de subsistênc­ia, como a banana e a mandioca

 ??  ?? NILO MATEUS | EDIÇÕES NOVEMBRO A idade dos cafeiculto­res, a maioria acima dos 65 anos, começa a tornar-se um obstáculo à prática da cafeicultu­ra
NILO MATEUS | EDIÇÕES NOVEMBRO A idade dos cafeiculto­res, a maioria acima dos 65 anos, começa a tornar-se um obstáculo à prática da cafeicultu­ra

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola