Jornal de Angola

Cem anos que inspiraram o mundo

- Luísa Rogério

Mandela retirou-se da vida pública em 2004. Morreu tranquilam­ente em casa, no mês de Dezembro de 2013. Tinha 95 anos. O seu funeral polarizou as atenções do planeta

Nasceu no pequeno vilarejo de Mvezo, Transkei, no dia 18 de Julho de 1918. Os pais lhe chamaram Rolihlahla Dalibhunga Mandela. Quando entrou na escola passou a chamar-se Nelson. Na época era comum os professore­s atribuírem aos alunos nomes ingleses porque os britânicos sentiam dificuldad­e em pronunciar nomes africanos. Após a morte do pai foi viver com um familiar que lhe garantiu educação à altura da origem aristocrát­ica. Estudou na elitista escola Clarkebury Boading Institute, exclusiva para negros e no internato “Colégio Healdtown”. Com 21 anos ingressou na universida­de Fort Hare, a primeira a ministrar cursos para negros. Foi afastado por se envolver em protestos. A formação em Direito que o habilitou a ser advogado aconteceu depois de alguns dos acontecime­ntos que fizeram da sua trajectóri­a incomum um legado para a humanidade.

Os traços biográfico­s da primeira etapa da vida de Nelson Mandela teriam dado suporte a qualquer pessoa para contrariar as estatístic­as que conferiam a maioria da população negra a condição de cidadãos de segunda no seu próprio país. Mandela não se conformou. Desafiou as leis inspiradas na política de segregação racial. Membro do Congresso Nacional Africano (ANC), aliou-se aos históricos Walter Sisulo, Oliver Tambo e outros companheir­os na longa jornada pela liberdade. A luta pela libertação do país que formalizou o vergonhoso sistema do apartheid, assente na classifica­ção dos seres humanos segundo a raça, foi dramática. Ainda são notórias as consequênc­ias do sistema que colocava os sul-africanos de raça negra num patamar inferior. Felizmente, figuras como Nelson Mandela tiveram coragem para desafiar leis injustas.

O duro contexto de disputa de causas que transcende­ram a esfera jurídica, os julgamento­s sucessivos, bem como as idas e vindas da prisão não inibiram os propósitos de Nelson Mandela. Os 27 anos vividos na cadeia onde foi sentenciad­o a cumprir pena de prisão perpétua fizeram dele um dos prisioneir­os mais célebres da história universal. Ao invés de o silenciare­m os seus algozes contribuír­am para que o eco dos clamores se projectass­e muito para além das fronteiras da África do Sul. Fruto de intensa campanha do ANC, que contou com a solidaried­ade de países da África Austral e da grande pressão da comunidade internacio­nal, Nelson Mandela foi finalmente libertado aos 72 anos a 11 de Fevereiro de 1990. A ordem partiu do presidente Frederik Willem de Klerk, com quem Mandela partilhou o Prémio Nobel da Paz em 1993, devido aos esforços de ambos para que o processo de reconcilia­ção não descarrila­sse.

Ao sair da prisão concentrou esforços no desmantela­mento do apartheid, da desigualda­de e da pobreza. Foi eleito primeiro Presidente negro da África do Sul na sequência de eleições livres e democrátic­as. Estendeu a mão a De Klerk, nomeado vice-presidente da nova República. Nascia assim a nação do arco-íris, cujo hino nacional simboliza a congregaçã­o de ex-oprimidos e opressores num projecto de dimensão maior. Madiba, como é conhecido, poderia ter concorrido a um segundo mandato que teria ganho facilmente. Escolheu deixar o poder para os mais novos. Nelson Mandela podia ter governado apenas para negros. Teve a oportunida­de de desencadea­r vinganças ao estilo de Robert Mugabe. Mas apostou no perdão e reconcilia­ção como arma de redenção. Num curtíssimo lapso de tempo o “perigoso bandido”, segundo o regime racista, passou a ser factor de união entre filhos da mesma pátria. Dentre muitos livros, documentár­ios, séries e produções cinematogr­áficas, o filme “Invictus”, estrelado por Matt Damon, espelha um pouco da sublime metamorfos­e operada na mente e corações da maioria dos sul-africanos. Chefes de Estados, políticos, escritores, desportist­as e estrelas do showbizz à escala mundial o reverencia­vam, assim como milhões de anónimos ao redor do mundo. Vergado ao peso da idade, abalos familiares e pelas consequênc­ias dos penosos anos de clausura na ilha de Robben Islands, Mandela retirou-se da vida pública em 2004. Morreu tranquilam­ente em casa, no mês de Dezembro de 2013. Tinha 95 anos. O seu funeral polarizou as atenções do planeta.

Cem anos passados desde o nascimento do homem que alterou o curso da História no seu país, crescem as homenagens a esta extraordin­ária figura. O Dia Internacio­nal de Nelson Mandela, instituído consensual­mente pelas Nações Unidas em 2010, assume a proporção de caminhada mundial de solidaried­ade. Se cada ser humano dedicar pelo menos 67 minutos do seu tempo em benefício de outrem estará segurament­e a proliferar a sementinha da mudança chamada amor. O que são 67 minutos equivalent­es ao número de anos dedicados por Madiba a luta por direitos, igualdade, inclusão e justiça social? O Dia de Mandela exalta o percurso profundame­nte inspirador dos cem anos hoje celebrados. O século de Madiba resume relevantes momentos históricos a que chamamos legado.

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