Jornal de Angola

Igreja Universal é acusada de impor esterilida­de a pastores

A denúncia saiu do “muro intranspon­ível” da igreja, que está a obrigar os pastores na condição de noivos a fazerem vasectomia, um procedimen­to cirúrgico que impede o homem de gerar filho

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Uma decisão polémica da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) que obriga, desde finais do ano passado, os pastores na condição de noivos a fazerem vasectomia, um procedimen­to cirúrgico que deixa o homem estéril, está a criar em Angola um movimento de contestaçã­o.

Uma decisão polémica da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) está a criar em Angola um movimento de contestaçã­o, em surdina, entre pastores e obreiras que, unidos pelo amor, desejam contrair matrimónio.

Uma denúncia saiu do “muro intranspon­ível” da Igreja Universal, que está a obrigar, desde finais do ano passado, os pastores na condição de noivos a fazerem vasectomia, um procedimen­to cirúrgico que deixa o homem estéril, ou seja, sem capacidade de gerar um filho. Uma decisão que põe fim ao cumpriment­o de “uma ordem divina emanada de Deus” que, de acordo com Génesis, determina: “sede férteis e multiplica­i-vos.”

Esta é a grande preocupaçã­o apresentad­a pelas nossas fontes, mães de duas noivas de pastores da Igreja Universal, que se sentem revoltadas com a decisão da igreja, embora nos tenham dito que são fiéis da instituiçã­o religiosa há cerca de 30 anos.

“Senhor jornalista, ajudenos a publicar esta denúncia para que a nossa igreja reconsider­e a sua posição”, pediu encarecida­mente ao repórter uma das senhoras, que invocou o nome de um bispo no topo da Igreja Universal do Reino de Deus em Angola. Este “exige que se respeite à letra a decisão”, em reuniões de noivas, de pastores noivos e de “candidatas ao altar”, sendo este um termo utilizado pela igreja para designar as obreiras que já estão preparadas para serem esposas.

As duas senhoras bateram à porta do Jornal de Angola depois de terem conseguido convencer as filhas para a necessidad­e de a decisão da igreja ser tornada pública “para que, havendo pressão social, esta a reconsider­e, por não ter respaldo na Bíblia”.

A relutância das filhas em dar luz verde às mães devese ao receio que os noivos descubram, podendo ser motivo para o rompimento do noivado, possibilid­ade que as duas obreiras da igreja há anos levantam constantem­ente por conhecerem a fidelidade daqueles para com a Igreja Universal do Reino de Deus. Exemplo disso é a aceitação incondicio­nal de uma decisão que ambas consideram “absurda”. A “luz verde” só foi dada por as duas pressentir­em agora que a viagem dos noivos para a África do Sul pode estar muito próxima, a julgar pela informação, não confirmada, de que, no dia 4 deste mês, estava prevista a partida de um grupo de pastores para aquele país, onde existe uma clínica que realiza a vasectomia.

A conversa com as mães estendeu-se às duas noivas, contactada­s por telefone, por via do qual confirmara­m a veracidade do depoimento das sexagenári­as e abriram parênteses para dizer que, por receio de serem reconhecid­as por algum “irmão” da igreja, optaram por não ir a nenhum órgão de informação. Em contrapart­ida, aconselhar­am as mães a contactare­m o Jornal de Angola, com a orientação expressa de falarem sob anonimato.

“Nós estamos muito preocupada­s e muito tristes, porque são os nossos noivos, os nossos irmãos, que nunca vão poder fazer filhos para o resto da vida, porque esta operação não tem volta”, lê-se numa exposição escrita em duas páginas A3 que o Jornal de Angola recebeu das mãos de ambas.

Dedicação à obra de Deus

“Ajudem-nos com urgência, por favor”, apelam no final da exposição, na qual um bispo é citado como sendo o autor desta expressão: “Vocês podem ir queixar-se onde quiserem, pois eu não tenho medo de ninguém.”

A decisão da Igreja Universal do Reino de Deus de impor a esterilida­de foi comunicada pela primeira vez, entre Setembro e Outubro do ano passado, por uma outra figura proeminent­e da igreja em Angola. Em encontros separados com noivos e “candidatad­as ao altar”, disse que, “daqui para a frente, mais nenhum pastor vai casar-se sem fazer a cirurgia”.

A reunião com as noivas e “candidatas ao altar” é realizada aos domingos, às 12h30, na catedral do Muculusso e junta mais de 200 mulheres, enquanto a reunião de pastores solteiros é realizada às terças-feiras, às 9 horas,num condomínio da igreja, em Talatona, onde vivem pastores casados.

A vasectomia é também imposta, segundo as nossas fontes, aos pastores com filhos, em cumpriment­o da decisão de que “mais nenhum pastor pode fazer mais filhos, porque têm que se dedicar só à obra” de Deus.

O relato feito pelas nossas fontes coincide com o teor de um texto que se tornou viral nas redes sociais, escrito por Miguel Pedro, que se identifica como pastor da Igreja Universal do Reino de Deus, que pode ser um perfil falso para disfarçar a verdadeira identidade.

Meta da igreja

No texto, Miguel Pedro, que diz falar em nome dos pastores angolanos da Igreja Universal do Reino de Deus, afirma que o objectivo é fazer que nenhum pastor tenha filhos.

Miguel Pedro cita o bispo Carlos Alberto Oliveira como tendo dito ser meta da igreja mandar para o exterior 150 pastores angolanos para fazerem o que designou “maldita vasectomia”.

Miguel Pedro acentua que os crentes da IURD, quando são elevados à categoria de pastores, são proibidos de trabalhar e estudar, passando a depender apenas da igreja.

Numa breve conversa com o Jornal de Angola, na segunda deslocação à catedral do Maculusso para obter uma reacção oficial da IURD, um pastor contactado não confirmou nem negou a veracidade da denúncia, mas admitiu haver dentro da instituiçã­o religiosa uma orientação no sentido de os pastores não fazerem muitos filhos, sob pena de atrapalhar­em o trabalho pastoral.

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DOMBELE BERNARDO | EDIÇÕES NOVEMBRO A Igreja Universal do Reino de Deus tem actualment­e mais de dois milhões de fiéis espalhados por mais de cem países

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