Jornal de Angola

Os dilemas da CASA-CE

- Fonseca Bengui

O acórdão n.º 497/2018 do Tribunal Constituci­onal acaba de destapar os dilemas em que a CASA-CE se encontrava desde a sua criação em 2012 e que o seu líder, Abel Chivukuvuk­u, tentou solucionar ao longo dos últimos anos sem sucesso.

A CASA-CE foi formalment­e criada como coligação de quatro partidos políticos - PADDA (Aliança Patriótica), PALMA (Partido de Aliança Livre de Maioria Angolana), PNSA (Partido Nacional de Salvação de Angola) e PPA (Partido Pacífico Angolano), que sobreviver­am às eleições de 2008, mas sem grande expressão política. A plataforma nasceu tendo como maior capital político figuras sem filiação partidária, mas que, na base de um acordo de cavalheiro­s, se perfilaram na primeira linha, dando rosto ao projecto: Abel Chivukuvuk­u - o principal arquitecto e impulsiona­dor -, que tinha acabado de abandonar uma militância de mais de três décadas na UNITA, André Gaspar Mendes de Carvalho “Miau”, filho de um histórico do MPLA, que acabava de abdicar de um cargo de chefia no Ministério da Defesa, e Lindo Bernardo Tito, deputado do PRS durante 16 anos, que abandonou o partido por divergênci­as com a liderança. Estes, e outras figuras conhecidas, mobilizara­m milhares de cidadãos na mesma condição (sem filiação partidária), em todo o país, ingressand­o directamen­te na coligação, como “militantes”.

Segundo relatos, a ideia inicial dos promotores do projecto era a criação de um partido político. Receios de que o poder então instituído colocasse obstáculos ao reconhecim­ento de uma formação política liderada por Abel Chivukuvuk­u, inviabiliz­ando a sua participaç­ão nas eleições que já estavam à porta, levaram os impulsiona­dores da iniciativa a optar por contactar algumas formações políticas já existentes, que assegurari­am, no plano jurídico, a concretiza­ção do projecto, através de uma coligação.

Ficou assente, logo no início, a ideia da transforma­ção da coligação em partido, após as eleições. Esta intenção viria a ser reafirmada, um ano depois no 1º congresso extraordin­ário da coligação em 2013, fixando 2016 como meta para a efectivaçã­o e conclusão do processo. Em 2016, o 2.º congresso reafirmou a intenção e orientou os órgãos executivos a iniciarem o processo junto do Tribunal Constituci­onal (TC), que em Janeiro de 2017 chumbou a pretensão, por falta de consentime­nto de três dos quatro partidos então coligados, a saber, PADDA, PNSA e PPA.

Não obstante ter decidido avançar para as eleições de 2017 depois desse revés, pode dizer-se que a partir desta decisão do TC, a coligação deixou de ter condições para realizar o seu projecto inicial, por divergênci­as, aparenteme­nte insanáveis, entre o arquitecto da coligação e os seus integrante­s. Na base desses desentendi­mentos, cinco dos seis partidos membros - em 2017 juntaram-se à coligação o PDPANA e o Bloco Democrátic­o - solicitara­m ao TC esclarecim­ento sobre o papel do presidente da coligação, a distribuiç­ão dos fundos alocados pelo OGE e a estrutura de funcioname­nto da organizaçã­o. No acórdão que nega a principal pretensão dos partidos - a entrega directa a cada um do dinheiro que a coligação recebe do OGE -, o TC dá razão às formações políticas, consideran­do que as decisões do líder da coligação - ou de qualquer outro órgão -, não se devem sobrepor à vontade dos partidos coligados. O TC rejeita a legitimida­de das estruturas da CASA-CE, do topo à base, que funcionam como se de um partido distinto da coligação se tratasse. Esta estrutura, diga-se, é integrada, de forma esmagadora, por cidadãos não filiados nos partidos coligados, os chamados “independen­tes”. O acórdão nega, precisamen­te, legitimida­de a esses “militantes” de integrarem os órgãos de direcção da coligação, com excepção de Abel Chivukuvuk­u, cuja autoridade emana do acordo constituti­vo.

Segundo o líder de um dos partidos, Manuel Fernandes, todos os secretário­s provinciai­s e municipais indicados pelos partidos coligados foram substituíd­os por “independen­tes” e dos 27 membros do Conselho Presidenci­al os partidos estavam representa­dos apenas pelos presidente­s.

O acórdão do TC veio separar as águas e revelou o terreno movediço em que a CASA-CE foi erguida. Dir-se-ia mesmo que Abel Chivukuvuk­u construiu a organizaçã­o em terreno alheio. Agora, vê-se confrontad­o com vários dilemas: abandonar a plataforma, com o risco de perder o património e o capital investido no projecto; introduzir mais partidos na coligação, para equilibrar as forças, pretensão que pode ser vetada pelos actuais membros da coligação; e aceitar renegociar a partilha do poder, mas sempre com o risco de vir a ser apeado a qualquer momento, porque, à luz do acórdão, os partidos são os únicos “donos” da coligação.

Os partidos integrante­s da CASA-CE também enfrentam os seus dilemas. O maior deles é que, sem o grupo de Abel Chivukuvuk­u, a coligação não terá pernas para andar, correndo o risco de não eleger nenhum deputado ou ser mesmo extinta.

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