Kofi Annan é sepultado hoje em Accra
Antigo Secretário-Geral da ONU vai hoje a enterrar em Accra, num cemitério militar, onde jazem altas individualidades do país. Para representar o Chefe de Estado angolano, está no Ghana o Vice-Presidente da República, Bornito de Sousa.
O antigo Secretário-Geral da ONU e Nobel da Paz Kofi Annan, falecido a 18 de Agosto aos 80 anos, é hoje sepultado no novo cemitério militar de Accra, capital do Ghana, num funeral que conta com a presença de vários Chefes de Estado e de Governo, diplomatas e responsáveis das Nações Unidas. O Governo do Ghana decretou três dias de luto nacional. O Vice-Presidente da República, Bornito de Sousa, em representação do Chefe de Estado, João Lourenço, juntou-se ontem aos vários estadistas em Accra.
O falecimento, a 18 de Agosto, aos 80 anos de idade, de Kofi Annan, Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) de 1997 a 2006, comoveu o Mundo. Annan é sepultado hoje. Vários Estadistas, dirigentes políticos, desportistas, músicos, actores e pessoas comuns manifestaram-se, sobretudo, nas redes sociais da Internet.
Nascido a 8 de Abril de 1938 em Kumasi, Ghana, Kofi Annan foi o primeiro negro africano a ocupar o cargo e o primeiro funcionário da ONU a ascender ao secretariado-geral, tendo também sido responsável por Missões de Paz em períodos críticos como o do genocídio no Ruanda e a Guerra dos Balcãs na década de 90.
Kofi Annan casou-se duas vezes. Com a primeira esposa, a nigeriana Titi Alakija, teve dois filhos, Kojo e Ama. Foi também casado com a advogada e artista sueca Nane Maria Annan, que tem uma filha, Nina, do casamento anterior.
Timor Leste
De notar que foi Annan quem organizou o referendo para a independência de Timor Leste, quando António Guterres, actual Secretário-Geral da ONU, era primeiroministro de Portugal, o que deu origem ao nascimento do primeiro país independente do século XXI.
Coube a Kofi Annan, poucos minutos depois da meianoite de 20 de Maio de 2002, entregar formalmente Timor-Leste aos timorenses numa cerimónia que marcou a restauração da independência do país. A notícia do falecimento de Kofi Annan foi, assim, recebida com muita consternação naquele país. Ramos-Horta, antigo Presidente timorense, recordou que “ele cumpriu com o seu compromisso em que disse que queria ver resolvido o conflito em Timor-Leste. Dinamizou a questão nomeando um representante especial, dinamizou encontros trilaterais, com a ONU, a Indonésia e Portugal.”
“O nome dele ficará sempre recordado neste país. E espero que o nosso Estado se faça representar no seu funeral ao mais alto nível. Já alertei o Governo para ver como honrar Kofi Annan”, acrescentou.
Enquanto Presidente da República, Ramos Horta atribuiu a Annan o galardão mais alto do país, a Coroa da Ordem de Timor-Leste.
Kofi Annan estudou Economia e licenciou-se em Relações Internacionais e uma das suas grandes batalhas foi o desenvolvimento dos países africanos.
Em 2001, ganhou, em parceria com as Nações Unidas, o Prémio Nobel da Paz, pela criação do Fundo Global de Luta contra a Sida, Tuberculose e Malária para ajuda aos países em desenvolvimento.
Carreira na ONU
Annan integrou os quadros da ONU em 1962 como funcionário administrativo da Organização Mundial de Saúde, em Genebra, e mais tarde trabalhou para a Comissão Económica para a África, em Addis Abeba.
Antes de se tornar Secretário-Geral das Nações Unidas, foi subsecretário-geral para a manutenção da paz e foi o representante especial do então Secretário-Geral, o egípcio Boutros BoutrosGhali, na ex-Jugoslávia, em 1995/96.
Kofi Annan aproveitou o seu último discurso como líder das Nações Unidas, em Dezembro de 2006, para criticar a Administração norteamericana liderada por George W. Bush, ao acusar os Estados Unidos de abusarem contra os direitos humanos em nome do combate ao terrorismo.
Já antes, em Março de 2003, havia criticado os EUA por invadirem o Iraque sem a aprovação do Conselho de Segurança das Nações Unidas. “Quando o poder, especialmente a força militar, é usado, o mundo só o considerará legítimo quando estiver convencido de que está a ser usado para um fim correcto”, disse ele no discurso proferido na Biblioteca presidencial de Harry Truman, no estado do Missouri.
O ex-primeiro-ministro do Reino Unido, Tony Blair, disse no Twitter ter ficado chocado e angustiado com a morte do diplomata. “Ele era um amigo que vi há poucas semanas. Kofi Annan era um grande diplomata, um verdadeiro Estadista e um colega maravilhoso”, escreveu Blair.
Na nota de condolências, a actual primeira-ministra britânica, Theresa May, considerou Annan “um grande líder e reformador da ONU” que “deu o seu enorme contributo para o mundo que deixou num lugar melhor.”
Momentos turbulentos
Findo o mandato na ONU e no seu regresso ao Ghana, Annan foi logo apontado como candidato a presidente do país. Envolveu-se com inúmeras organizações com foco tanto global quanto africano. Em 2007, foi nomeado presidente do comité de premiação do Mo Ibrahim Prize for Achievement in African Leadership. Foi escolhido para liderar a nova formação da Aliança para a Revolução Verde em África (AGRA), tornou-se membro do Global Elders, foi designado presidente do Fórum Humanitário Global em Genebra e foi seleccionado para o prémio da Fundação MacArthur por Justiça Internacional. Em 2008, Kofi Annan foi nomeado chanceler da Universidade do Ghana e inscreveu-se para ser um dos conselheiros da One Young World, organização sem fins lucrativos que pretende reunir 1.500 jovens líderes globais do amanhã de todos os países do mundo.
Annan morreu num hospital de Berna, na Suíça. As causas da morte não foram reveladas. Durante os dois mandatos, Kofi Annan passou por momentos turbulentos, como o atentado terrorista contra as Torres Gêmeas a 11 de Setembro de 2001. Também foi alvo de duras críticas no período em que chefiou operações de paz, antes de assumir como Secretário-Geral. As tropas da ONU não conseguiram impedir o genocídio de mais de 800 mil pessoas no Ruanda, em 1994, e oito mil na Bósnia no ano seguinte.
A luta contra a pobreza, o drama dos refugiados, os desafios do subdesenvolvimento e a Sida ganharam mais espaço na pauta da ONU sob a liderança de Kofi Annan, que ajudou a criar os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio que estabeleceram, pela primeira vez, metas para acabar com a pobreza, a mortalidade infantil e melhorar a educação.
Kofi Annan é considerado um dos secretários-gerais mais carismáticos da história das Nações Unidas. O actual Secretário-Geral da ONU, o português António Guterres, disse que ele vai continuar a ser uma enorme fonte de inspiração. Guterres equiparou a sua figura à da própria organização. “Kofi Annan era, de muitas formas, as Nações Unidas”, afirmou.
Kofi Annan aproveitou o seu último discurso como líder das Nações Unidas, em Dezembro de 2006, para criticar a Administração norte-americana liderada por George W. Bush, ao acusar os Estados Unidos de abusar contra os direitos humanos em nome do combate ao terrorismo