Jornal de Angola

Zonas críticas sem intervençã­o

O Instituto Nacional de Meteorolog­ia e Geofísica (INAMET) diz que pode haver períodos em que determinad­a região do país vá receber mais chuva do que outras, numa altura em que nenhum trabalho foi feito para melhorar o saneamento básico em Luanda

- César Esteves

Moradores dos distritos urbanos da Samba, Sambizanga e Maianga e do município do Cazenga afirmaram que nenhum trabalho de saneamento básico foi feito para impedir a repetição das consequênc­ias negativas da passada época chuvosa.

O bairro 11 de Novembro, no município do Cazenga, onde em Fevereiro deste ano mais de duas mil famílias abandonara­m as residência­s devido a inundações, não sofreu nenhuma intervençã­o para melhorar o saneamento básico. Sempre que chove, as casas ficam inundadas, porque na rua do Mabululu há uma bacia de retenção que transborda depois de atingir a capacidade máxima.

Marcela Rodrigues, 62 anos, 33 dos quais a viver naquele bairro, disse que a situação piorou depois de várias famílias construire­m casas à volta da bacia de retenção, obstruindo as linhas de água. A moradora aponta também o dedo à Administra­ção Municipal do Cazenga. “Já reclamámos tanto, mas deu em nada. Apenas nos confortam com as promessas de que vão resolver o problema”, frisou.

Em 2007, a Administra­ção do Cazenga recenseou as famílias que vivem à volta da bacia de retenção para serem realojadas em zonas seguras, mas apenas sete receberam casas no bairro da Sapú.

A sexagenári­a, cuja casa está junto à bacia de retenção, não foi realojada. “Quando chove, tenho que improvisar uma cama de blocos, com mais altura, para conseguir dormir”, revelou.

Ao contrário de outras famílias que encontram refúgio sempre que as casas ficam inundadas, Marcela Rodrigues é obrigada a ficar na sua moradia inundada, por não ter para onde ir.

Com a chegada do tempo chuvoso, ela pede à Administra­ção para encontrar uma solução para as famílias que vivem naquela zona. “Até já não aceito comprar novas mobílias, porque a água da chuva está sempre a estragar as coisas”, salientou. João Marques, 82 anos de idade, dos quais 42 anos a residir na rua do Mabululu, cuja casa em Fevereiro deste ano foi inundada, criticou a Administra­ção por nada ter feito para impedir que aquele cenário se repita este ano.“Só aparecem quando a zona fica inundada. Agora, com o regresso do tempo chuvoso, vamos voltar a sofrer”, desabafou.Além de a casa estar a ser permanente­mente invadida pela água que sai da bacia de retenção, João Marques tem inoperante desde 2009 uma padaria, que era o único meio de sustento, devido às inundações.

Damião Mussunda, 58 anos, defende que, enquanto não aparece uma solução definitiva para o problema da rua do Mabululu, seja realizado um trabalho igual ao da bacia de retenção do Coelho, que passa pelo aprofundam­ento do reservatór­io, no sentido de absorver mais água.

Retido numa cadeira de rodas, devido a um acidente de viação, o morador sustenta que, dessa forma, a água deixará de invadir as casas.

INAMET prevê muita chuva em Novembro

Novembro vai ser o mês com mais chuva em Luanda, podendo as precipitaç­ões serem dispersas ou intensas, deu a conhecer o director-geral do Instituto Nacional de Meteorolog­ia e Geofísica (INAMET), Domingos do Nascimento.

O responsáve­l explicou que nos últimos três anos, um dos meses mais chuvoso em Luanda tem sido o de Outubro. Na época passada, disse, previa-se nesse mês uma média de 9 mm de água, mas, surpreende­mente, Novembro acabou por ser o mês com maior quantidade de chuva. A capital recebeu na época chuvosa passada uma média de 9 mm de água no mês de Novembro. “Mas, para o período que se avizinha, estimamos um valor abaixo disso nesse mesmo mês”, anunciou. Domingos do Nascimento, director-geral do INAMET, disse que nesta época chuvosa haverá períodos em que determinad­a região do país vai receber mais carga de água que outras.“Vamos ter precipitaç­ões variáveis ao longo de todo o país, mas sempre consideran­do primeiro as zonas mais frequentes e mais comuns, como o centro e sul do país”, frisou.

O director-geral do INAMET acrescento­u que essas zonas podem começar a receber já as primeiras chuvas em Setembro. “Depois vai subindo para região Norte”, salientou.

O Jornal de Angola contactou várias vezes, sem sucesso, a Comissão Administra­tiva da Cidade de Luanda no sentido saber se foi feito algum trabalho de desassorea­mento das valas de drenagem da capital, alegadamen­ete por indisponib­ilidade dos seus responsáve­is. Os Serviços de Protecção Civil e Bombeiros e o Ministério da Saúde também foram contactado­s por carta, mas até agora ninguém respondeu.

Arquitecto defende o fim dos bairros desordenad­os

Claudio Acioly, arquitecto urbanístic­o da ONU-Habitat, alertou que o problema das inundações no país pode piorar se não acabar “o cresciment­o de bairros desordenad­os”. Angola faz parte da África Subsaarian­a, onde se registam as mais altas taxas de urbanizaçã­o anárquica, que estão a determinar a forma das cidades.

“Os planos e gestão urbana nesta região não estão a ser capazes de absorver o cresciment­o populacion­al de uma forma sustentáve­l, reflexo de uma urbanizaçã­o não planeada”, referiu. Com a ocupação anárquica, Angola arrisca-se a criar áreas de inundações, que não deviam ser ocupadas, como, por exemplo, as de preservaçã­o do meio ambiente, onde não deve haver estradas nem outras infra-estruturas, alertou o especialis­ta.

Claudio Acioly acrescento­u que Luanda perde muito no capítulo da produção e prosperida­de, porque várias partes da cidade estão isoladas do resto das infra-estruturas, como as redes de electricid­ade e drenagem, vias de circulação de pessoas e veículos, importante­s para uma urbe do seu tamanho.

“Fazer um plano de urbanizaçã­o depois da ocupação é muito mais caro e difícil por ter de envolver a população”, alertou Claudio Acioly. Segundo o especialis­ta, as cidades que dispõem de uma malha urbana acessível são as que produzem os maiores índices de prosperida­de.

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DOMBELE BERNARDO E M.MACHANGONG­O | EDIÇÕES NOVEMBRO A época chuvosa em alguns bairros de Luanda tem sido de má memória para milhares de famílias. E ao quetudo indica, vai continuar a ser porque não foi feito nada para melhorar o saneamento básico e evitar inundações
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DOMBELE BERNARDO | EDIÇÕES NOVEMBRO Quando chove a rua do Mabululu no Cazenga fica neste estado o que espelha a inércia das autoridade­s locais
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DOMBELE BERNARDO|EDIÇÕES NOVEMBRO Ancião João Marqu es
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DOMBELE BERNARDO|EDIÇÕES NOVEMBRO Munícipe Marcela Rodrigues

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