Desemprego adia o sonho da casa própria
O número de moradias à venda ainda está muito aquém da procura por pessoas que sonham, há anos, com casa própria, em áreas que assegurem qualidade de vida
O desemprego e a falta de um salário compatível para concorrer aos projectos imobiliários do Estado colocam o sonho de aquisição de uma casa mais distante dos jovens em Angola. Para piorar, a oferta de casas no país ainda está muito abaixo da procura. Na reportagem, jovens contestam as formas de acesso aos programas.
O sonho da casa própria está cada vez mais distante para muitos jovens em Angola, tudo porque uns estão desempregados e outros não têm salário capaz de concorrer aos projectos imobiliários do Estado.
Outra preocupação está na reduzida disponibilidade de casas que o programa ha-bitacional do Estado pôs, até hoje, à disposição da população, estando o número de moradias à venda muito aquém da grande procura por pessoas que sonham, há anos, pela casa própria, mas em áreas que asseguram qualidade de vida.
A Imogestin, a imobiliária que substituiu, desde 2015, a Sonip na gestão dos projectos imobiliários do Estado, anunciou, recentemente, em comunicado, a venda em Outubro de mais moradias na província de Luanda.
Desta vez, os beneficiários vão ser apenas trabalhadores da Função Pública e de empresas, públicas e privadas, porque a venda livre ao público já foi feita, com a comercialização de 1.300 casas no ano passado.
Ao contrário da Sonip, que havia determinado o recurso à ida à fila para a obtenção de moradias, a Imogestin criou três modalidades de acesso às casas existentes em centralidades construídas em algumas províncias, nomeadamente, a “Venda Dirigida ao Público”, “Venda à Função Pública” e “Venda às Empresas”, públicas e privadas.
Pessoas de várias idades abordadas pelo Jornal de Angola convergiram no seguinte ponto: embora tenha havido muita desorganização, ainda é melhor o recurso à fila porque nenhuma das três modalidades dão inteiramente garantias de transparência.
Na fase de vendas em Outubro, 70 por cento das casas vão ser comercializadas à Função Pública e 30 por cento a trabalhadores de empresas interessadas. Além disso, 40 por cento das vendas em cada modalidade têm de ser para pessoas com menos de 40 anos. No Zango Oito Mil estão disponíveis 2.627 moradias, no Zango Zero 336 e 338 no KM44.
O assessor jurídico e portavoz da Imogestin, Mário Guerra, disse ao Jornal de
Angola que, em Outubro, das 2.627 moradias disponíveis no Zango Oito Mil apenas 1.839 vão ser comercializadas e, no Zango Zero, das 336 disponíveis 224 são destinadas à Função Pública e 112 a trabalhadores de empresas. No KM44, das 338 habitações disponíveis, 237 vão ser para funcionários públicos e 101 para trabalhadores de empresas. O maior número de casas do Zango 800 que vão ser vendidas em Outubro, o que corresponde a 70 por cento do total disponível, é para funcionários públicos.
Lamento de jovens
Mãe de duas meninas, Lurdes Tchanique, funcionária de uma concessionaria de vendas de automóveis no município de Viana, é o reflexo da desolação da maioria dos jovens, marcada pela falta de esperança.
As condições impostas para a aquisição de moradias deixa Lurdes Tchanique sem alguma esperança. O seu salário não é compatível ao custo de vida, além de que a empresa para a qual trabalha "não está nem aí" com as condições de habitabilidade dos seus funcionários, ao contrário de outras que aparecem como fiadoras dos seus trabalhadores.
A viver numa casa arrendada, por 25 mil kwanzas/mês, a jovem faz, com o magro salário, um ginástica financeira para sustentar as filhas, às quais deseja dar um melhor conforto, sonho que pretende concretizar numa das novas urbanizações construídas na província de Luanda.
Lurdes Tchanique afirma que a política habitacional do Executivo deveria ser mais inclusiva, com o objectivo de facilitar a vida das pessoas, muitas das quais, além de serem novos no mercado de trabalho, não têm bons salários para solicitar crédito à habitação aos bancos comerciais.
Também inquilino, Marcelo Quintas tem uma vida paradoxal. Trabalha para uma imobiliária, sendo, por este motivo, alvo, às vezes, de chacota, em tom de brincadeira, por amigos e familiares, que acham absurdo ele não ter casa própria quando trabalha para uma imobiliária em Luanda.
Marcelo Quintas só não obteve uma moradia, em 2013, por não ter acreditado no processo da Sonip, numa altura em que trabalhava para uma empresa petrolífera, que o dispensou, no âmbito de um plano de redução de pessoal devido a crise económica e financeira instalada no país, há quase quatro anos. “Quando abriram as inscrições, em 2013, não levei muito a sério", disse Marcelo Quintas, que, além de estar arrependido, reconhece que as possibilidades já não são as mesmas.
O jovem disse esperar que o Executivo crie outras políticas para salvaguardar a situação dos jovens que trabalham para pequenas empresas, a maioria das quais evita comprometer-se com a Imogestin. Além disso, defende créditos à habitação bonificados.
Propriedade resolúvel
O porta-voz da empresa Imogestin, Mário Guerra, disse que o termo correcto para definir a forma com que a maioria dos habitantes já aderiu aos projectos habitacionais do Estado é “propriedade resolúvel” e não “renda resolução” e ele explica o porquê. O conceito real é “propriedade resolúvel”, porque o arrendamento não é venda.