Sector imobiliário empobreceu 90 por cento
Os factores que influenciam o fraco desempenho do sector imobiliário são o cancelamento de financiamentos por parte dos bancos e a incursão de um número significativo de mediadores do mercado não profissional
O mercado imobiliário do país perdeu 90 por cento dos investimentos, entre os anos 2014 e 2016, informou o secretário da mesa da Associação dos Profissionais Imobiliários (Apima), Massada Culembala.
Antes da crise que o país vive, o ramo imobiliário privado manteve-se forte nos anos 2010-2013, época em que a procura e a oferta foram inevitavelmente maiores, impulsionadas pela produtividade do sector petrolífero, que facilitou mais investimentos entre os profissionais do mercado e seus parceiros e, em particular, entre o Estado e a banca.
Em entrevista ao Jornal de Angola, Massada Culembala informou que a decadência do mercado imobiliário reduziu bastante a procura, culminando com a paralisação de muitos projectos habitacionais. No caso particular de Luanda, segundo o especialista, estão paralisadas mais de 300 obras habitacionais no mercado imobiliário privado, resultante do baixo rendimento entre os promotores, mediadores e a banca, sobretudo, no que diz respeito ao crédito malparado, aumento de juros e cancelamento de financiamento. Massada Culembala contou que outros factores que influenciam o fraco desempenho do sector imobiliário são o cancelamento de financiamentos por parte dos bancos e a incursão de um número significativo de mediadores do mercado não profissional. Segundo o profissional, as obras inacabadas empataram 50 por cento do crédito bancário, o que fez com que o financiador não disponibilizasse mais parcelas para a conclusão das mesmas.
O sector bancário continua a ser o principal elo de ligação entre os promotores e os mediadores do mercado imobiliário público e privado. Porém, o perito Massada Culembala explica que, antes, os bancos disponibilizavam créditos para a construção de residências. “Infelizmente, com o aparecimento da crise económica e financeira e com um bom
número de obras inacabadas, tudo culminou com créditos malparados, o que impede a execução de novos financiamentos”, admitiu.
Segundo evidencia, para a execução de projectos residenciais, deve cumprir-se alguns requisitos, como aquisição de terreno, arquitectos para desenhar o esboço, construtora e, por último, a banca como principal financiador. “Logo, sem a participação da banca, o promotor não consegue desenvolver nenhum projecto”, assinalou.
Para a melhoria do ambiente de negócio no sector, Massada Culembala disse que o Estado, a banca e a Apima devem traçar parcerias estratégicas, com o objectivo de se dar uma nova dinâmica ao sector e encontrar-se soluções para os projectos por terminar, seja públicos seja privados. “Isto porque, com as obras paradas, o promotor e os bancos ficam prejudicados, uma vez que parte do financiamento investido também fica paralisado”, alegou.
Estado
O Estado é o principal regulador e mediador no sector imobiliário do país, tendo em conta as suas responsabilidades acrescidas. Nesse quadro, Massada Culembala quer que o Estado intervenha no mercado, definindo quem deve promover os projectos habitacionais e quem deve fazer o papel de mediador e consultor imobiliário.
Especialista em Direito Imobiliário, Massada Culembala é também avaliador em activos vivos e mortos e exerce, actualmente, a função de director-geral das empresas Dikilama e Diakumbo Imobiliária. Numa primeira fase, o especialista aconselha que o Estado, enquanto entidade reguladora, atribua a carteira profissional aos promotores mediadores e exija que os mesmos estejam associados à Apima.
Para Massada Culembala, o processo de atribuição de carteiras profissionais resultaria na diminuição de fraudes, burlas e falsos profissionais no mercado. “Devemos evitar que erros do passado voltem a acontecer entre os mediadores,
promotores e clientes, como é o caso específico do Projecto Bem Morar, entre outros de carácter público”, relatou.
O representante da Apima informou que a província de Luanda tem perto de 10 mil promotores não associados, que exercem actividades no sector imobiliário, resultando, muitas vezes, em burla na compra e venda de imóveis.
“E necessário inverter o imediatismo, para se disciplinar os actores do mercado imobiliário angolano, que cresce desordenadamente”, aconselhou. Massada Culembala alerta os cidadãos interessados na aquisição de terrenos ou de residências a dirigirem-se à Apima, para lhes serem indicados os verdadeiros profissionais do sector capazes de auxiliar no processo de compra ou venda.
A Associação dos Profissionais Imobiliários dispõe, também, de um departamento jurídico, que permite proteger ou sancionar associados ou clientes que não cumprirem com as regras estabelecidas.
Segundo Massada Culembala, quando o Estado zela pelos bens públicos, os processos correm claramente e sem constrangimentos. Como exemplo, Massada Culembala realçou a imobiliária Imogestin, empresa dedicada ao negócio da promoção, mediação e gestão de empreendimentos imobiliários e fundadora da Apima, a quem o Estado delegou e confiou para promover projectos habitacionais e sociais das novas centralidades implementadas a nível das províncias.
Zonas de maior acesso
O actual gestor das empresas imobiliárias Diakumbi e Dikilama disse que, no período que vai de 2017 ao primeiro semestre de 2018, a procura aumentou de 10 para 15 por cento, mas somente fora do centro da cidade. Massada Culembala disse que as zonas mais procuradas são os municípios de Viana, Belas e Talatona, por oferecerem melhor oferta, em termos de preço.
Actualmente, na zona do Talatona, os preços de uma residência de alto padrão estão em torno de um a cinco milhões de dólares. Já em Viana, em particular na zona do Zango, as casas andam à volta de dois milhões de kwanzas. Nos últimos cinco anos, a parcela de terreno para a implementação de projectos habitacionais rondou cinco milhões de kwanzas. Hoje, a mesma parcela custa um milhão de kwanzas.
Financiamento
Para melhor esclarecimento sobre o processo de financiamento, o Jornal de Angola, contactou o gestor e representante da Abanc, Amílcar Silva, que afirmou que os bancos continuam disponíveis para financiar projectos, mas somente para indivíduos com capacidade de endividamento. Segundo Amílcar Silva, com o surgimento da crise económica, as condições se deterioraram, incluindo os salários que, na conjuntura, deixaram de ser suficientes, gerando o baixo poder de compra, influenciado pela inflação que ronda os 30 por cento.
“Logo, o financiamento só é disponibilizado a pessoas que têm capacidade de pagar dívidas”, sustentou Amílcar
Silva, acrescentando que outra razão do não financiamento é que grande parte dos indivíduos que pretendem adquirir empréstimos bancários para aquisição de um imóvel já beneficiou de créditos ainda não liquidados. “Enquanto a entidade financiadora não tem retorno do financiamento disponibilizado, não tem como voltar a dar, pois, de contrário e se a devolução não se procede num prazo determinado, a entidade financiadora é forçada a confiscar o imóvel, para recuperar a parcela injectada num determinado projecto”, frisou.
Amílcar Silva afirma que o sector imobiliário privado não consegue comercializar as residências, porque continua a implementar preços excessivos, o que impossibilita ao cidadão a sua compra. Na sua visão, a paralisação de muitos projectos promove, também e muitas vezes, o crédito malparado, que actualmente ronda os 30 por cento.
Renda resolúvel
Amílcar Silva apela aos promotores do sector imobiliário privado para enveredarem pelo sistema de renda reso-
lúvel, aplicando preços mais baixos e acessíveis, para facilitar a população economicamente activa.
Para o gestor bancário, o sistema de renda resolúvel é a forma mais correcta para inverter o quadro no sector, já que esta forma de pagamento oferece como vantagens um valor fixo, sem taxas de juros, que um cidadão pode pagar, com menos pressão, a longo prazo. “Caso os promotores implementem este sistema, vai diminuirse o número de obras paradas e a possibilidade de se aceder novamente ao financiamento bancário, para a efectivação de mais projectos”, sublinhou Amílcar Silva, que apela por uma maior reflexão sobre o sistema de pagamento aos profissionais do sector privado, já que a concorrência aumentou, com a construção de novas centralidades do Estado, que muito facilitam, hoje, a vida dos cidadãos.
“A renda de casa numa centralidade tem em conta pressupostos que o sector privado não possui, assim como a renda resolúvel é um sistema mais viável para o crédito bancário”, esclareceu Amílcar Silva.