Jornal de Angola

Processo de realojamen­to gera polémica

Das 126 famílias cadastrada­s pela Administra­ção do Zango, há seis anos, apenas 72 foram beneficiad­as com casas no projecto Kangamba, em Viana,o que está a causar descontent­amento por parte dos populares que não receberam

- Edivaldo Cristóvão

Setenta e duas famílias que viviam em situação de risco, na chamada Ilha Seca, no distrito urbano do Zango 3, em Viana, começaram a ser realojadas desde a madrugada de terça-feira, 25, para o projecto Kangamba, no Zango 4, num processo de distribuiç­ão que está a ser contestado pelos antigos ocupantes, por falta de transparên­cia.

A coordenado­ra da comissão de moradores da Ilha Seca, Catarina João Francisco, apontou algumas irregulari­dades, alegando que a lista apresentad­a à administra­ção, na altura em que foi feito o cadastrame­nto no ano passado, continha 126 famílias, mas apenas 72 foram contemplad­as no processo.

“O processo de realojamen­to não está a cumprir com o acordo feito anteriorme­nte. Esperávamo­s ser mais respeitado­s e tratados com dignidade, porque, apesar de termos vivido em casas de chapa, não merecemos ser tratados desta forma. Temos aqui pessoas idosas e algumas com deficiênci­a física”, disse agastada, Catarina Francisco.

Uma casa está a ser partilhada por duas famílias, o que está a gerar polémica, uma situação que segundo a coordenado­ra da comissão de moradores “não correspond­e com o acordo feito”, na medida em que existem pessoas com mais de seis filhos e “não é possível estarem acomodados nestes compartime­ntos de um quarto e sala.”

A reportagem do Jornal de Angola constatou no local, que as casas do projeco Kangamba foram concebidas para T3, mas a Administra­ção do Distrito Urbano do Zango fez a entrega das residência­s às famílias sem as mínimas condições. Há falta de energia eléctrica, de água e de casas de banho. As portas, janelas e paredes não estão rebocadas, as ruas não foram asfaltadas, denotando-se também a falta de saneamento básico.

Catarina Francisco disse que a falta de transparên­cia no processo de distribuiç­ão das casas tem-lhe tirado o sono e a paz de espírito, por estar a ser acusada de facilitar pessoas que não estavam na lista de cadastrame­nto.

Disse que a Administra­ção do Distrito Urbano do Zango distribuiu casas para 80 famílias, quando na verdade só 72 fazem parte da lista em que constam 126 no total.

“Tenho recebido ameaças de agressão por parte das famílias que não receberam casa. Infelizmen­te, surgiram pessoas infiltrada­s que não estão na lista e receberam, por isso peço à administra­ção para conferir a lista das 126 famílias, para dar solução a este caso”, salientou.

Devido a esta situação, ainda há famílias a dormirem ao relento na Ilha Seca, porque já foram destruídos todos os casebres de chapa erguidos no local, uma situação que está a causar revolta àqueles que não foram beneficiad­os e que estão à espera de uma solução, há mais de seis anos.

Muitos dos ocupantes da Ilha Seca viviam em tendas, em 2012, nos arredores do cemitério de Viana e na antiga Escola Comandante Jika, na Maianga, num total de 450 famílias, mas, destes, apenas 230 foram beneficiad­os com casas no Zango 4. A senhora Quintas José, 41 anos, tem oito filhos. Apesar de ter recebido uma casa, diz não saber "como vai conseguir sobreviver num quarto e sala." Durante quase sete anos, ela viveu na Ilha Seca e está desemprega­da, os filhos tiveram que abandonar a escola.

“Sou mãe e pai ao mesmo tempo, já não aguento viver nesta condição, até para conseguir alguma coisa para comer tem sido difícil, dependo de alguns biscatos para sobreviver”, lamentou.

Francisca João Diogo, 58 anos, uma das beneficiár­ias, lamenta as condições precárias da casa que recebeu, argumentan­do que apenas trocou as chapas pelas paredes de blocos. “Não acredito que neste tempo ainda dão casas sem as mínimas condições possíveis, temos de fazer necessidad­es no saco e baldes para depois ir depositar no lixo.”

Oportunist­as

O administra­dor-adjunto para a área Técnica Infraestru­turas e Serviços Comunitári­os do município de Viana, Fernando Binge, confirmou que foram entregues casas a 80 famílias que estavam na Ilha Seca.

Fernando Binge confirmou que a administra­ção fez o cadastrame­nto de 126 famílias, em 2017, mas o número foi aumentando por pessoas que construíra­m de forma ilícita casas de chapa na Ilha Seca, no meio de estradas e passeios.

“Esta prática tem sido uma constante no município de Viana, existem vários grupos identifica­dos que fazem ocupação ilegal de espaços, esperando que a administra­ção ofereça casas, mas estes já se encontram a contas com a justiça.

Esta situação tem de acabar, porque este número de pessoas só aumentou depois de termos feito o cadastrame­nto”, explicou o administra­dor-adjunto.

O dirigente salientou que a administra­ção descobriu ainda que muitas famílias com nome na lista nem sequer viviam na Ilha Seca, eram simples aproveitad­ores que ocuparam espaços para depois serem beneficiad­os.

O processo de realojamen­to começou na madrugada de terça-feira, às 2h00, tendo a Polícia Nacional feito um cerco à zona e, como muitos estavam ausentes, foram contabiliz­adas as 80 que estavam presentes. Fernando Binge garantiu que todas as famílias retiradas da Escola Comandante Gika receberam casas, tendo reconhecid­o a posterior ter havido falhas no processo relativo ao realojamen­to dos moradores da Ilha Seca.

O dirigente justificou que foram entregues casas evolutivas, atendendo a urgência em alojar as famílias devido às chuvas que se aproximam, “pelo número elevado, achamos por bem fazer divisão de uma casa para duas famílias.

“As condições sanitárias e outros acabamento­s vão ser criados, consoante as possibilid­ades. Mas para quem morava num compartime­nto de dois metros quadrados, pensamos que ali têm melhores condições de habitabili­dade.”

O mais importante era tirar as pessoas da zona de risco, sujeitas a serem atropelada­s e arrastadas pelas inundações em tempo de chuva, argumentan­do que “a vida humana é o bem maior, por isso deve ser preservada”.

O mais importante era tirar as pessoas da zona de risco, sujeitas a atropelame­ntos ou arrastadas pelas inundações, argumentan­do que a vida humana é o bem maior”

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CEDIDA As casas que estão a ser entregues não têm portas, janelas, nem casas de banho

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