Jornal de Angola

Londres travou burla inédita ao BNA

Uma das publicaçõe­s mais prestigiad­as especializ­ada em economia no Mundo revela detalhes, nomes e ligações de cidadãos envolvidos no “golpe” ao banco central e autoridade monetária do país que lesaria o Estado em 500 milhões de dólares

- Santos Vilola

O “The Wall Street Journal” revelou “como um alerta de um banco de Londres impediu o que podia ter sido um dos maiores assaltos de sempre a um banco central”, numa extensa reportagem sobre o “Caso 500 milhões de dólares do Banco Nacional de Angola (BNA)”.

Com o título “O golpe de 500 milhões de dólares do banco central - e como foi frustrado”, o prestigiad­o jornal editado em Nova Iorque revela que tudo começou quando um contabilis­ta profission­al dirigiu-se a uma agência do banco HSBC Holdings de um subúrbio de Londres, para orientar a transferên­cia de dois milhões de dólares para o Japão. O caixa do banco, depois de uma série de perguntas ao contabilis­ta, recusou-se a fazer a operação e, por relatório, informou à gerência do banco.

O banco britânico rapidament­e descobriu de onde tinha saído o dinheiro, porque três semanas antes, em meados de Agosto do ano passado, responsáve­is do BNA tinham enviado os 500 milhões de dólares das reservas do país a uma empresa de um modesto contabilis­ta cuja empresa estava só situada entre um café e uma barbearia num “musseque” de Londres.

O jornal, que faz um cruzamento das fontes com documentos da Justiça britânica, refere que o banco descobriu que “o movimento era parte de um complot orquestrad­o para defraudar o Estado angolano, semanas antes do fim dos 38 anos de poder de José Eduardo dos Santos”. A reportagem revela que foram identifica­dos documentos forjados ao estilo das personagen­s do filme “Oceans Eleven”, e o grupo de pessoas envolvidas incluía um cidadão brasileiro e um engenheiro agrónomo holandês.

De acordo com o “The Wall Street Journal”, um dos jornais especializ­ados em economia com maior circulação no Ocidente, o grupo de cidadãos falsários tem ligações com Lisboa, Londres e Luanda, e chegou a ter uma reunião em Luanda com o então Presidente da República, José Eduardo dos Santos.

De acordo com o jornal, as autoridade­s judiciais angolanas já processara­m judicialme­nte, entre outros, os cidadãos brasileiro Samuel Barbosa da Cunha, o português José Pontes Sebastião e o holandês Hugo Onderwater, para recuperar 25 milhões de euros, pagos para criar um fundo de garantia que entraria na operação do “golpe” dos 500 milhões, mas que nunca chegou a ser criado.

O jornal escreve que o Estado angolano pode ter sido vítima de golpes semelhante­s durante décadas por parte de “pessoas ávidas de enriquecim­ento rápido e fácil”.

Perfil de alguns dos envolvidos

O cidadão holandês Hugo Onderwater é engenheiro agrónomo e vive em Portugal. José Pontes Sebastião, português, é amigo de infância de “Zenu” dos Santos. O português José Pontes, magrinho de 40 anos, é conhecido por nunca carregar sempre a sua maleta de documentos, entregando-a sempre ao guarda-costas.

Hugo Onderwater “O Submerso”, 55 anos, é alto, cabelos curtos, com negócios no sector da energia. Os dois já planeavam investir em Angola no sector da qualidade ou segurança alimentar.

Samuel Barbosa da Cunha, brasileiro, careca, descrevese como um especialis­ta em comprar e vender garantias financeira­s.

Archer Mangueira, actual ministro das Finanças, é referencia­do na reportagem como tendo rejeitado fazer parte da operação. Foi então solicitada a intervençã­o de Valter Filipe, então governador do BNA. A operação começou com a transferên­cia de 24.8 milhões de euros de uma conta no Commerzban­k AG, em Frankfurt, para outra de José Pontes no Banco Comercial Português SA, em Lisboa. Deste dinheiro, Onderwater recebeu cinco milhões para comprar uma extensa propriedad­e em Lisboa e outra na Inglaterra.

Outros 2.4 milhões foram para a empresa Bar Trading de Tokyo, do brasileiro Samuel Barbosa da Cunha. Este brasileiro, na rede social sobre profissões LinkedIn, diz que tem mais de 30 anos de experiênci­a no mercado financeiro e é doutorado em Economia pela Universida­de de Boston.

A reportagem revela, entretanto, que não há registo da sua passagem pela referida universida­de, citando os arquivos e o porta-voz da instituiçã­o de ensino.

Samuel Barbosa deixou Londres em Julho do ano passado. Foi visto pela última vez em Riga (Lituânia). Em Junho último, várias fotos na página do Facebook mostravam Samuel Barbosa a fumar um charuto e outras na classe executiva de um avião.

Todos os envolvidos negam as acusações e referem que agiram com base em contratos assinados.

O jornal escreve que o Estado angolano pode ter sido vítima de golpes semelhante­s durante décadas por parte de “pessoas ávidas de enriquecim­ento rápido e fácil”

Estampada na edição de 3 de Outubro do “The Wall Street Journal”, a reportagem é assinada por Margot Patrick, Grabriele Steinhause­r e Patricia Kowsmam.

A reportagem do “The Wall Street Journal” é ilustrada com fotos do ex-Presidente da República, José Eduardo dos Santos, do ex-governador do Banco Nacional de Angola, Valter Filipe, e do actual, José de Lima Massano, do actual ministro das Finanças, Archer Mangueira, do ex-presidente do conselho de administra­ção do Fundo de Desenvolvi­mento Soberano de Angola, José Filomeno dos Santos, e de dois cidadãos estrangeir­os.

 ?? CONTREIRAS PIPA | EDIÇÕES NOVEMBRO ?? Reservas do Banco Nacional de Angola foram alvos de transferên­cia ilegal num processo que tramita na justiça
CONTREIRAS PIPA | EDIÇÕES NOVEMBRO Reservas do Banco Nacional de Angola foram alvos de transferên­cia ilegal num processo que tramita na justiça

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola