Ataques armados inquietam os vizinhos
Os ataques armados a civis, perpetrados por grupos de radicais islâmicos na província moçambicana de Cabo Delgado tornam-se forte motivo de preocupação para as autoridades daquele país e de Estados vizinhos, em particular da Tanzânia.
Os ataques armados a civis que se repetem desde Setembro passado, perpetrados por grupos de radicais islâmicos na província de Cabo Delgado, no extremo norte de Moçambique, tornamse um forte motivo de preocupação para as autoridades daquele país e de Estados vizinhos, em particular da Tanzânia, mas também do Quénia e da Somália.
Na semana passada, a polícia tanzaniana anunciou a detenção de 104 indivíduos supostamente ligados a esses grupos, que, de acordo com as autoridades de Dar EsSalam, pretendiam estabelecer bases na província moçambicana de Cabo Delgado.
O inspector-geral da polícia da Tanzânia, Simon Sirro, corroborou com o que tem sido referido pelas forças da ordem em Moçambique, no que diz respeito a uma intensa troca de informações com os países vizinhos com vista a combater esses grupos.
Segundo essas informações, os ataques armados já provocaram a morte de perto de cem pessoas e a destruição de bens públicos e privados. As autoridades governamentais moçambicanas apelam à população para uma maior vigilância e à denúncia da presença de pessoas estranhas nas comunidades.
A polícia de Moçambique anunciou que, dos cerca de 200 indivíduos actualmente em julgamento, acusados de participação nos ataques, 29 são tanzanianos. Moçambique e Tanzânia têm uma longa fronteira. Simon Sirro afirmou que os grupos pretendem estabelecer bases em Moçambique.
“Mas estão a enganarse, porque temos boas relações com Moçambique e outros países vizinhos”, afirmou o oficial, adiantando que muitos dos agora detidos, incluindo raparigas, integraram o grupo que assassinou polícias e funcionários administrativos na província de Pwani, em 2016 e 2017.
Até agora, as autoridades tanzanianas não apontam o dedo à religião, por ser uma questão bastante sensível. Simon Sirro explicou que alguns integrantes do grupo foram mortos e outros foram detidos pela polícia, mas os que conseguiram escapar atravessaram a fronteira.
“Eles escondem-se nas florestas, aprendem a usar armas de guerra como a AK47. Essa tendência vem de países estrangeiros, não temos isso na Tanzânia”, disse.
Do lado moçambicano, o Governo enviou as Forças de Defesa e Segurança para combater esses grupos armados. Enqunto isso, dois académicos, João Pereira e Salvador Forquilha, acompanhados pelo líder religioso islâmico Saide Habibe, foram aos distritos de Mocímboa da Praia, Macomia, Chiúre, Pemba, em Cabo Delgado, e depois à província de Nampula, tentar descobrir os factores que contribuíram para os conflitos.
A missão concluiu que, embora o grupo seja denominado Al Shabaab, não é uma extensão do grupo radical da Somália, embora os métodos usados sejam idênticos. Grupos terroristas João Pereira corroborou, de certa forma, a versão governamental, apelidando os grupos de “terroristas”, e revelou que a ala militar do grupo foi treinada no Congo, Tanzânia, Quénia e Somália e pretende apenas criar “instabilidade na Região, para permitir o negócio ilícito no qual as suas lideranças estão envolvidas”.
O grupo instalou-se há vários anos na zona Norte da província de Cabo Delgado, primeiro como um movimento religioso, constituído maioritariamente por jovens muçulmanos, oriundos não só do distrito de Mocímboa da Praia, mas também de distritos circunvizinhos, e em finais de 2015 passou a incorporar células militares.
O sheik Saide Habibe disse que, inicialmente, o grupo era conhecido como Ahlu Sunnah Wa-Jammá, termo árabe que significa “adeptos da tradição profética e da congregação”, e contestava o islamismo que as comunidades locais praticam.
O facto de a população local os denominar Al Shabaab “pode levar-nos a um equívoco e pensarmos que é uma extensão do grupo radical da Somália, porque os métodos são similares”, disse. Os membros do grupo não levam os seus filhos às escolas formais, o que consideram “um pecado; andam munidos de armas brancas para simbolizar a “jihad”, que muita gente traduz como guerra santa, mas, na verdade, é uma palavra árabe que significa “esforço”. Eles não aceitam dialogar com as estruturas administrativas locais, não aceitam dialogar com ninguém”.
Os grupos radicais fazemse notar pela prática de actos de mutilação e pela decapitação de pessoas do sexo masculino e pelo rapto de raparigas. Dedicam-se a negócios ilícitos, ao abate de árvores e ao tráfico de rubis.