Terminam debates públicos das alterações à Constituição
Durante dois meses, a nova proposta da Constituição foi debatida em milhares de sessões
Os cubanos terminam amanhã os debates públicos sobres as alterações à Constituição, que incluem o reconhecimento da propriedade privada e o fim da busca da “utopia comunista”, sob o cepticismo dos adversários do Governo.
O Partido Comunista de Cuba propôs várias alterações à Constituição que vigora desde 1976 e colocou o novo documento à discussão dos cubanos, com uma forte participação da população.
Durante dois meses, em espaços públicos, o novo documento foi debatido em mais de três mil sessões, envolvendo muitos milhares de cubanos.
A nova versão da Constituição deverá ser referendada dentro de alguns meses, antes de entrar em vigor.
Os dirigentes cubanos dizem que o objectivo dos debates, que terminam amanhã, foi ouvir os cidadãos sobre questões tão relevantes como a organização política do país, o casamento entre pessoas do mesmo sexo ou o funcionamento da economia.
Mas, para os adversários do país, a alteração constitucional é apenas um pretexto para manter o 'status quo', evitando a possibilidade de profundas reformas, numa altura em que se assiste a alguma renovação no aparelho de poder.
A nova versão da Constituição continua a apenas permitir um único partido na ilha, o Partido Comunista, mas elimina a referência que determinava que o fim último do regime era atingir a “utopia comunista.”
A revisão constitucional também propõe o reconhecimento da propriedade privada, depois de, em 1959, Fidel Castro - o líder histórico da revolução cubana e Chefe de Governo e de Estado entre 1959 e 2008 - ter abolido esse conceito do léxico político nacional.
A atenuação do papel do Estado estende-se à economia, onde a proposta do Partido Comunista inclui o reconhecimento das leis de mercado com um factor na vida económica, embora elas devam ficar sob regulação governamental.
Com a nova abordagem, a Constituição passa a admitir os negócios privados e as cooperativas (fora do sector agrícola) como organizações legítimas de actividade económica. Ainda a este nível, a Constituição reconhece agora o investimento estrangeiro como “fundamental” para Cuba.
Em termos administrativos, o novo documento aponta para o desaparecimento das assembleias provinciais, agora substituídas por um governador, que presidirá a um conselho constituído por um corpo de líderes municipais.
Nem o sector social fica de fora desta revisão, com a identidade de género a ser incluída na proibição de formas de discriminação, bem como a permissão de casamentos entre pessoas do mesmo sexo.
Mas os detractores do regime cubano estão muito cépticos sobre esta proposta de revisão da Constituição, considerando que não são, verdadeiramente, reformas.
A publicação 'online' Havana Times, editada a partir da Nicarágua e com um leque de colaboradores que são opositores do Governo de Cuba, tem divulgado um conjunto de textos considerando a revisão constitucional como uma “fraude”, dizendo que muitas das propostas são meros exercícios de retórica.
Um dos pontos criticados tem sido a nova versão do artigo 3.º da Constituição que diz que a traição ao país é um dos mais sérios crimes e que quem o cometer “ficará sujeito a grave penalização.”
Mas, na discussão pública do documento de revisão, os cubanos parecem mais desagradados com a permissão de casamento entre pessoas do mesmo sexo, mesmo que seja uma medida defendida pelo partido governamental.
O rosto mais visível da proposta tem sido Mariela Castro, filha de Raul Castro, líder do Partido Comunista de Cuba, uma activa defensora desta alteração constitucional.
“A natureza diz que um casamento deve ser entre um homem e uma mulher”, explicava, à reportagem da estação Voz da América, Hilário Branche, que se auto-intitula um “revolucionário leal” e apoiante do Partido Comunista.
Repórteres da Associated Press, que observaram algumas das sessões de discussão pública que ocorreram por toda a ilha, regressaram com a sensação de que a nova Constituição procura sedimentar a linha política corrente, com alterações que são defendidas por revolucionários que lutaram ao lado de Fidel Castro e que querem assegurar-se de que nada mudará no país, agora que se estão a retirar da vida política activa.
Com a nova abordagem, a Constituição passa a admitir os negócios privados e as cooperativas (fora do sector agrícola) como organizações legítimas de actividades económicas