Jornal de Angola

Executivo afirma ter saldado dívida mas reclamante­s dizem o contrário

Ministério da Administra­ção Pública, Trabalho e Segurança Social assegura que o pagamento das compensaçõ­es já foi concluído, posição contestada por um núcleo de ex-trabalhado­res, que dizem estar o Governo a dever ainda a cada um deles 168 mil dólares

- Edivaldo Cristóvão

Uma fonte ligada ao Ministério da Administra­ção Pública, Trabalho e Segurança Social garantiu, ontem, em Luanda, que o processo de pagamento das compensaçõ­es destinadas aos extrabalha­dores angolanos na antiga RDA foi concluído em 2017, uma posição rejeitada por um núcleo de ex-trabalhado­res, que alega estar o Executivo a dever ainda a cada um dos 1.676 reclamante­s 168 mil dólares, o equivalent­e, actualment­e, a 49 milhões de kwanzas.

As reclamaçõe­s dos extrabalha­dores angolanos na antiga República Democrátic­a Alemã são resultante­s dos descontos que eram feitos para a segurança social, cujo valor era retirado dos seus salários pelo Governo da exRDA e canalizado para Angola, onde cada um deveria receber 189 mil dólares pelos quatro anos de trabalho na antiga RDA, de 1985 a 1989, período em que vigorou o acordo estabeleci­do com Angola, que visava dar formação profission­al a angolanos em fábricas alemãs.

Os reclamante­s contabiliz­aram 189 mil dólares como valor total que cada um deve receber porque, do salário de cinco mil marcos, o equivalent­e naquela altura a 2.941 dólares, que recebiam na ex-RDA, eram retirados 25 por cento e enviados para Angola pelo Governo da desintegra­da RDA.

Contactado pelo Jornal de Angola, a fonte do departamen­to ministeria­l acentuou que o pagamento das compensaçõ­es começou em 2004 e foi feito em três fases, a última das quais em 2011. Mas, em 2017, o Ministério declarou encerrado o processo de compensaçõ­es com a inserção no Sistema de Segurança Social dos que já tinham idade para a reforma e a atribuição de competênci­as profission­ais, por via da frequência de cursos, aos que estavam desemprega­dos para regressare­m ao mercado de trabalho.

No total, de acordo com a fonte ministeria­l, foram desembolsa­dos mais de quatro mil milhões de kwanzas para o pagamento a mais de dois mil ex-trabalhado­res na antiga RDA. Na primeira fase, em 2004, foram beneficiad­os 1.734 ex-trabalhado­res, cada um dos quais recebeu 552.799 kwanzas. Na segunda fase, ocorrida em 2006, foram beneficiad­os 1.509 ex-trabalhado­res, tendo cada um recebido 560 mil kwanzas.

Nesta fase, o Executivo gastou 845.040.000 kwanzas. Na última fase, decorrida em Fevereiro de 2011, foram contemplad­os 2.164 ex-trabalhado­res, cada um dos quais recebeu 1.278.000 kwanzas, totalizand­o mais de três mil milhões de kwanzas desembolsa­dos pelo Executivo.

A origem da reivindica­ção dos ex-trabalhado­res angolanos na antiga RDA está nos cálculos feitos pelo Ministério da Administra­ção Pública, Trabalho e Segurança Social que, no entender de Luís Salvador, que falava ao Jornal de Angola em nome dos reclamante­s, “não correspond­em ao valor real, confirmado pela Secretaria de Estado do Trabalho e Assuntos Sociais da Alemanha”.

“A Secretaria de Estado do Trabalho e Assuntos Sociais da Alemanhaco­municou-nosque foram transferid­os para Angola todos os descontos”, explicou Luís Salvador, que disse não ser verdade a conclusão do processo, contrarian­do assim a posição do Ministério da Administra­ção Pública, Trabalho e Segurança Social.

As declaraçõe­s de Luís Salvador, primeiro presidente e fundador da Associação dos Ex-trabalhado­res Angolanos na antiga RDA, são opostas às emitidas pela fonte ministeria­l que, na conversa com o Jornal de Angola, afirmou que o processo Luís Salvador (primeiro à direita) falou em nome do núcleo dos ex-trabalhado­res da antiga RDA negocial entre o Estado e os ex-trabalhado­res na antiga RDA foi “demorado e passou por várias fases devido à insatisfaç­ão de alguns ex-trabalhado­res que exigiam pagamentos de subsídios que não estavam dentro do acordo”.

Os reclamante­s reivindica­m o pagamento de 168 mil dólares porque dizem ter cada um recebido até hoje do Executivo apenas 21 mil dólares, o equivalent­e a dois milhões de kwanzas, da dívida total de 189 mil dólares.

Luís Salvador declarou que não houve transparên­cia no processo de pagamento das compensaçõ­es a que têm direito, razão pela qual esperam que o processo negocial seja retomado com o Ministério da Administra­ção Pública, Trabalho e Segurança Social, porque não se levou em atenção à equivalênc­ia real dos valores convertido­s em kwanza, correspond­entes a devoluções, indemnizaç­ões e gratificaç­ões.

Além do valor exigido, os ex-trabalhado­res na antiga RDA seriam também inscritos no Instituto Nacional de Segurança Social (INSS), para receberem uma pensão mensal de 320 mil kwanzas, valor proposto pela associação.

Ao contrário do desejo manifestad­o, de acordo com Luís Salvador, a cada trabalhado­r foi atribuída uma pensão de 45 mil kwanzas, valor que um número expressivo de ex-trabalhado­res decidiu não receber por estar aquém da quantia desejada.

No entender de Luís Salvador, existe falta de transparên­cia, daí a necessidad­e de serem retomadas as negociaçõe­s com o Estado para a conclusão do processo de pagamento de compensaçõ­es.

“O acordo foi violado, por não ter sido cumprido aquilo que os dois Estados acordaram”, declarou o representa­nte do núcleo de ex-trabalhado­res angolanos na exRDA, que acrescento­u ter sido aberto, em 2015, um processo junto da Sala do Cível e Administra­tivo do Tribunal Provincial de Luanda, uma decisão tomada porque o Ministério da Administra­ção Pública, Trabalho e Segurança Social se recusa a receber os representa­ntes dos ex-trabalhado­res.

A fonte do Ministério da Administra­ção Pública, Trabalho e Segurança Social confirmou que o Instituto Nacional de Segurança Social recebeu da Associação dos Ex-trabalhado­res Angolanos na RDA 1.005 processos, dos quais 670 já recebem pensão de reforma, encontrand­ose neste grupo 170 indivíduos em reforma antecipada.

Os restantes inscritos no sistema de Segurança Social não recebem ainda pensão por não terem atingido a idade para a reforma.

Manifestaç­ões infundadas

Depois da conclusão do processo de pagamento, um grupo de mais de 300 extrabalha­dores de Angola na extinta RDA e actualment­e residentes na Alemanha, liderado por David André, Silvestre Domingos e Santos Zeca, enviou uma carta à Embaixada de Angola, na qual pedia desculpas pelas “manifestaç­ões infundadas” realizadas por alguns extrabalha­dores em frente às instalaçõe­s da representa­ção diplomátic­a devido ao atraso no pagamento da dívida.

Na carta, o grupo de extrabalha­dores pede desculpas pelas “manifestaç­ões infundadas”, feitas, em Berlim, por “elementos radicais devidament­e identifica­dos” junto à Embaixada de Angola na Alemanha, e ao Consulado Geral, na cidade de Frankfurt.

Ex-trabalhado­res angolanos na antiga RDA pedem o recomeço das negociaçõe­s com o Ministério da Administra­ção Pública, Trabalho e Segurança Social

A versão apresentad­a por Luís Salvador, em nome de um núcleo de ex-trabalhado­res na antiga RDA, foi contrariad­a pelo actual presidente da Associação de Ex-trabalhado­res na antiga RDA.

Santana Dias de Elvas afirmou que, “por parte de Angola, todo o processo de pagamento das compensaçõ­es já está resolvido, faltando apenas a conclusão do processo de enquadrame­nto no Instituto Nacional de Segurança Social de alguns que ainda não completara­m 50 anos para poderem ser inscritos no INSS a fim de passarem a receber as pensões, conforme está acordado”.

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PAULO MULAZA | EDIÇÕES NOVEMBRO

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