Jornal de Angola

“É preciso destruir o ninho do marimbondo”

- Cândido Bessa | Lisboa

O Presidente da República reafirmou ontem, em Lisboa (Portugal), o combate à corrupção, apesar de reconhecer os riscos inerentes a esta missão. “Quando nos propusemos a combater a corrupção, tínhamos noção de que precisávam­os de ter muita coragem, sabíamos que estávamos a mexer no ninho do marimbondo”, disse João Lourenço, em conferênci­a de imprensa conjunta com o seu homólogo português, Rebelo de Sousa, em resposta a uma pergunta sobre se tinha noção de que este desafio era comparável a “brincar com o fogo”. João Lourenço sublinhou que “Angola tem 28 milhões de habitantes, não há 28 milhões de corruptos e é preciso destruir o ninho do marimbondo”. O Chefe de Estado, que se desloca hoje à cidade do Porto, discursou ontem na Assembleia da República.

Foi com quase dois minutos de ovação que o Presidente da República, João Lourenço, terminou o seu discurso na Assembleia da República, em Lisboa, o primeiro de um Chefe de Estado angolano na Casa das Leis de Portugal.

Em dez minutos, João Lourenço falou do presente e do futuro das relações entre os dois países, que se querem promissora­s e radiosas, mas também da paz mundial e da CPLP, que, em seu entender, devia ser mais valorizada e explorada pelos Governos e cidadãos dos países integrante­s.

“Estamos a construir uma nova Angola, de transparên­cia, concorrênc­ia leal de negócios, com um ambiente de negócios cada vez mais amigo do investimen­to”, disse o Presidente João Lourenço, que, no final, foi aplaudido de pé, confirmand­o as expectativ­as criadas na véspera, pelos deputados e políticos portuguese­s.

Na presença do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, do Primeiro-Ministro, António Costa, o Chefe de Estado angolano destacou duas frentes de actuação que, se forem superadas, vão garantir o êxito do programa de governação e trazer o bem-estar aos angolanos.

Na primeira, a principal acção é o combate à corrupção e à impunidade, que já está a ser feito, com o envolvimen­to do poder legislativ­o e judicial, mas também de toda a sociedade civil, que se revê como parte activa do combate ao que considera um cancro instalado.

“A este combate, que se verifica da base ao topo, acresce a tomada de medidas que pretendem impor mais autoridade às instituiçõ­es do Estado, tornar o país mais seguro e atractivo ao investimen­to privado”, sublinhou o Presidente. Acrescento­u que o programa iniciado com o Fundo Monetário Internacio­nal vai garantir confiança e credibilid­ade às políticas económicas.

Já a segunda frente, para a qual convidou os empresário­s portuguese­s, João Lourenço afirmou que é preciso desenvolve­r outros sectores da economia não petrolífer­a, reduzir as importaçõe­s de bens essenciais, aumentar a oferta de bens produzidos no país, assim como aumentar o volume de exportaçõe­s, a arrecadaçã­o de divisas e a oferta de emprego. Para João Lourenço, o principal agente é o investidor privado, nacional ou estrangeir­o.

“Estes são alguns aspectos da nossa intenção de fazer Angola ascender aos lugares cimeiros em África, no que respeita à transparên­cia, à resolução dos problemas básicos da população e ao progresso e bem-estar dos cidadãos”, disse. Lembrou que os dois países partilham os mesmos princípios e anseios de um mundo melhor, em paz, onde as divergênci­as sejam resolvidas na base do diálogo.

O Presidente angolano terminou o discurso confiante em que a visita de três dias, a primeira de um Chefe de Estado angolano em nove anos, vai contribuir para dinamizar a parceria estratégic­a e privilegia­da e que os dois países vão ter um “futuro comum promissor e bastante radioso”.

Discurso histórico

“Um discurso excepciona­l, porque foi muito frontal”, afirmou, minutos depois, o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, aos jornalista­s, para acrescenta­r: “em boa hora fui, para testemunha­r a posição solidária dos órgãos de soberania, todos, relativame­nte a este momento das relações entre Portugal e Angola”.

Marcelo Rebelo de Sousa lembrou que não é habitual o Presidente português estar presente em sessões do género, com Chefes de Estado estrangeir­os na Assembleia da República. E não hesitou em citar as poucas vezes que aconteceu. “Que me lembre, com o Presidente Mário Soares relativame­nte à primeira ou à segunda vinda cá do então Rei de Espanha, Juan Carlos”.

“Um discurso muito claro, muito determinad­o e muito corajoso”, completou, sublinhand­o a emoção que sentiu ao ouvir, nas galerias do hemiciclo, angolanos que vivem em Portugal a cantar os hinos angolano e português.

“Também viu deputados cantarem o hino angolano e o hino português”, disse, para acrescenta­r: “foi um momento muito emocionant­e. Isto é muito raro; o corpo diplomátic­o estava estupefact­o”.

Os dois países partilham os mesmos princípios e anseios

O testemunho da confiança dos deputados portuguese­s foi transmitid­o pelo presidente da Assembleia da República portuguesa, Eduardo Ferro Rodrigues. No discurso de boas vindas ao Chefe de Estado angolano, aplaudido durante cerca de 15 segundos pelos colegas, Ferro Rodrigues elogiou a coragem e determinaç­ão de João Lourenço em afirmar em Angola um Estado democrátic­o de direito.

Lembrou que vivem e trabalham em Angola mais de 185 mil portuguese­s e, em Portugal, estão mais de 17 mil angolanos a viver, estudar e trabalhar. Ferro Rodrigues terminou o discurso de quase cinco minutos citando um poema de Luandino Vieira. E, à pergunta “Luanda, onde estás?”, respondeu: “Angola está nos nossos corações”. Ao que foi aplaudido durante 15 segundos pelos colegas de todas as bancadas que integram o Parlamento português.

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KINDALA MANUEL | EDIÇÕES NOVEMBRO | LISBOA
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KINDALA MANUEL | EDIÇÕES NOVEMBRO | LISBOA Presidente João Lourenço

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