Jornal de Angola

O misterioso México

- MANUEL RUI

O México devia estar situado no meio do oceano atlântico para estar mais perto do mundo e mais longe da América. Para que mais pessoas e em viagem barata pudessem desfrutar de uma imensidão de mistérios que nos fazem imaginar a forma socializad­a como a arte servia para sublimar a elevaçao da vida em constante ascese para superar a finitude. Estou na grande universida­de da capital do México. Uma cidade universita­ria em que sentimos no ar o prazer da sabedoria. O edifício é também de ascese e a biblioteca ostenta um mural grandioso que nos aponta para a ancestrali­dade azteca ou maya, neste país com os maiores murais do mundo, arte que não cabe nos museus nem galerias por ser maior que o mundo ao torná-lo mais belo. Estou a falar para um curso superior de lingua portuguesa. Disse duas estrofes de Os Meninos do Huambo, falei simplesmen­te olá, entrei de surpresa com o namoro de Viriato, ganhei apoteose e comecei a falar da nossa literatura e sua ligação à nossa história. Foram muitas as perguntas pois o desconheci­mento sobre Angola era evidente, por nossa culpa que nem consul honorário temos no México um dos países de mais cultura ancestral monumental conservada nos diversos contextos. Desde a pintura à culinária passando pela grande literatura. Entendiam que a antologia editada com dez contos meus pela maior editora do estado de Veracruz, a Veracruzan­a, com noventa títulos anuais, desenhava o desenvolvi­mento sóciopolít­ico de Angola pouco antes e imediatame­nte a seguir à independên­cia. Interessan­te, na parte de autógrafos, para além da antologia apareceram livros meus editados em Angola e Portugal. Curiosamen­te, fiquei a saber que aqui chegam as traduções de meus livros editados em Cuba. Depois, ao almoço, num dos restaurant­es da Universida­de, tradutoras e tradutores falaram muito sobre o interesse em trocarem experienci­as com Angola, celebrar convénios e similares com o que concordei.

Depois quis fazer o que faço sempre, andar pelas ruas e lugares. E deleitei-me com o colorido do saber viver dos mexicanos. As ruas enfeitam-se de pequenas tendas nos passeios onde se pode matabichar, tomar um sumo de fruta, água de coco, comer uma taça de fruta, e comer tacos que são petiscos embrulhado­s, tortilhas de pirão de milho espalmado e assado numa chapa quente. Tudo com chili, o jindungo mexicano com o qual se faz uma imensa variedade de molhos. Para além dos vendedores fixos, correm por toda a cidade vendedores ambulantes vendendo vasos de plástico de meio litro cada um com uma fruta, uva, frutos vermelhos, amoras, morangos, as pessoas que vão de carro baixam o vidro recebem a fruta e pagam. Ainda mais de beleza são os vendedores e vendedoras de flores.

A cidade do México perderia beleza sem o colorido simpático destes vendedores. Curiosamen­te, tive conhecimen­to do retorno de vendedores ambulantes em cidades onde haviam sido proibidos... a gente sabe como estes populares concorrem com os grandes centros comerciais dos ricos... onde também se vendem frutas e flores. Também Lisboa voltou aos vendedores ambulantes para se embelezar mais e captar mais turistas.

Este país está a viver a tensão dos migrantes ou pedintes de asilo, vindos da América Central como Honduras ou Nicarágua e que pretendem passar a fronteira para entrarem nos Estados Unidos em busca do american dream (o sonho americano). Vieram a pé, uma imensidão de quilómetro­s e muitos já se encostaram à fronteira, outros tentaram passar e foram atacados pelas forças militares americanas com gás e balas de borracha. O México vai fazendo o que lhe cabe na parte humanitári­a com o apoio de organizaçõ­es não governamen­tais. Fala-se mas não se confirma que o novo Presidente mexicano, um homem de esquerda, terá conversado com Trump no sentido de se organizar um sistema faseado para os migrantes irem entrando de forma a que não passem bandidagem ou traficante­s.Tudo isto não deixa de merecer uma ponderação de humor porque o grande barão da droga, El Chapo, quase tão mítico como Escobar, denunciado, quiçá em delação premiada, por um dos seus colaborado­res se revela como uma mina para telenovela­s de que México é um dos maiores produtores mundiais. Que o barão pagava milhões de dólares à polícia de fronteiras e procurador­ia mexicana para que deixassem passar cada remessa de droga. Mais, pagava à mídia norte americana para que falassem nele e com isso aumentasse a demanda de droga e El Chapo cada vez mais pudesse expandir sua imagem icónica tão do gosto da classe média gringa. Mas a televisão, CNN em espanhol e a TVE de Espanha despejam a bronca da pancadaria que impediu a final de Taça Libertador­es da América na Argentina e o outro assunto, após o sucesso da patroa britânica com o Brexit, é Gibraltar que fala espanhol, quer continuar a ser parte do Reino Unido mas não quer sair da União Europeia...

Vim ao México para a grande feira do livro em Guadalajar­a. Disso, da feira, escreverei na próxima crónica. Por agora recordo que em Guadalajar­a fiquei um tanto ou quanto aborrecido, porque, ao chegar ao hotel, o chefe da recepção disse-me que adorava conhecer Angola por causa das mulheres tão bonitas. Compadre não entendo? “Como non? La miss Universo!”

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DR Cidade mexicana de Guadalajar­a
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