Rafael Marques é incentivado a denunciar casos de corrupção
Audiência com o jornalista de investigação e defensor dos direitos humanos ontem no Palácio Presidencial da Cidade Alta está enquadrada em muitos encontros que o Presidente João Lourenço está disponível para fazer ao longo do seu mandato
O jornalista e defensor dos direitos humanos Rafael Marques afirmou ontem, em Luanda, que recebeu do Presidente da República, João Lourenço, “incentivos” para fazer chegar à Procuradoria-Geral da República (PGR) denúncias sobre casos de corrupção que envolvem gestores públicos. “Tenho remetido processos/denúncias de casos de corrupção à PGR e espero que com este incentivo do Chefe de Estado, possamos, com as nossas investigações, contribuir para esta fase que a Justiça angolana atravessa”, disse Rafael Marques à imprensa no final da audiência, que durou cerca de 40 minutos. O jornalista elogiou a frontalidade do Chefe de Estado.
Rafael Marques, jornalista de investigação e defensor dos direitos humanos, afirmou ontem, em Luanda, que recebeu do Presidente da República, João Lourenço, “incentivos” para fazer chegar à Procuradoria-Geral da República (PGR) denúncias sobre casos de corrupção de gestores públicos.
Recebido ontem em audiência no quadro de uma série de encontros com organizações da sociedade civil para a melhoria do desempenho da acção governativa, Rafael Marques afirmou que “o Presidente da República disse claramente que os casos de corrupção devem ser remetidos à PGR, que é a instituição vocacionada para o efeito”.
“Tenho remetido processos/denúncias de casos de corrupção à PGR e espero que com este incentivo do Chefe de Estado possamos então, com as nossas investigações, contribuir para esta fase que a Justiça angolana atravessa”, disse Rafael Marques à imprensa no final da audiência.
Em relação aos casos de gestores públicos envolvidos em casos de corrupção, Rafael Marques considerou importante o contributo da sociedade para a moralização das instituições públicas e dos cidadãos de modo a que se encontrem soluções para que a corrupção deixe de ser o cancro que corrói o país e delapide os recursos que deveriam ser investidos em prol do bem comum. Modesto, Rafael Marques rejeitou o epíteto de “ícone” da luta contra a corrupção no país em função das denúncias que faz frequentemente nas suas investigações. Rafael Marques esclareceu que não é um activista político.
“Sou um jornalista de investigação e defensor dos direitos humanos. Não faço política”, disse.
“O importante é que os cidadãos participem na construção de uma nova sociedade. Não é apenas tarefa do Presidente da República ou de alguns jornalistas ou investigadores, mas de toda a sociedade”, disse. O defensor dos direitos humanos considerou a fase que o país vive um processo em que todos os cidadãos devem estar envolvidos de modo que o exercício da cidadania seja constante. “O país é de todos, devemos, por isso, fazer a nossa parte e não esperar que as decisões sejam exclusivamente do Presidente da República ou do Executivo”, acrescentou.
Questionado se teve a garantia de criação de um canal para fazer chegar as suas preocupações ao Presidente da República, Rafael Marques disse não ser necessário, porque o facto de ter estado ontem, pela primeira vez, no Palácio Presidencial da Cidade Alta enquanto cidadão, já significa que há abertura para que os cidadãos possam expor as suas preocupações.
O jornalista, que chegou a ser preso pelo anterior Governo pelas revelações que fazia sobre casos de corrupção e que foi há poucos meses absolvido num processo judicial que envolveu o ex-procurador-geral da República, João Maria de Sousa, disse que encara os novos tempos que o país vive “com bastante esperança”. Em relação aos direitos humanos, reconheceu que há uma grande mudança comparado com o Executivo anterior, mas, alerta, “todos sabemos que a condição económica da população não é boa e os cidadãos estão a sofrer com isso”.
Em relação a situação dos direitos humanos no país, o jornalista disse ter notado que “há bastante atenção do Presidente da República e do Executivo para que haja melhorias”.
“Mas é necessário, e mais uma vez, que não façamos depender as políticas de Estado apenas da vontade do Presidente. Cada um de nós tem de fazer a sua parte”, acrescentou.
Operação Resgate
Rafael Marques disse que, para início de conversa com o Presidente João Lourenço, o assunto foi a situação das vendedoras ambulantes (zungueiras) apanhadas no âmbito da “Operação Resgate” e da forma como as autoridades provinciais estão a actuar no sentido de garantir uma solução para o problema delas.
“Temos reservas pela forma como está a ser conduzida. É necessário que as medidas coercivas, sobretudo as que afectam as camadas mais desfavorecidas, sejam antes acompanhadas de medidas alternativas, para que as pessoas afectadas sejam inseridas no mercado de trabalho. É preciso criar locais de venda com condições”, disse.
Em relação a situação das vendedoras do São Paulo que perderam as suas mercadorias numa operação conjunta da Polícia e da Fiscalização, no âmbito da “Operação Resgate”, Rafael Marques disse ter recebido garantias de que vão ser indemnizadas. “É um bom passo”, reconheceu.
Repatriamento de capitais
Rafael Marques considerou fundamental esclarecer aos países onde estão depositados os dinheiros que saíram ilegalmente de Angola que a economia nacional precisa destes capitais.
“Tenho apresentado denúncias de casos de corrupção à PGR e espero que com este incentivo do Chefe de Estado, possamos contribuir para esta fase que a Justiça angolana atravessa”
O jornalista alerta, no entanto, que, “primeiro, é preciso lutar para estancar a corrupção e, depois, exigir que haja da parte da comunidade internacional o entendimento de que os anos de saque em Angola, do qual muitos participaram e com todo o entusiasmo, está a chegar ao fim, e devem agora contribuir para que Angola seja um país melhor gerido e os recursos angolanos sejam para o benefício dos cidadãos angolanos”.
Rafael Marques, uma das personalidades mais aguardadas, ficou de fora do primeiro encontro. “O Presidente lamentou o incidente, e isso foi um gesto nobre”, disse o jornalista de investigação.