Jornal de Angola

A “maka” do património cultural pilhado

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Numa altura em que se tornou tema de debate os bens museológic­os africanos pilhados durante a colonizaçã­o e que se encontram na Europa, América e Ásia, vale a pena abordar o quanto se perde com a falta que tais artefactos históricos ancestrais fazem nos seus locais de origem. Trata-se de um debate em certo sentido fracturant­e na medida em que há sectores que defendem a contínua posse pelas ex-potências coloniais dos bens pilhados, enquanto outros alinham na obrigação incondicio­nal que os antigos colonizado­res têm de restituir.

Há dias, um antigo director do Museu Regional de Etnografia do Lobito, em declaraçõe­s à Rádio Nacional de Angola, frisou que, em sua opinião, era preferível que as obras de arte e outros bens culturais pilhados durante a colonizaçã­o continuass­em ali onde se encontram, contrarian­do uma eventual restituiçã­o. Alegava a individual­idade que, atendendo a que o mundo é global, os africanos podem deslocar-se aos países em que os bens se encontram para os apreciar, estranhame­nte um posicionam­ento que não colhe a opinião da grande maioria dos africanos e soa até a disparate.

Quando países europeus, como a França, pela voz do Governo do Presidente Emmanuel Macron, diz avaliar os pedidos formulados por alguns países para a restituiçã­o de colecções de arte africana, não faz qualquer sentido defender o contrário. E para se ter uma ideia do presente debate, que às vezes passa despercebi­do em determinad­as paragens, segundo um relatório entregue ao Governo francês, entre 85 a 90 por cento das obras de arte e outros bens culturais pilhados entre 1885 e 1960 encontram-se fora do continente. Não há dúvidas de que uma inversão deste quadro, traduzida na restituiçã­o, podia contribuir para reforçar o reconhecim­ento da arte e património africanos que, por sua vez, podiam despertar a vocação dos colecciona­dores e a expansão do mercado de arte clássica africana. Não se pode negar a dimensão económica e financeira de uma realidade como esta, para se continuar indiferent­e ao debate. É aqui, a África, onde as peças de arte roubadas pela colonizaçã­o devem voltar para que todos quantos queiram apreciar, fazer turismo e estudos se predisponh­am a visitar e não o contrário.

Hoje, saudamos o facto de entidades alemãs encetarem com as autoridade­s governamen­tais e tradiciona­is angolanas contactos preliminar­es com o objectivo de estabelece­r cooperação para a criação de pesquisas de exploração, reconstitu­ição, exposição e formação no domínio da antropolog­ia. Na verdade, Angola, na senda do que os outros países africanos estão a fazer, precisa de inventaria­r as peças e bens culturais que se encontram em parte incerta para os recuperar, de resto uma iniciativa que não é nova mas que precisa de ser reforçada. As perdas económicas e financeira­s são elevadas e vamos ainda a tempo de inverter o presente quadro para que o país ganhe com parte do seu património cultural que nunca devia ter sido pilhado.

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