Turismo rural em Angola
Quando se fala da diversificação da economia angolana o turismo é citado logo a seguir à agricultura. Será que tem havido um debate sério sobre os factores que poderiam sustentar um sistema turístico viável? Do meu canto, aqui no Planalto Central, tenho reflectido bastante sobre esta questão. Nos Estados Unidos, vivo em Jacksonville, no Estado da Florida - uma região dos Estados Unidos cuja fonte principal de rendimentos é o turismo. Nas universidades em Florida há licenciaturas de gestão de museus, de desportos e até de acontecimentos.
Para haver uma indústria de turismo de peso cá em Angola teria que haver uma sincronização séria entre vários operadores. O governo teria que estar lá a criar o clima apropriado: segurança, infraestruturas etc. O resto teria que estar nas mãos de privados, porque o turismo tem que ser dividido em segmentos. Temos os turistas que combinam a sua viagem com negócios; temos os jovens cuja atracção principal seria o litoral especialmente as praias. Depois há os hedonistas que vão querer só vir para provar do que é bom da cultura: música, culinária, paisagens etc. Lá, no Cuando Cubango, haveria um outro tipo de turista mais interessado nos animais e plantas selvagens. Coordenar isto tudo não é tarefa fácil, mas é possível, sobretudo se houver a humildade e prontidão para aprender de outras experiências africanas.
No Planalto, poder-se-ia começar numa pequena escala; aqui teria que ser um turismo doméstico. No outro dia, aqui perto do Chiumbo, encontrei um casal proveniente de Luanda que tinha vindo passar férias numa aldeia chamada Utanha. Este casal tinha um certo poderio financeiro - já esteve na África do Sul, no Brasil e em Portugal. O casal gostou muito do que tinha visto. Ambos alugaram kupapatas na aldeia e foram vendo paisagens e ouvido histórias da família e do clan. À noite, o casal metia-se na sua viatura com ar condicionado e ia passar a noite no Huambo.
Se houvesse uma pensão na aldeia o casal não teria que ir ao Huambo e os seus fundos iriam beneficiar os aldeões. O que é necessário por cá é formar as pessoas nas aldeias para poderem gerir o turismo rural. Na Guatemala, por exemplo, há ONGs que ajudam os camponeses a construírem pensões e tomar conta dos turistas. Há algumas pensões por cá, mas as mesmas falham por várias razões. A primeira é que as pessoas não têm nenhuma experiência de hospitalidade a uma escala grande já que pensam que o turista é apenas um hóspede. Na Tanzânia, há uma cidade chamada Musoma, à beira do Lago Victória, que é muito popular com turistas ocidentais, sobretudo italianos. Quando o turista chega a Musoma, ele pode alugar uma bicicleta, ir ao mercado onde as senhoras podem fazer roupa africana à sua medida, ir para vários restaurantes onde ele pode escolher e saborear a culinária local. Há, até, um quimbandeiro para turistas (que aceita todos os cartões de crédito) para assistir os turistas com problemas que não podem ser resolvidos por médicos e psicólogos ocidentais. Depois há, também, várias bandas.
Ainda na Tanzânia, há, também, a famosa ilha do Zanzibar que já visitei várias vezes. À noite, no Zanzibar, há o mercado onde os turistas se misturam com os ilhéus para saborearem as comidas locais. A culinária do Zanzibar é uma mistura de várias culturas árabe, africana e até mesmo portuguesa. Ir para o Zanzibar é uma experiência. Por que razão é que ir para o Bailundo não deveria ser uma experiência memorável para quem quiser se inteirar da cultura Umbunda?
Há uma pequena vila cá no Planalto pela qual me apaixonei. Quando cheguei ao Chinguar queria saber mais sobre a história deste local que fica ao lado de Katchiungo onde nasci.
Chinguar não tinha um centro para turistas; havia, apenas, um gigantesco centro cultural Agostinho Neto, do qual se sabia, também, muito pouco. A promoção do Chinguar como um destino turístico não deverá depender do governo mas de vários operadores locais. Há uma pensão no Chinguar e um pequeno hotel; poderia mesmo haver um plano de tornar estes dois estabelecimentos mais atraentes. Deveríamos ter operadores turísticos - pequenas empresas que, depois de serem pagos, iriam tomar conta de todas as necessidades de um turista. Alguém pagaria a operadora turística em Luanda, e o voo, hotel e mesmo os locais por serem visitados fariam parte de um itinerário. Claro que o operador turístico teria que trabalhar com os donos das pensões, e até mesmo as pequenas empresas de transporte.
Há em Angola uma espécie de turismo que não é explorado - peregrinações religiosas. Para nós, protestantes da IECA, há a missão do Chilume no Bailundo, a primeira a ser fundada quando o Ekuikui II cedeu terreno aos missionários. Depois há a grande missão do Dondi, que formou uma geração altamente influente na Angola pós-colonial. Há várias outras missões de interesse para os protestantes. No Galangue, até há uma missão fundada somente por afro-americanos que chegaram a ser expulsos pelo sistema colonial em 1957. Um sistema de turismo interno bem organizado cá no Planalto iria, eventualmente, atrair turistas estrangeiros. Isto iria beneficiar a região e o país sob várias formas. A concretização deste turismo rural é possível. Bastava só haver a vontade política e a capacidade de gestão e resolução de problemas, algo que muitos angolanos têm.