“Operação resgate” no seio das instituições…
Saudamo-nos efusivamente, com aquela alegria de quem revê um velho amigo. Fazia tempo que não nos víamos e era preciso, como se diz na gíria, pôr a “fofoca” em dia. A conversa flui normalmente. Ele indaga-me pela saúde, a família e sobre o trabalho e eu digo que as coisas estão a correr na graça de Deus. Devolvo-lhe cordialmente as perguntas e ele responde que a saúde vai bem. Quanto à família, revela-me que perdeu recentemente a mãe, aos 72 anos. “Coitada, já não se aguentava, estava muito enferma”, disse. “Que Deus a tenha!” - retorqui, ao mesmo tempo que lhe dava as condolências pelo infortúnio.
A conversa derivou para outros assuntos da actualidade política e económica do país. A visita do Presidente João Lourenço a Portugal e todo o ambiente que, antes, durante e depois, a rodeou. Abordamos a abertura informativa e a forma como a imprensa pública está agora a tratar dos diferentes assuntos, com maior transparência. Concordamos em que a Comunicação Social tem um papel relevante a jogar em todo o processo de transformações que está em curso e sobre a necessidade de ela ser mesmo activa, não vacilar, sob pena de muita coisa que está mal persistir e não ser corrigida.
Falámos também da decisão do Governo de elevar a problemática dos Direitos Humanos a assunto a ser tratado pelo Conselho de Segurança Nacional. Ele realçou o facto de João Lourenço ter aberto as portas do Palácio da Cidade Alta a muita gente que, antes, nem sequer sonhava que a sua voz fosse escutada lá. E disse que “vai ser bom para Angola, se realmente conseguir implementar todas as reformas”.
O tema do combate à corrupção era inevitável. O homem mostrou que está a acompanhar a par e passo as iniciativas do Governo nesta matéria, além das medidas tomadas noutros domínios para fazer de Angola um país mais atractivo para o investimento estrangeiro. Não tem dúvidas de que tudo isso vai requerer muito trabalho, “um trabalho gigantesco”, repetiu a ideia de forma a dar-lhe mais ênfase.
Aqui chegados, o comerciante ganhou coragem para me fulminar com a seguinte pergunta:
- Mas… Senhor Manaças, quando é que a “Operação Resgate” vai terminar?
Olhei incrédulo para o meu amigo e fui-lhe explicando que a Operação é para durar, é para pôr as coisas no lugar, porque há muita desordem e o Estado perde muito com esse tipo de coisas; que parece uma anarquia criada propositadamente para uns ganharem e o Estado ficar sempre a perder. Que isso (a operação) é um processo e que há certas coisas que vão levar anos até se conseguir que entrem nos eixos…
Terminada a explicação, e com a mesma incredulidade com que recebi, devolvi-lhe a pergunta nos seguintes termos:
- Porque está preocupado com o prazo de duração da “Operação Resgate”?
Sem esconder a apreensão que lhe ia na alma, o comerciante avançou:
- É que, algumas coisas que estão a acontecer são a repetição do que já acontecia anteriormente, no passado. Sempre que se aproxima este mês do Natal, quando estamos próximo da quadra festiva, os agentes da fiscalização económica vêm nos autuar… recebem os valores e vão se embora.
Prosseguindo, disse: - Os meus colegas no Hoji ya Henda contam que, às vezes uma equipa já passou, mas depois passa outra. E quando são informados que já passou uma outra equipa, interrogam como é que ela passou se essa não é a sua área de actuação?
Ou seja, há disputa de território entre as equipas.
O comerciante prefere ficar no anonimato. Apoia os objectivos da “Operação Resgate”, embora considere que há gente que esteja a aproveitar-se dela e a manchar a imagem das instituições que estão envolvidas na sua realização.
Acredito que sim, que há, nas instituições, pessoas que ainda não mudaram de mentalidade e, por isso, estão a ser também tomadas medidas sérias para disciplinar quem insiste em práticas antigas, como foi o caso dos agentes da Polícia que, na Gajajeira, arrombaram os armazéns e de lá retiraram os bens que as vendedoras haviam depositado. Razão por que foi instaurado um processo contra todos os envolvidos.
A “Operação Resgate” não visa corrigir só o que está errado ao nível da sociedade e fora das instituições. Dentro das instituições também é preciso resgatar valores e princípios. O apelo à integridade dos agentes da administração pública não pode cair em saco roto.
Preocupa o facto de, por temer represálias, quem sofra desmandos não os denuncie ou não tenha como. Gostariam os comerciantes afectados que as coisas mudassem, mas desconfiam até mesmo que uma denúncia possa resultar em prejuízos para o seu próprio negócio.
Essa é a outra corrupção que também é preciso combater: a das equipas de agentes que vão autuar, encontram uma ou outra irregularidade de pequena monta, exigem dinheiro, metem no bolso e toca a assobiar.
Esses pequenos actos contribuem também para que Angola figure como o país mais corrupto da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) e o quinto pior da União Africana.