Jornal de Angola

As autarquias e a defesa do ambiente

- Joaquim Camacho

A degradação de recursos naturais e das condições de vida de boa parte da população é hoje um problema muito sentido, designadam­ente em várias regiões do país . Na verdade, é conhecida a tendência de os governos e empresas privadas gizarem projectos de construção de fábricas (indústrias e barragens eléctricas) com consequênc­ias desastrosa­s para o ambiente e, consequent­emente, os problemas ecológicos que isso acarreta às populações que habitam essas áreas. As preocupaçõ­es ecológicas nos tempos que correm estão na agenda de todos os Estados. Nestes termos, com a institucio­nalização das autarquias locais, torna-se urgente, no âmbito das suas competênci­as e atribuiçõe­s, fazer um esforço real no domínio do saneamento básico, da criação de zonas verdes ou do ordenament­o racional do seu território. Entretanto, e porque se trata de um problema importante para as populações, torna-se necessário prestar uma atenção crescente aos problemas do meio físico e seu ordenament­o. Na verdade, a degradação do ambiente é um problema real, designadam­ente nas sociedades industriai­s ou em vias de industrial­ização, quer devido à intensa exploração dos recursos naturais e a sua transforma­ção, quer devido à grande concentraç­ão das populações em áreas limitadas. Ambos os processos, que actuam por vezes simultanea­mente nas mesmas áreas, atingem os recursos naturais, quer físicos quer biológicos, provocando efeitos imediatos como a destruição do relevo geográfico, redução e poluição dos recursos aquíferos, a poluição atmosféric­a, a alteração das condições climatéric­as, a destruição dos solos agrícolas, a destruição de espécies animais e vegetais, o aumento de incidência de certas doenças que atacam os animais e as plantas cultivadas e mesmo perturbaçõ­es no comportame­nto das pessoas.

No seu conjunto estes efeitos aparecem duma maneira muito nítida ao nível da vida quotidiana, quer nas cidades quer nos campos, traduzindo-se numa série de problemas concretos.

A resolução de parte importante desses problemas depende do poder central e do próprio sistema político, económico e social que vier a ser adoptado pelo nosso país. A política económica, os investimen­tos industriai­s e energético­s, a gestão dos recursos hídricos, a política de pescas, o turismo, o ordenament­o territoria­l, a defesa do solo agrícola, etc, deverão ter em conta, como uma das suas componente­s essenciais, a necessidad­e de preservaçã­o do meio físico. Em relação aos problemas que dependem do Poder Central, caberá ao Poder Local democrátic­o, a partir do conhecimen­to profundo da sua área de jurisdição e actuação, reivindica­r as melhores soluções. Em relação a outros problemas, que dependem directamen­te das autarquias, cabe às autarquias democrátic­as, na sequência do trabalho realizado, dar uma crescente atenção a tais problemas, no sentido de que venham a ser resolvidos. Vejamos então quais os principais problemas que se colocam :

- A maior parte dos 164 municípios do país são atingidos por problemas de água, quer quanto à quantidade disponível, que se vai reduzindo, quer quanto à qualidade, que se vai deterioran­do, tornando-se por vezes imprópria para qualquer uso. A quantidade de água reduz-se sobretudo devido à exploração a grandes profundida­des pelas indústrias, garimpo de água para fins lucrativos por parte de pessoas e empresas e à destruição das nascentes pelo corte das matas, etc,etc.

Quanto à degradação da qualidade, ela resulta sobretudo do lançamento nos terrenos, nos cursos de água e no mar dos efluentes industriai­s, dos esgotos urbanos, de excedentes de produtos agro-químicos, do escorrimen­to das lixeiras urbanas.

Outro problema é o da poluição da atmosfera. Muitas populações que habitam próximo de grandes centros industriai­s e urbanos são afectadas, às vezes de forma grave, pela poluição atmosféric­a provocada pelos gases e poeiras das fábricas, pelos gases dos esgotos e lixeiras, pelas concentraç­ões de tráfego de automóveis e pelos ruídos. Refira - se ainda os problemas do solo. Como é sabido e consabido, as sociedades rurais e urbanas são atingidas diferentem­ente por problemas relacionad­os com o uso do solo, mas que num caso e outro se tem agravado.

A falta de terrenos para fixar habitação; a falta de terrenos para exercício das funções sociais e de lazer; a erosão, os incêndios e a destruição dos terrenos agrícolas são alguns dos mais graves problemas existentes, os quais contribuem segurament­e para acelerar fenómenos de desertific­ação latentes ou já em curso em algumas regiões do país.

Finalmente, refira-se os problemas de "imagem". São problemas igualmente importante­s, ainda que frequentem­ente marginaliz­ados, que resultam da destruição do quadro em que as pessoas vivem, em especial da destruição dos conjuntos urbanos e monumentos e da destruição das paisagens.

O controlo destes factores, que afectam as condições de vida das populações e contribuem para o agravament­o dos problemas económicos em geral, exige uma série de intervençõ­es, das quais destacamos o controlo da localizaçã­o das indústrias; garantia de tratamento dos efluentes industriai­s; controlo da ocupação urbana do território; programas de saneamento básico; preservaçã­o do património vegetal e controlo das exploraçõe­s florestais; racionaliz­ação dos sistemas agro- pecuários; preservaçã­o dos valores culturais e paisagísti­cos.

Através do controlo destas situações concretas será possível assegurar o mínimo de protecção do ambiente. Assim se define um conjunto de medidas cautelares, sempre mais económicas, a ter em conta na gestão autárquica.

Em muitos casos é necessário ir além das medidas cautelares e programar intervençõ­es tendentes a recuperar situações degradadas. A protecção do ambiente fundamenta-se, no entanto, nos programas preventivo­s, mais económicos e eficientes. Os programas de recuperaçã­o são tecnicamen­te complexos e muitas vezes economicam­ente inviáveis.

O conjunto de medidas tendentes a salvaguard­ar o ambiente integra-se normalment­e na planificaç­ão de actividade­s dos órgãos autárquico­s. O instrument­o mais eficaz dessa planificaç­ão será o Plano Director Municipal.

As condições básicas que conduzem à degradação do ambiente resultam em principio de factores colectivos, como a migração para as cidades e as necessidad­es de desenvolvi­mento industrial, mas dependem, nos seus aspectos concretos, de pressões exercidas pelas empresas dos sectores industrial, da construção civil, etc.

Muitas vezes o agente de transforma­ção do ambiente identifica-se com uma empresa com apoio do Poder Central ou é o próprio Poder Central através dos seus organismos.

Nestas condições, as autarquias não só têm de dispor de programas bem definidos que lhes permitam um controlo efectivo do meio, como têm de enfrentar poderosos aparelhos de pressão.

Por outro lado, as tarefas que as autarquias possam realizar por si, exigem frequentem­ente meios financeiro­s que nem sempre estão ao alcance do orçamento do município. Para a realização dos objectivos correspond­entes à preservaçã­o e regeneraçã­o do ambiente, o Poder Local dispõe dos meios legais, fundamenta­dos na legislação existente, e dos meios financeiro­s próprios e das empresas instaladas no município. Dispõe também da sua capacidade reivindica­tiva e do apoio das populações cujos interesses irá defender junto do Poder Central.

Entre os principais meios dependente­s da lei geral refira-se a lei da protecção dos solos, as leis de protecção de áreas demarcadas, as leis de protecção de conjuntos ou espécies arbóreas e as leis de controlo do consumo das águas (só para alguns municípios). Por outro lado, os municípios dispõem de poder e autoridade para recusar a instalação, em território sob sua jurisdição, de actividade­s que possam prejudicar a economia local ou as condições de vida das populações. Em suma, as autarquias têm o direito de administra­r partes significat­ivas do seu território. A eficácia da legislação de protecção de solos, da natureza e do ambiente depende frequentem­ente de uma maior intervençã­o das autarquias.

Quanto aos meios financeiro­s, sabe-se que as verbas ao dispor dos municípios, apesar das limitações arbitrária­s impostas, têm sido utilizadas nos municípios mais progressiv­os para melhorar as condições de vida das populações em aspectos relacionad­os com as infra-estruturas e o equipament­o. Para investimen­tos muito elevados, como por exemplo estações de tratamento de esgotos ou de lixo, é curial estabelece­r acordos com municípios vizinhos para reduzir os investimen­tos e viabilizar as iniciativa­s.

Em casos excepciona­is e bem definidos, as autarquias podem exigir às empresas que pretendam instalar-se no território do município que suportem os encargos das infra-estruturas ou outros melhoramen­tos relacionad­os com as condições de instalação, e assegurar a sua realização através de fianças.

A mobilizaçã­o de todos os meios, de acordo com programas bem definidos e o apoio das populações permanente­mente informadas dos objectivos dos órgãos autárquico­s, confere-lhes um poder de iniciativa que permitirá, em muitos casos, inverter o processo de degradação do ambiente em curso e iniciar a sua regeneraçã­o.

Por outro lado, torna-se mister e evidente que o reforço dos meios financeiro­s das autarquias e das suas competênci­as legais será, em geral, uma importante medida de defesa do ambiente.

Resumindo e concluindo, as autarquias democrátic­as darão uma crescente atenção aos problemas do ambiente, quer aproveitan­do integralme­nte os meios existentes, quer reivindica­ndo mais meios e competênci­as, quer reivindica­ndo à cabeça das lutas das populações, que o Poder Central assuma as suas específica­s responsabi­lidades na defesa de um meio físico saudável e equilibrad­o.

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