Jornal de Angola

As culturas luso-africanas ocupam a vida das pessoas em Lisboa

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Fez-me sorrir desde o início como os cabo-verdianos de Lisboa são super cabo-verdianos. Há uns que são mesmo do interior de Santiago. A transmissã­o da cultura veio-lhes dos avós e falam aquele crioulo bem fundo que nós, da Cidade da Praia, não falamos. É incrível como Cabo Verde vive em Lisboa. Há festas cabo-verdianas, há cachupa, dançase. É muito bonito ver como as culturas luso-africanas ocupam a vida das pessoas em Lisboa. Acabas por ser acolhida como uma artista daqui. Isso é uma grande diferença para França onde, apesar de ser aquele palco incrível para a world music, és sempre uma artista exótica. Aqui és o que fizeres.

Há uma gradação entre Paris, onde andas à vontade, aqui, onde a reconhecem, e Cabo Verde, onde toda a gente a conhece?

Em Cabo Verde toda a gente sabe quem tu és. Mesmo que não falem, sabes que estás a ser observada. Hoje em dia reconhecem-te e filmam-te, às escondidas ou às claras. Isso muda um bocadinho o sentido de liberdade. Às vezes há jovens que têm esses reflexos e eu chamo-os. Eles ficam a olhar uns para os outros meio assustados. “Se quiseres uma fotografia pede. Não faças as coisas assim às escondidas, não é simpático.” Isso nunca me há de impedir de ir lá, e não é assédio, eu sou muito acarinhada, mas existe essa componente na nova geração, na forma como se relacionam com os artistas. Antigament­e eras cantora, mas eras filha de tal pessoa, e a mulher de tal pessoa, e é por isso que nos conhecíamo­s todos. Há uma geração nova que não conheceu tanto esse Cabo Verde e que conhece o mundo através do YouTube, do Instagram. Então roubam aquele momento, querem levar qualquer coisa para casa.

Em Vapor Di Imigration fala de uma questão muito cabo-verdiana: a imigração. É uma história de família também?

É a história do povo caboverdia­no. Na verdade, eu escrevi aquela música em 2002 e nunca gravei, porque a música não estava pronta. Foi uma música que escrevi quando me mudei para Paris e fala da dor de imigrante. É uma música que desde sempre dediquei ao meu avô, pai do meu pai, Lela d'Tilvina, que era um homem muito querido, as pessoas gostavam muito dele, ajudou muita gente. Ele tinha um barco, o “Maria Sony”, de que a música fala, que ajudou muita gente a imigrar. Disseram-me que existe uma réplica deste veleiro de três mastros em Boston. O meu avô tinha um sócio que era sobrinho dele e que teve várias filhas. Uma delas é a Maria Sony.

Alguma razão particular para ser o nome desta?

Não sei. Talvez fosse a mais bonita.

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DR
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O que descobriu de Cabo Verde aqui?

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