CARTAS DOS LEITORES
Venda no asfalto
Já muito se disse sobre a venda no asfalto, em muitas ruas e estradas de Luanda, sem que a Polícia Nacional faça alguma coisa. A vida está difícil, é verdade, mas nada justifica que as pessoas façam de tudo, desde a venda em qualquer local, ao roubo e assassinato apenas para ganhar dinheiro e sobreviver. A venda nas ruas e estradas devia conhecer uma resposta cabal das autoridades, que passasse pela punição não apenas de quem vende, mas igualmente de quem compra, particularmente com o trânsito automóvel. É de uma irresponsabilidade inqualificável comprar a partir de uma viatura em andamento, ao lado de tantas outras também em movimento. Os riscos que se correm são colossais a todos os títulos, razão pela qual faz todo o sentido que a Polícia Nacional, responsável pela manutenção da ordem, segurança e tranquilidade públicas, intervenha. Na verdade, a venda em locais proibidos atenta gravemente contra aqueles três pressupostos que são a razão de ser da corporação policial em qualquer parte do Mundo. Se a Polícia Nacional não for capaz de preservar a ordem, a segurança e a tranquilidade públicas, desviando-se completamente das atribuições específicas relacionadas com aqueles itens, constitui um convite para regressarmos todos para o estado de natureza. Não estamos em condições de cada um garantir a ordem e a tranquilidade pessoal e familiar, quando existem na sociedade instituições devidamente investidas de capacidade de acção legal e de facto para tal.
Independência catalã
Sou espanhol e residente em Luanda. Escrevo para o Jornal de Angola para falar sobre o processo de independência na Catalunha. O que é, sem dúvida, o processo político mais importante que teve lugar nas últimas décadas em território da União Europeia, já começou em Madrid. São nove os acusados, eleitos como líderes visíveis de um movimento culpado de querer submeter a referendo uma proposta puramente política (a criação de uma República catalã separada da monarquia espanhola). Um movimento que, nos últimos dez anos, demonstrou ter o apoio de pelo menos metade da população catalã, que organizou manifestações imponentes e absolutamente pacíficas, que não cedeu a centenas de provocações físicas, administrativas, políticas, mediáticas e judiciais e que manteve o seu empenho numa solução através de urnas eleitorais. De facto, é a primeira vez que os tribunais especiais (a Suprema Corte e a Suprema Corte Nacional) instituem abertamente um processo contra representantes de um movimento político sem a desculpa da violência, do terrorismo ou da luta armada. Um caso em que o tribunal admitiu a acusação do Vox, até agora um partido extraparlamentar de extrema-direita, xenófobo e ultranacionalista. Em que os acusados, que correm o risco de serem condenados a mais de 20 anos de prisão, são os presidentes de duas das principais associações da sociedade civil e membros de um governo democraticamente eleito por uma maioria de catalães (os restantes, juntamente com o Presidente Puigdemont, estão exilados na Bélgica, Inglaterra e Suíça, juntamente com representantes de outros partidos e movimentos de extrema-esquerda e rappers condenados por crimes de opinião). Neste caso, está em jogo a ideia de que sem violência, numa democracia, todas as ideias podem ser apoiadas e implementadas se respeitarem os direitos humanos e civis. Reagir como a opinião pública europeia está a fazer com indiferença a esta mudança radical na interpretação das regras do jogo político pode ter consequências enormes para o futuro dos nossos países.