Namoro em tempo de crise
Hoje é o dia de São Valentim, também conhecido como dia dos namorados. Uma data que leva a uma profunda reflexão dos casais e é momento para troca de mensagens e de presentes.
Os ramos de flores, as cestas do amor, os ursinhos de peluche, a tradicional caixa de bombons, cartões com recados amorosos e outros mimos são os presentes que mais dominam as montras das lojas na sua maioria decoradas com as cores vermelha, branca e rosa.
Justino Domingos, 44 anos, funcionário público, entende que a troca de presentes entre duas pessoas que se amam deve ser feita sempre, ou seja, todos dias e não apenas numa data como esta.
Há quem se antecipe na compra de presentes, mas outros, por razões várias, fazem-no apenas na véspera na intenção de fazer o melhor para agradar o parceiro ou parceira. Por esta altura há também muitas decepções. Maria Andrade, 35 anos, prefere não encaixar a data no seu bloco de apontamentos, por ser um dia de péssima memória. "A minha antiga relação terminou num dia como este. Deixou-me e nem sequer tive a sorte de trocar de presentes, pois fiquei com a prenda nos braços até ao amanhecer e quando dei por mim, quase me senti perdida".
Mário Andrade, 32 anos, diz que não sabe o que dar à sua cara metade, porque
quando chegasse o dia dos namorados, 14 de Fevereiro, os casais estavam mais à vontade para a escolha de presentes, mas nos dias de hoje nem tanto.
O historiador Nsambu Vicente admitiu que tal prática continua, embora em pequena escala, mas disse que aos poucos as pessoas estão consciencializadas a poupar mais.
"O poder de compra baixou dada a crise financeira. Hoje é preciso racionalizar os gastos e ter em atenção as prioridades. É possível observar isso nas ruas, onde se pode notar pouca exposição de prendas", notou.
No que se refere ao namoro na adolescência, ou namoro precoce, o historiador admitiu ser uma realidade no país, sobretudo nas grandes cidades. Referiu que tal prática pode acarretar grandes riscos, como gravidez precoce, podendo até dificultar o seu normal crescimento.
"As pessoas que aderem ao namoro precoce correm o risco ainda de terem vários parceiros até atingirem a idade adulta. Jovens com esse comportamento sujeitam-se a um sofrimento desnecessário", alertou.
De acordo com Nsambu Vicente, todas as datas devem ser vistas como dia dos namorados, incluindo os casados, e não apenas essa data. Disse que o simbolismo deve servir de reflexão para delinear os objectivos para aqueles que ainda são simples namorados. tudo está caro e ainda com a agravante de ter sido despedido da empresa. "Nem um jantar à luz de velas consigo dar à minha amada. Não sei o que fazer, por isso procuro até ignorar a data".
Enquanto uns passam pela data como se não existisse, outros têm no 14 de Fevereiro o momento de brindar a sua cara metade com um presente, de modo a fortificar a relação. João Arsénio, 48, é dos que espera presentear a sua esposa com um
jantar num restaurante na Ilha de Luanda, ao que se seguirá a troca de brindes. Diz ser uma alegria poder fazer o melhor para agradar a sua mais que tudo que sempre o acompanhou nos bons e maus momentos da vida.
"Cada dia é um dia, mas este é especial, nada tem a ver com os outros dias. Sou daqueles maridos que procura agradar a esposa sempre com algum brinde, mas o de hoje será bem diferente, ou seja, mais requintado", diz, visivelmente satisfeito.
Joana Arnaldo, 27anos, olha para a data com alegria, por acreditar no amor sincero do seu namorado e conta que há muito vem projectando como seria para eles o dia 14 de Fevereiro.
"Estou convicto de que vai ser em grande. No fim do expediente ele virá ao meu encontro. E eu estarei bem linda à espera do meu lindo. Pena é que a data tenha calhado num dia normal de trabalho, pois se fosse num fim-de-semana acredito que passaríamos bem longe daqui. Ah, estou ansiosa!", precisou.
Durante o dia de ontem, muitos casais ainda corriam na busca de um brinde para agradar ao parceiro. Apesar da crise financeira, boa parte das boutiques, casas de flores, sapatarias e outros locais foram muitos solicitados. Os restaurantes também receberam as visitas de muitos casais que aproveitaram o momento para reservar um espaço para O historiador Nsambu Vicente qualifica positivo o namoro do antigamente, em relação ao actual, pois, no passado, as pessoas partiam para uma relação com objectivos bem definidos. "Os ensinamentos, regras, eram passados aos jovens pelos pais ou tias".
O historiador diz que hoje, infelizmente, as pessoas partem para o namoro sem a mínima responsabilidade, sem objectivos definidos e muitas vezes não conhecendo o nome completo do namorado (a). "Em pouco tempo já têm relações sexuais, o que está na base da existência de “filhos órfãos de pais em vida”.
Explica que no antigamente o namoro era vivido de maneira diferente, cheio de ritos que, entretanto, se perderam. Argumentou que caso um homem estivesse interessado numa menina tinha de ter o consentimento dos pais e a jovem para acompanhar o namorado à rua tinha de se fazer acompanhar dos irmãos mais novos, para evitar motivações sexuais. O namorado podia visitar a namorada em casa dos pais dela, mas nunca o contrário.
Nsambu Vicente conta que outrora os namorados tinham de ficar sentados na presença dos pais e, quando se iam embora, os progenitores e a namorada acompanhavamno à porta para se despedirem. "Uma outra situação que se tinha em conta é a família que se poderia namorar; era preciso conhecer algumas vezes o clã (kanda) para evitar males futuros no casamento", explicou.
O historiador diz que hoje, infelizmente, as pessoas partem para o namoro sem a mínima responsabilidade, sem objectivos definidos e muitas vezes não conhecendo o nome completo do namorado (a). "Em pouco tempo já têm relações sexuais, o que está na base da existência de “filhos órfãos de pais em vida”.
Para ele, nos dias actuais, a palavra "sim" já não se espera, não se pede, infelizmente se arranca à força mediante um beijo, logo no primeiro dia do encontro.
Quanto ao chamado “amor material”, Nsambu Vicente esclarece que, infelizmente, é uma realidade, sublinhando que este tipo de amor está na base da promiscuidade sexual entre os jovens e, consequentemente, na elevada taxa de prevalência de doenças sexualmente transmissíveis.