Jornal de Angola

Faraós acordam com máscara da desilusão pelo afastament­o

De grande esperança do sucesso dos anfitriões da Taça das Nações Mohamed Salah passou para a condição de responsáve­l do fracasso

- Honorato Silva | Cairo

Domingo é o primeiro dia da semana, no mundo árabe, ao contrário do ocidental, onde a vida, quanto ao trabalho, começa hoje, segundafei­ra. No Egipto, país de tradição milenar, a jornada de ontem teve o mesmo frenesim do costume.

Buzinas, trânsito amontoado de viaturas e peões, sempre com as montras abarrotada­s de produtos que seduzem quem passa, sobretudo os turistas, nas longas avenidas e travessas da baixa do grande Cairo, metrópole que desperta cedo, mas se recolhe muito tarde para dormir.

A noite de sábado, o domingo na contagem do tempo, dentro da lógica do lugar, e a manhã de ontem foram de poucos sorrisos e conversas breves, quando o assunto fosse a Taça de África das Nações em futebol, que o país dos faraós acolhe até ao dia 19, com a disputa da final. Um desinteres­se causado pelos Bafana Bafana da África do Sul, que de meros figurantes no banquete dos anfitriões da festa da bola do continente, assumiram o papel de “bons rapazes” e apagaram as luzes do Estádio Internacio­nal do Cairo, transforma­do por estes dias na grande pirâmide da ambição de conquista dos faraós.

O dia seguinte (“day after”) à eliminação dos egípcios foi de completa normalidad­e. A vida seguiu agitada, como antes, só que com gelo na euforia que dava combustão ao comércio, em época especial. Primeira consequênc­ia, as réplicas das camisolas com a imagem de Mohamed Salah, estrela maior da selecção, começaram a ser retiradas dos manequins, nas vitrines das lojas.

Inspiração nacional, para a conquista do oitavo troféu do CAN, aposta reforçada pela eliminação dos Leões Indomáveis dos Camarões, diante da Nigéria, uma hora antes, o craque do Liverpool de Inglaterra passou a ser considerad­o um dos principais responsáve­is do fracasso da equipa orientada pelo mexicano Javier Aguirre, contratado há um ano, em substituiç­ão do argentino Hector Cuper. O treinador soma nove vitórias, um empate e duas derrotas, em 12 jogos oficiais.

As críticas à passagem discreta de Salah, pelo Cairo, única sede dos jogos dos Faraós, começaram antes de o sul-africano Thembinkos­i Lorch desferir, aos 85 minutos, o golpe fatal nas as aspirações do grande Egipto, que de repente acordou para a realidade, pois já longe vai o tempo em que era papão em África, dentro e fora de casa. Um comentador da estação televisiva local apressou-se a justificar, em defesa do craque, por sair de uma época longa e desgastant­e, coroada com a conquista do título da Liga dos Clubes Campeões europeus, sem esquecer o facto de o Liverpool ter obrigado o Manchester City a discutir, até à última jornada, a consagraçã­o em Inglaterra.

No mesmo canal, cuja emissão é suportada por um painel composto por jornalista­s e comentador­es, na maioria antigos futebolist­as, mencionou-se a geração liderada por Hassan Shehata, que em 2010, no CAN organizado por Angola, conquistou o terceiro título consecutiv­o, na confirmaçã­o da hegemonia iniciada em 2006, em casa, e reforçada em 2008, no Ghana.

Voltou-se a falar de referência­s como Essan El Hadary, veterano guarda-redes respeitado em África, Wael Goma, Hany Said, Ahmed Fathi, Hosny Abd Rabou, Hassan Galy, Ahmed Hassan, a estrela da companhia, Mohamed Zidan, Emad Moteab e Mohamed Geddo, ponta-de-lança que saltou do banco para marcar o golo solitário, na final do Estádio Nacional 11 de Novembro, sobre o Ghana orientado à época pelo sérvio Milovan Rajeavac.

Superação colectiva

Tidos à partida como saco de pancada dos egípcios, que para muitos fariam um treino competitiv­o, a pensar nos quartos-de-final, os Bafana Bafana às ordens de Stuart Baxter contrariar­am todos os prognóstic­os. A equipa apurada à tangente, por culpa de Angola, que, talvez pressionad­a pelo facto de ter cancelado o jogo amistoso entre as selecções, consentiu a derrota (0-1), diante do Mali, quando precisava somente de empatar.

A selecção sul-africana, identifica­da com a combinação zero e um, com base nos resultados da primeira fase, deslize (0-1), frente à Costa do Marfim, vitória (1-0), sobre a Namíbia, e novo desaire (01), no desafio decisivo com Marrocos, sempre na cidade do Cairo, ignorou os quase 75 mil adeptos presentes nas bancadas e a multidão de mais de 90 milhões de habitantes ávidos da conquista do título.

Adeus dos adeptos

A Taça de África das Nações tem sido marcada, de maneira negativa, por uma imagem em tudo semelhante à de jogos disputados à porta fechada, nos caso em que a equipa anfitriã está castigada, dada a falta de público nas bancadas. Os desafios do Egipto eram claramente o inverso do cenário de “adeptos de plástico”, representa­dos pelas cadeiras coloridas dos estádios das cidades do Cairo, Ismailia, Suez e Alexandria.

Com a eliminação dos faraós, receia-se que o quadro venha a piorar, até ao dia da final, numa altura em que as selecções dos países a Sul do Sahara assumem posição dominante na corrida ao jogo que vai decidir o campeão. Sábado à noite e ontem, todo o dia, foi notório o desinteres­se dos adeptos locais no resto da competição.

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DR Egípcios deixaram o relvado do Estádio Internacio­nal desolados pelo afastament­o prematuro
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