A Reforma da Justiça e a implementação do novo mapa judiciário
O apoio do Executivo à reforma da justiça, sem prejuízo para a independência dos tribunais, tem sido uma das maiores conquistas recentes da consolidação do nosso processo democrático. O engajamento do Executivo no contributo directo para que seja consolidada a afirmação da independência do poder judicial perpassa pela autonomia administrativa, financeira e patrimonial dos tribunais, mas não se esgota nisso. As acções em curso no ano judicial 2019 estão a ser marcadas positivamente pela implementação dos tribunais de Comarca. É um trabalho importantíssimo que dá à Justiça a necessária autonomia, ao mesmo tempo que oferece ao cidadão um serviço ágil, necessário e próximo.
O Eixo 4 do Programa de Desenvolvimento Nacional (PDN), em curso, é claro ao destacar a importância da consolidação da paz, reforço do Estado Democrático e de Direito, boa governação, reforma do Estado e descentralização, pois ali há o compromisso de inserir o cidadão nas acções que afectam directamente a vida de todos e cada um dos angolanos. “A sociedade civil constitui um actor relevante do desenvolvimento dos países, pelo conhecimento próximo dos problemas de certos grupos de cidadãos e regiões, bem como pela sua capacidade de mobilização da população”, é o que está expresso neste eixo.
No quadro da Reforma da Justiça e do Direito, desde o processo de finalização e aprovação pela Assembleia Nacional da proposta do novo Código Penal e da Proposta de Lei sobre o Regime Jurídico de Recuperação de Empresas em Insolvência, o país está a testemunhar verdadeiros avanços naquilo que tem sido destacado como “independência da justiça”. É de fundamental importância para a nossa democracia o registo destes progressos com a reforma do sector judiciário. Nesse sentido, estão enquadrados os tribunais de Comarca e da Relação, cuja criação tem sustentação na lei, e que estão a avançar num ritmo desejável.
Sabemos que a extensão dos centros de Resolução Extra Judicial de Litígios a outros pontos do país, bem como a transferência de recursos financeiros, materiais e humanos, dotando-os de maior autonomia, são factores que asseguram aos operadores da Justiça a total condição para o cumprimento das atribuições que lhes são conferidas e que convergem - no conjunto de esforços - para a prática de actos em prol da justiça e do Estado de Direito.
De volta ao Eixo 4 do PDN, recordamos o que ali está escrito sobre a municipalização, e que - numa avaliação isenta - contempla a autonomia dos Tribunais de Comarca: “a base para o desenvolvimento de uma cidadania activa em Angola é bastante rica, constituindo, a organização comunitária da sociedade e o reforço da municipalização, oportunidades para que a participação dos cidadãos, a nível local, funcione como um complemento da acção do Estado. Esta intervenção da sociedade civil é, também, muito relevante a nível central, com a sua crescente participação na definição de políticas públicas e também no escrutínio da acção do Estado”, segundo o documento.
Quando em Fevereiro de 2015 a Assembleia Nacional aprovou a Lei nº. 2/15, Lei da Organização e Funcionamento dos Tribunais da Jurisdição Comum, vimos - a partir desta Lei - a aprovação e orientação para a implementação de um novo Mapa Judiciário para o País, daí a designação com que foi baptizada: “Lei da reforma judiciária”. Reformada ou modernizada, o certo é que a nova lei carrega em si três grandes objectivos que constituem desafios que se pretende alcançar, são eles: a aproximação dos tribunais aos cidadãos; tornar os tribunais mais céleres e mais eficazes, bem como consolidar o Estado de Direito.
Os desafios são grandes e proporcionais ao grau de importância da chamada reforma. Na Lei está previsto que os dezanove Tribunais Provinciais existentes sejam substituídos por sessenta e dois Tribunais de Comarca distribuídos por todo o País e agrupando um ou mais municípios. Esta implementação teve início em Março deste ano e, até aqui, foram já inaugurados 12 Tribunais de Comarca: Lobito, Benguela, Sumbe, Dande, Soyo, Mbanza Kongo, Cuanhama, Lubango, Caconda/Caluquembe, Moçâmedes e Tômbua. Este êxito é fruto de um trabalho incansável dos actores da justiça que pretendem inaugurar, até Dezembro, quarenta Tribunais de Comarca e concluir a meta de sessenta e dois já no próximo ano.
Quando falamos sobre Tribunais de Comarca, estamos a falar não apenas sobre construção de edifícios. Aqui o cidadão deve compreender a complexidade desta mudança de cultura de uma das mais importantes instituições da estrutura democrática de qualquer nação, a Justiça. Para além do apetrechamento das instalações, devemos destacar também os recursos humanos, através de profissionais devidamente preparados para o exercício das suas funções, para além do necessário destaque ao facto de que cento e trinta e dois juízes de Direito serão colocados nesses Tribunais de Comarca.
Os trabalhos transcendem os Tribunais de Comarca e atingem outras acções de igual relevância, pois está também previsto que, dentro de sessenta ou noventa dias, sejam inaugurados os dois primeiros Tribunais da Relação (serão cinco no total) previstos no mapa judiciário: os Tribunais da Relação de Luanda e de Benguela, estando os seus juízes (juízes desembargadores) em processo de selecção e formação que termina ainda neste mês de Julho. Com os Tribunais da Relação, que são Tribunais de 2° instância, será possível diminuir a sobrecarga de recursos que vão para o Tribunal Supremo, o que permitirá a este funcionar verdadeiramente como um Tribunal Superior, que julga questões de fundo e de direito.
A independência do Poder Judiciário permitirá que os juízes tomem decisões coerentes com a preservação dos direitos e liberdades.
Esta missão tão desafiadora, sobretudo pelos obstáculos que toda mudança de cultura institucional impõe, faz da tarefa de pôr em prática a Reforma da Justiça e a implementação do mapa judiciário, tantas vezes posta à prova, uma conquista de valor inestimável e que assegura a preservação e defesa do Estado Democrático e de Direito.