Dialogar para produzir
Os mercados financeiros funcionam muito à base de previsões e reacções a decisões ou mesmo a rumores sobre eventuais factos sucedidos ou a acontecer. Se Angola tivesse uma bolsa de valores a funcionar a pleno vapor certamente que a semana finda teria sido um bom tónico para a subida dos índices, tais os sinais dados pelo governo e agentes económicos durante os encontros que mantiveram, mesmo se os resultados práticos ainda levem tempo a aparecer.
Está provado que o paradigma de governação de decidir pelos governados não leva a lugar algum que não seja o desperdício e o aprofundar das assimetrias regionais e sociais. O diálogo e a concertação são tão importantes quanto os planos mesmo os copiados de livros apressadamente lidos ou de experiências de outras latitudes.
Governo e empresários sentaram-se à mesa e discutiram os problemas que os afligem: o executivo, naturalmente apostado em ver crescer os indicadores económicos e a resolver os problemas básicos dos cidadãos; e os agentes económicos a elencarem os obstáculos que ainda encontram para que possam, efectivamente, desenvolver a sua actividade sem os constrangimentos e as barreiras do passado e actuais. Não é um facto inédito na nossa história recente. Já antes se realizaram encontros similares (com excepção do Conselho de Ministros) só que em contexto diferente, um contexto que será responsável por muito do mau período que atravessa a economia, por culpa de uma obsessão por um capitalismo selvagem, sem rei nem roque e em que as barreiras entre servidores públicos e os ditos empresários eram apenas de fachada.
O equilíbrio das contas públicas é uma das prioridades do governo e isso só se consegue com políticas macroeconómicas cujos resultados demoram a ser percebidos pelos cidadãos. Ainda que tímidos eles têm surgido e há quase que unanimidade entre os grandes centros de avaliação da economia que se está no bom caminho, embora se saiba haver quem defenda maior celeridade e agressividade em algumas reformas. Muitas das medidas, tiradas de receitas austeras de programas que nem sempre resultam nos seus propósitos, algumas vezes até produzindo efeitos contraproducentes, chocam com a realidade do tecido empresarial do país, asfixiando-o e tornando cada vez mais difícil a sua sobrevivência.
Está claro que é com e no sector privado que se vão encontrar grande parte das soluções para a recuperação económica, do fomento do emprego, da diversificação e do aumento da produção interna e das exportações que não apenas do petróleo e diamantes. A roda já foi inventada faz tempo e não se está a descobrir nenhum ovo de Colombo ao constatar que, a continuar assim, a economia não sairá do estágio de agonia em que se encontra e que portanto há que integrar o mais possível o empresariado privado na cadeia produtiva e de serviços.
Foi tendo isso em conta que se criaram um sem número de programas de apoio que acabaram, no mais das vezes, em resultados nulos ou insignificantes, apesar dos biliões e biliões dos agora raros dólares que consumiram sem quase qualquer contrapartida, apetecendo quase dizer uma blasfémia que se dividissem esse dinheiro individualmente pelos cidadãos muito provavelmente a sua vida estaria hoje bem melhor.
Ditos empresários que receberam de mão beijada indústrias e negócios em funcionamento que hoje estão falidas e inoperantes, apesar de grande parte encabeçar as listas dos grandes devedores e ser responsável pelo crédito mal parado que assombra a nossa banca comercial.
Então o que diferencia os recentes encontros dos havidos no passado e que acabaram nesse voraz acumular primitivo de capital servido em doses de corrupção, peculato, nepotismo e impunidade em níveis que assustam até os menos desentendidos ou os mais distraídos, alguns dos quais estão a ser investigados e tratados pelos órgãos competentes da administração da justiça?
Primeiro isso mesmo: a justiça! Aquela farra entre agentes públicos que eram (e são) simultaneamente empresários e que faziam (fazem) negócios consigo próprios tem diminuído ou se sofisticado pelo receio da acção da justiça no quadro da cruzada contra a corrupção e contra a impunidade. Acabaram-se os "intocáveis" e se alguma coisa essa campanha já ganhou foi mesmo essa percepção de que ninguém está acima da lei! E isso inibe que os negócios entre si ou familiares continuem como no passado, abrindo espaço para que os verdadeiros empreendedores mostrem as suas capacidades, sem necessidade de uma costela a algum do poder ou ver o seu projecto ser roubado por quem deveria decidir, afinal um concorrente desleal.
Depois ainda, os programas gizados estão a ser discutidos com aqueles que os vão materializar e que têm contribuído com as suas opiniões e experiências para que não se fique pelas cábulas de cátedra e se olhe mais seriamente para a economia real, sem esquecer os objectivos macros do défice, da arrecadação, da inflação, do endividamento, da moeda ou da despesa. Dito isto, parece estarem criadas as bases para um novo relacionamento entre o Governo e os empresários privados que, por seu lado, não podem passar a vida no muro das lamentações nem verem o Estado como o único cliente dos seus negócios.
O caminho é menor Estado para se ter melhor Estado e este possa desenvolver competentemente as suas responsabilidades, sobretudo sociais, alienando património e actividades que não são sua função. Mas de uma forma transparente e não mais seguindo a regra dos mesmos do costume ou substituí-los por novos das novas famílias.