Projecto poético de João Tala
Bem amadas por muitos, mal amadas por outros tantos, ainda não totalmente compreendidas por todos, as redes sociais trouxeram ao espaço público o mais comum dos cidadãos, que assim pode debitar as suas ideias, sentimentos e aspirações no mesmo lugar e em
Alarmados
com essa disrupção do senso comum e o nivelamento horizontal da opinião pública, não poucos intelectuais, habituados a debitar o pensamento do alto inconteste da sua autoridade, dotados de mal disfarçado horror ao vulgo, e também receosos da devassa dos dados pessoais pelas companhias tecnológicas, desandaram de tais redes sociais. Outros tantos permaneceram e constituem-se em pontos elevados e brilhantes num meio em que os egos têm rédea solta e se manifestam, por vezes, das formas mais aberrantes.
Um desses que permaneceram e contribuem para “salvar” as redes sociais, dando-lhe verdadeiro substracto cultural, muito para lá do habitual verniz, é o poeta João Tala, com o seu projecto “Inéditos ao Sábado”, que consiste em publicar ao sábado um poema novíssimo, inédito. Se atendermos que João Tala é “tão somente” um dos maiores poetas angolanos vivos, logo nos daremos conta da generosidade do seu gesto e, ao mesmo tempo, da sua admirável capacidade de criação.
Ao contrário do que se poderia pensar, os seus “Inéditos ao Sábado”, que já têm um ano de existência, não banalizam a poesia, não a contaminam com os efeitos colaterais resultantes de relações sociais que tendem para o uniformismo. A poesia que João Tala escreve e publica em primeiríssima mão nas redes sociais, paradoxalmente, respira e transpira a vida do dia-a-dia, da vida vivida em carne e osso; pouco dizem do mundo virtual onde são estampados, a Internet, ou, mais vastamente,do mundo das novas tecnologias de informação e comunicação.
O mundo que “Inéditos ao Sábado” desvela tem raízes no bairro Camama, nas suas ruas por asfaltar nos seres humanos que se movem nessas ruas, seja à luz do sol ou feito silhueta à luz da lua ou das lâmpadas nos muros dos quintais. João Tala leva às redes sociais as preciosidades do seu labor poético (desconfio eu) como um exercício de liberdade e de poder ante as enormes dificuldades, hoje por hoje, de publicação do livro. Ele exalta assim as redes sociais como meio de expressão da liberdade de criação e de pensamento; leva a esse meio o produto da sua criação poética, enobrecendo-o com o que de melhor o ser humano é capaz de produzir.
Poeta, ficcionista e médico de profissão, João Tala é autor dos livros “A Forma dos Desejos”, poesia, Prémio Primeiro Livro da UEA, 1997, “O Gasto da Semente”, poesia, menção honrosa do Prémio Sagrada Esperança, 2000, “A forma dos Desejos II”, poesia, 2003, “Lugar Assim”, poesia, 2004, “Os Dias e os Tumultos”, contos, Grande Prémio de Ficção da UEA, 2004, “A Vitória é Uma Ilusão de Filósofos e de Loucos”, Grande Prémio de Poesia da UEA, 2005, “Surreambulando”, contos, UEA, 2007, “Forno Feminino”, poesia, 2009, “Rosas & Munhungo”, 2011, e “Rua da Insónia”, 2014.