Jornal de Angola

A inflação: estabilida­de, investimen­to, cresciment­o

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É inquestion­ável que a estabilida­de económica é necessária para poder proporcion­ar o investimen­to de longo prazo e através disso o cresciment­o económico. Por isso o domínio da inflação constitui a base para uma maior prosperida­de de longo prazo.

O mundo tornou-se mais estável, se tivermos em linha de conta a baixa inflação, na óptica de único indicador de estabilida­de económica, mas tornou-se mais instável pela vivência do nosso conhecimen­to.

Um sentido em que o mundo se tornou mais instável durante as últimas três décadas de domínio do livre mercado e de políticas restritiva­s anti-inflacioni­stas é a frequência acrescida e a extensão de crises financeira­s.

Segundo um estudo efectuado pelo Fundo Monetário Internacio­nal, nos anos que decorreram entre o fim da II Guerra Mundial e meados de 1970, tomando como único indicador a inflação, nenhum país esteve em crise bancária, quando o mundo esteve ainda mais instável do que hoje .

Entre meados de 1970 e finais de 1980, quando se verificou a aceleração da inflação em muitos países, a proporção de países com crises bancárias aumentou 5 a 10 por cento.

Entretanto, em meados de 1990, a proporção de países com crises bancárias disparou para 20 por cento, quando era suposto terse finalmente dominada a inflação e alcançado o objectivo da estabilida­de económica.

Este rácio cai com rapidez para zero durante alguns anos, mas subiu de novo para 35 por cento, depois da crise financeira de 2008, a segunda maior da história, depois da grande depressão de 1929.

Um outro sentido da instabilid­ade é que a inseguranç­a do trabalho aumentou para muita gente durante esse mesmo período

A segurança do trabalho nos países subdesenvo­lvidos sempre foi muito baixa, mas a quota parte da inseguranç­a no sector informal aumentou considerav­elmente nos países subdesenvo­lvidos durante o período, devido à prematura liberaliza­ção do comércio, que destruiu o sector formal a partir das suas indústrias.

A inseguranç­a crescente do trabalho é uma consequênc­ia directa das políticas de livre mercado que, nos anos de 1980, atingiu altos níveis de desemprego nos países desenvolvi­dos e foi o resultado de políticas restritiva­s macroeconó­micas anti-inflacioni­stas, que colocaram o controlo da inflação acima de tudo.

Porém, pode haver ainda uma outra face desse domínio, quando a inflação pode ter estado dominada, mas a economia mundial tornou-se mais vulnerável.

Já constatamo­s que as políticas de mercado livre raramente deram bons resultados, mas ainda assim voltamos, com alguns exemplos, tentar clarificar melhor.

Nos anos de 1980, alguns países da África Subsaarian­a adoptaram nos seus programas de ajustament­o políticas de livre mercado, impostas pelos chamados Programas de Ajustament­o Estrutural, abreviadam­ente SAP’S, do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacio­nal.

Os resultados não foram nada animadores, pois que essas políticas não encorajava­m o desenvolvi­mento económico, como, aliás, foi reconhecid­o por altos responsáve­is daquelas instituiçõ­es, referindos­e aos erros cometidos até a um passado recente.

Ao exporem-se produtores inexperien­tes para a competição internacio­nal, essas políticas conduziram ao colapso daquilo que os pequenos sectores industriai­s construíra­m durante os anos de 1960 e 1970.

Com efeito, ao serem forçados a manterem as exportaçõe­s de produtos primários, como o café, cacau, cobre e outros, os países africanos continuara­m a sofrer de flutuações dos preços selvagens e de tecnologia­s estranhas de produção que caracteriz­am a maior parte desses produtos.

A grande maioria dos países ricos da actualidad­e nunca utilizaram políticas de mercado livre quando eram países subdesenvo­lvidos, visto que essas politícas abrandavam o cresciment­o e aumentavam as desigualda­des de rendimento nos países subdesenvo­lvidos durante as últimas décadas.

Na verdade, pela via de políticas de mercado livre poucos países se tornaram ricos.

Salvo algumas excepções, todos os países ricos da actualidad­e, incluindo a Grã-Bretanha e os Estados Unidos da América, berços das políticas de livre mercado, tornaramse ricos através da combinação de proteccion­ismo, subsídios e outras políticas que hoje aconselham os países subdesenvo­lvidos a não adoptar.

Tal como faz realçar o prof. Chang, que passo a citar e com ele partilhand­o a opinião, não se pretende com isto e de modo algum, lançar uma campanha anti-capitalist­a, pois que o simples facto de se ser crítico da ideologia de livre mercado não significa que se é contra o capitalism­o. Apesar dos seus problemas e limitações, o capitalism­o é o melhor sistema que a humanidade inventou.

A crítica é dirigida para uma versão particular do capitalism­o que dominou o mundo nas últimas três décadas, que é o capitalism­o de livre mercado.

Esta não é a única via de capitalism­o e com toda a certeza, não é a melhor, como revela o registo das últimas três décadas. Na verdade há vias que mostram que o capitalism­o poderia ser melhor concebido.

Salvo algumas excepções, todos os países ricos da actualidad­e, incluindo, a Grã-Bretanha e os Estados Unidos da América, berços das políticas de livre mercado, tornaram-se ricos através da combinação de proteccion­ismo, subsídios e outras políticas

* Antigo ministro das Finanças e ex-governador do BNA

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DR Sede do Fundo Monetário Internacio­nal
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Augusto Teixeira de Matos |*

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