Diversidade cultural e o “show” dos produtores
A cidade de Luanda foi transformada na Capital da Paz, com a realização do Fórum Mundial da Cultura da Paz e da Juventude, evento que decorreu de 18 a 22 de Setembro. Muito tem sido reportado, mas pouco foi explorado em relação às actividades musicais e à
Os concertos,
em alguns casos, ficaram marcados pelas péssimas condições sonoras, falta de comunicação e informação em relação aos palcos, e, mais uma vez, a “velha” questão dos horários e do alinhamento, dentre outros aspectos.
Um dos concertos marcantes foi o do grupo sul-africano Kwanele, numa actuação que não ficou marcada apenas pela música. A dança, o teatro e outras vertentes das artes performativas estiveram em grande. Com uma banda consistente e vocalistas jovens e competentes, tiveram ainda a presença de uma das grandes senhoras da música sul-africana, Mama Sibonguile Khumalo, que soltou a sua voz ainda na época do Apartheid.
Kwanele fez um autêntico musical, com os corais femininos. As coreografias dos dançarinos misturavam muito bem o que absorveram da tradição e os toques da contemporaneidade. Durante cerca de uma hora, também duas estórias foram contadas, ambas verdadeiras e fortes, a ponto de proporcionarem choros aos mais sensíveis do público. A primeira, de um jovem que se envolveu no tráfico de droga, e a segunda protagonizada por Mimi Manabolo, actriz e bailarina, que partilhou a sua vida, marcada por violações, abandono e separação da mãe, enquanto o avô era o seu porto seguro. Ambos mostraram como a arte salvou as suas vidas.
Os representantes da África do Sul voltaram a apresentar-se noutros formatos, com destaque para os coros das senhoras, Afrikas Mamas, mas que, lá está o “malefício” da falta de informação, quando finalmente foi anunciado que o concerto aconteceria no Palco da Fortaleza, elas já estavam no fim da actuação.
Outros experimentos
Também foi interessante ver e ouvir os cabo-verdianos “Azagua”, uma formação jovem que, apesar de existir como grupo há pouco mais de um ano, os seus integrantes individualmente andam em vários projectos. Apresentaram letras de paz, motivação e um swing próprio.
A actuação dos malianos, que apresentaram os ritmos e máscaras da tribo Dogon, cativou os presentes, algo de realce no stand do Mali, que, a par da Namíbia, foi dos poucos países representados ao mais alto nível. A exposição de manuscritos recuperados da histórica biblioteca de Tombuctu foi algo deveras notável.
O Rwanda trouxe a Nephews Band, uma jovem formação que aposta nos ritmos tradicionais, que, durante a sua actuação, partilhou o palco com dois artistas plásticos, que pintaram dois quadros. O Egipto, com Toshika, e os marroquinos dos Ghnawa, não decepcionaram, proporcionaram ritmos alegres e conquistaram a simpatia do público.
A prata da casa
A produção adoptou um critério inclusivo na selecção dos artistas. A presença de MCK e dos Fat Soldiers levou ao evento o rap de protesto. Conjunto Angola 70, Paulo Flores, Banda Movimento, Calabeto, Dom Caetano, Yuri da Cunha, Telma Lee, Hélder Mendes, Ndaka yo Wiñi, Gari Sinedima, Duo Canhoto, Dalú Roger, Sanguito, Pop Show, Bona Ska, Grupo Feminino, Ukai, Gelson Castro, Kituxi, Ixi Rise, Afrikkanitha, Etno Ngola, Nguami Maka, Irmãos Tanzi, Mito Gaspar, Lito Graça, Boto Trindade, Amosi Just a Label, Clington Experiment, Anabela Aya e muitos mais nomes subiram aos vários palcos montados.
Os concertos trouxeram algumas notas não positivas e levantaram várias questões. Num vídeo que se tornou viral, Yola Semedo, apesar de reconhecer os esforços da produção, insurgiu-se contra a qualidade do som e das condições criadas para os músicos. Já Totó ST, numa postagem numa das redes sociais, escreveu que continua a aguardar o dia da confirmação da sua actuação, pois tivera sido contactado. Kizua Gourgel disse que depois de ser também contactado com antecedência, apenas recebeu uma ligação dias antes de que seria a sua actuação, pelo que manifestou-se indisponível.
Apesar de não citarem directamente a produção, Kizua eAfrikkanithaescreveramalertando as marcas que apostam em eventos e aos músicos para “deixarem a mendicidade”.
Os produtores não ficaram de fora. Riquinho, que no passado esteve a frente de várias produções, questionou as modalidades de selecção dos organizadores. Kayaya Júnior e Karina Barbosa, rostos da Step Model, Otaniel Silva, da Mano a Mano, e Nino Republicano, da LS Republicano, foram os “super-produtores”.
Semba no Palácio de Ferro
No Palácio de Ferro aconteceu uma das poucas actividades “paralelas” da Bienal que teve visibilidade, o “Mais Semba Festival”, iniciativa da Fundação Sindika Dokolo, com a coordenação de Lito Graça. O espaço que depois da forte agenda de espectáculos semanais, durante a III Trienal de Luanda, ficou transformado em parque de estacionamento de viaturas, timidamente voltou a erguerse e a dar vida cultural à exRua Direita de Luanda, actual Rua Major Kanhangulo, com os cincos dias de concertos.
No “Mais Semba Festival”, que teve início no dia 17 de Setembro, as “hostilidades” foram abertas pelos Kiezos, que acompanharam Elias Dya Dimuezo, Massano Júnior, Tony do Fumo Filho e Givago. No segundo dia, a Banda Welwitshia esteve na companhia de Legalize, Zé Manico e Dom Caetano. Estavam programados ainda Robertinho, Voto Gonçalves e Maya Kool, com a Banda Maravilha. No penúltimo dia a Banda Yetu fez o suporte instrumental a António Paulino, Mig, Pedro Cabenha e Lolito da Paixão.
No encerramento do projecto, no dia 21 de Setembro, a Banda Movimento teve a responsabilidade de acompanhar Carlos Lamartine, Lulas da Paixão e Chiquinha do Bangão.
O “Mais Semba Festival” é um ante-projecto ou ensaio do que será um festival anual de Semba, numa organização da Fundação Sindika Dokolo, com produção da Onart.