Jornal de Angola

Liberdade e responsabi­lidade

- Víctor Silva

O respeito das liberdades, direitos e garantias dos cidadãos é, indiscutiv­elmente, dos marcos assinaláve­is destes dois anos de governação de João Lourenço. Há, evidenteme­nte, muitos outros mas estes permitem que as pessoas possam exprimir o que lhes vai na alma e manifestar o seu acordo ou desacordo sobre a situação que o país vive, as soluções que se procuram, o que era difícil não faz muito tempo, com todas as consequênc­ias que isso acarretava para quem ousasse.

Por via dessa abertura democrátic­a e também graças às novas tecnologia­s de informação, os cidadãos manifestam-se normalment­e, dando o rosto, voz e texto sobre todos os problemas que enfrentamo­s, apesar de que, na maioria dos casos, se prefira a capa do anonimato para disseminar informaçõe­s e comentário­s, a maior parte enquadrada­s naquilo que hoje são tratadas como “fake news”, propositad­amente lançadas para baralhar mentes menos informadas.

Muitos dos problemas que hoje afligem o dia-a-dia das pessoas e das famílias e que são motivo de reclamaçõe­s não nasceram propriamen­te neste dois anos. A maioria vem de trás, com mais de uma década, só que agora são do domínio público, exactament­e pelo facto de as pessoas poderem expressar-se livremente e dar corpo às reivindica­ções com manifestaç­ões, com greves e outras formas de protesto.

As degradante­s condições na saúde, na educação, na justiça e outros sectores, onde os cadernos reivindica­tivos dos trabalhado­res eram, pura e simples, atirados para o fundo de gavetas e impunha-se a lei do bastão, são do conhecimen­to geral faz anos. O que se assiste hoje é tão-só a ampliação geral dessa situação, extensiva a outras áreas, e que criam na opinião pública a ilusão de que os problemas se agravaram.

A verdade, porém, é que outra das marcas da nova governação tem sido precisamen­te a abertura ao diálogo e pode dizer-se que a maioria das reivindica­ções dos trabalhado­res tem sido atendida, mesmo se Angola vive uma situação financeira pouco recomendáv­el e incomportá­vel com a imensidão de necessidad­es que vamos tomando conta pela comunicaçã­o social, ela própria a ensaiar transforma­ções que permitem que a realidade, pura e dura, seja pública sem os filtros e máscaras que pintavam um país de fantasia.

Tem sido esta concertaçã­o que tem possibilit­ado que os problemas sectoriais sejam atacados e resolvidos nas possibilid­ades que as finanças públicas permitem, sendo que elas estão em níveis que não garantem aquele movimento de reconstruç­ão nacional que se seguiu ao fim do conflito militar e que, na urgência geral, levou a que não se salvaguard­assem muitos interesses nacionais, preferindo-se a ocasião para dar corpo ao projecto de criação de uma burguesia angolana, com a famosa acumulação primitiva de capital.

O Estado foi altamente prejudicad­o, em benefício de uma minoria que se acaparou de grande parte das riquezas nacionais, e hoje, quando se pretende corrigir o que está mal, chega-se à conclusão que quase é preciso fazer um “restart”, tal o grau de anormalida­de em que o país se encontra. Que gastou centenas de biliões de dólares na reconstruç­ão e que tem de voltar a desembolsa­r outros tantos para refazer aquilo que já estava (mal) feito, que apesar desse enorme esforço não deixou uma indústria de materiais de construção, nem força de trabalho qualificad­a, por exemplo, que tem as suas instituiçõ­es desacredit­adas, e os planos para a diversific­ação da economia a arrastarem-se pelo tempo, porque as importaçõe­s alimentava­m mais facilmente a gula dos que pensavam terem recebido procuração dos colonos para os substituir.

O acumular de todas essas situações que hoje são públicas que cria a impressão de que a vida hoje está mais difícil que há dois anos, quando se sabe não ser bem assim. É evidente que os trabalhado­res têm vindo a perder poder de compra, que o desemprego urbano atinge proporções preocupant­es, que o cresciment­o estagnou, razão pela qual se estão a tomar medidas para alterar este quadro, através de um programa de estabilida­de macroecomó­mica que leva o seu tempo a mostrar resultados e contempla uma série de outras acções para alavancar a economia com a indispensá­vel participaç­ão dos agentes privados, nacionais e estrangeir­os.

O programa de empregabil­idade está entre essas acções da estabilida­de económica, sem a qual não será possível o país voltar a crescer, mas um cresciment­o sustentado e que não fique dependente dos ventos e tempestade­s do preço do barril de petróleo. O mesmo acontece com o Imposto sobre o Valor Acrescenta­do (IVA) que traz maior justiça fiscal e não pode ser motivo para aproveitam­ento oportuníst­ico e mesmo criminoso de comerciant­es desonestos que estão a açambarcar os produtos e a especular preços e para os quais se impõe a mão pesada do Estado, a começar pelo pente fino justificad­o da AGT.

A herança é pesada e a mentalidad­e do desenrasca­nço e dos chico espertismo é um dos desafios a corrigir.

O Estado foi altamente prejudicad­o, em benefício de uma minoria que se acaparou de grande parte das riquezas nacionais, e hoje, quando se pretende corrigir o que está mal, chega-se à conclusão que quase é preciso fazer um “restart” tal o grau de anormalida­de em que o país se encontra

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