Corrupção tirou do país 80 mil milhões de dólares
Soma resulta de dados secundários, não passando, por isso, de um indicador passível de estar aquém do valor real desencaminhado
Estudos do Centro de Investigação Científica da Universidade Católica estimam em cerca de 80 mil milhões de dólares o valor previsto para investimentos que terá sido perdido em Angola, entre 2002 e 2014, anunciou o especialista angolano em matéria de combate ao branqueamento de capitais e à corrupção, Benja Satula.
O país perdeu investimentos de cerca de 80 mil milhões de dólares, valor que se estima ter sido desviado, entre 2002 e 2014, segundo um estudo do Centro de Investigação Científica da Universidade Católica (CEIC), citado pelo jurista Benja Satula.
Em entrevista ao Jornal Económico, um semanário português, o também professor da Universidade Católica de Angola sublinha que o estudo do CEIC aponta uma previsão daquilo que deveria ter sido aplicado em investimentos e não foi, em 12 anos.
Na entrevista, centrada, fundamentalmente, no combate à corrupção e à impunidade, o docente sublinha que "o estudo baseia-se em dados secundários", não passando, por isso, de um indicador passível de estar aquém do valor real.
“Honestamente, não sei qual é a expectativa das autoridades sobre o valor que foi ilicitamente expatriado, relativamente ao qual se pretende proceder à transferência da titularidade para o Estado, ou repatriar para Angola”, afirmou.
Na sua opinião, qualquer que seja o valor, será repatriado na medida do que for recuperável.
De acordo com Benja Satula, neste momento Angola está num processo de moralização da sociedade, que implicou, desde a campanha eleitoral do MPLA, em 2017, que o partido apoiasse o combate às práticas de corrupção, elegendo-o como um dos principais objectivos políticos.
“Mesmo que, do meu ponto de vista, se fale de forma genérica no combate à corrupção, considero que muito do que tem estado a acontecer é um combate à impunidade. A grande mudança ocorreu desde 2017, mais propriamente no final de 2017 e início de 2018”, disse. “Foi o reacender deste desafio”, enfatizou.
No quadro do combate à corrupção, lembrou, muitos titulares de cargos de direcção e chefia têm sido chamados a inquéritos, em processos de instrução preparatória com acusações, com pronúncias e com julgamentos relativos não só à corrupção propriamente dita, mas também a alguns crimes derivados do conceito amplo de corrupção.
Esses crimes estão fundamentalmente relacionados à situações de impunidade, crimes como peculato, desvio e inobservância das normas do Plano e do Orçamento, disse.
Segundo Benja Satula, é isto que se tem vindo a assistir recentemente em Angola, onde “todos estão mobilizados para este combate, cada um na sua área”.
Questionado sobre o que deverá ser tido em conta no combate à corrupção, explicou que foi averiguado se existem ou não mecanismos suficientes para realizar este combate e a resposta foi positiva.
“Até pela própria imposição das instituições internacionais, sobretudo do Banco Mundial, o FMI e outras organizações de que Angola faz parte, temos estado a produzir, desde 2010, legislação contra o branqueamento de capitais e, de 2011 a 2015, o país aprovou uma série de pacotes legislativos justamente para cobrir e fazer um melhor combate ao branqueamento de capitais”, referiu.
José Filomeno dos Santos
Noutra vertente da entrevista, Benja Satula disse já não ser advogado de José Filomeno dos Santos – filho do antigo Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, no processo em que este é arguido por suspeita de tentativa de burla ao Estado angolano.
“Fui advogado de José Filomeno dos Santos - aliás foi das decisões mais complicadas que o nosso escritório Legis Veritas teve de tomar na altura. Quando fomos solicitados, entendemos na altura que devíamos aceitar o patrocínio”, comentou.
“O país começava a reorganizar-se e havia alguma necessidade de nós - que temos estado a trabalhar no combate à criminalidade económica e financeira podermos oferecer este patrocínio. Mas neste momento já não representamos José Filomeno dos Santos, há mais ou menos 30 dias”, confirmou.
Licenciado em Direito, pela Universidade Católica de Angola, Benja Satula é mestre em Ciências Jurídico-Penais e Jurídico-Criminais, pela Universidade Católica Portuguesa.
O docente é o director do Centro de Investigação do Direito da Universidade Católica de Angola - CID UCAN, e sócio-fundador da sociedade Legis Veritas & Associados - Sociedade de Advogados.
Autor do livro “Branqueamento de capitais”, o jurista tem artigos publicados em várias revistas, entre as quais, “A Radiografia aos Direitos Humanos em Angola”.