Ordem ou desordem mundial e em que direcção caminhamos?
Os vários erros legados pela história universal continuam a perseguir a era contemporânea e a colocar em causa a vigente ordem mundial. Torna-se inevitável afirmar que nos últimos 50 anos o mundo não conseguiu caminhar com necessária estabilidade e os conflitos continuam a dominar as relações internacionais. A ordem internacional que emerge após o termo da Segunda Guerra Mundial definiu fronteiras entre os que perderam a guerra, por um lado, e os que ganharam, por outro. E o pior pecado desta ordem é o de ter nascido num contexto de divisão de interesses estratégicos entre os vencedores e de ter isolado todo o resto do mundo. Entre os que venceram e perderam a Segunda Guerra Mundial se pode, ainda, juntar os antigos prisioneiros dos interesses expansionistas que continuam, até ao momento, a lutar no sentido de desarmadilhar um conjunto de minas que ajudam a montar.
Com a ordem estabelecida, em 1945, as relações internacionais conheceram, de seguida, uma persistente luta de interesses que não favoreceu a estabilidade. De 1945 em diante o mundo começou a ver a emergência de uma desordem que condenava, silenciosamante, a ordem estabelecida. Esta desordem introduziu um caos total nas relações internacionais e se tornou muito mais expressiva com a Guerra Fria. Desde então todas tentativas de construção de um equilíbrio e consequente manutenção da estabilidade internacional passaram a ser inglórias devido a desordem emergente e promovida, estrategicamente, para limitar, quer as soberanias quer a capacidade de influência de muitos Estados.
A invasão do Iraque, a questão da Síria, Líbia, a crise na península Coreana, Sudão do Sul, Venezuela, RDC e o crescimento de focos de terrorismo, só para citar estes, demonstram as consequências de uma ordem que se transformou em desordem e fortificou alguns interesses dispersos em determinadas geografias do mundo. A desordem mundial consumiu a ordem e tem estado a propiciar a substituição da diplomacia em detrimento de um conjunto de interesses de difícil identificação e percepção. Ou seja, entre a observância da diplomacia e dos interesses estratégicos na resolução de determinados conflitos prevalece a segunda opção – que, seguramente, se revela como promotora de imensas tensões à escala global e responsável pelas consequências que se tem vindo a observar quer nas relações político-económicas quer na mobilidade migratória que se tem assistido. O caso da Líbia pode ser rebuscado e servir de base para percepção da falência a que a diplomacia se sujeitou e a nova roupagem dos interesses estratégicos da actual conjuntura internacional – onde a desordem se tornou crescentemente dominante.
Na Líbia, em 2011, tentou-se advogar a busca de um quadro diplomático favorável para se mediar a tensão criada pela primavera árabe mas os interesses estratégicos trataram de neutralizar “tudo” e silenciar a voz de todos que tentaram sugerir a observância da diplomacia na resolução da crise. Contudo, a invasão à Líbia acabou por reproduzir a força que os interesses estratégicos emergentes da desordem mundial estão a ter na criação de focos de instabilidade. O mesmo se pode falar do caso da Venezuela e de tantos outros Estados onde a diplomacia não teve suficiente fôlego para contrapor a força que a crescente desordem internacional está a ter.
Diante de tudo isso pareceme pertinente questionar : 1- Até que ponto a desordem mundial pode condicionar a estabilidade das relações internacionais? 2 Será que o actual cenário internacional caracterizado com toda essa desordem vigente nos conduzirá em direcção a uma nova ordem mundial? Do meu ponto de vista a desordem mundial que se instalou vai acentuando-se, cada vez mais, na perspectiva, sobretudo, da construção de uma nova ordem que poderá interferir amplamente nas questões de natureza soberana de cada Estado –se é que não esteja já a acontecer. Este quadro, certamente, fomentará mais conflitos e tensões nas relações internacionais uma vez que o fim do bipolarismo fez emergir novos sujeitos no cenário internacional e as influências geoestratégicas deixaram de ser monopólio de alguns Estados e passaram a ser controladas, também, por grupos dispersos e com uma limitada representatividade. Porém, estes grupos representam os actuais centros de influência político-estratégicas que estão a redireccionar o papel dos Estados com maior visibilidade na comunidade internacional e têm revelado considerável aptência em: Controlar e dominar a economia; controlar os recursos naturais geograficamente dispersos; ter controlo dos mercados; influenciar as decisões globais através de um sistemático controlo das organizações internacionais etc. Por essa razão me parece pouco provável de, pelo menos tão cedo, virmos a observar um ponto de equilíbrio na gestão da segurança internacional por conta das influências exercidas por estes grupos pois representam o ponto mais seguro da desordem mundial que tem sido alimentada pelas tensões e/ou guerras que dominam a nossa contemporaniedade. Logo, entendo que caminhamos por uma direcção que está a ser construída cujas repercussões poderão, certamente, minar a relação entre os Estados e respectivos agregados populacionais e, também, a capacidade de os Estados responderem aos múltiplos desafios que o mundo globalizado vai produzindo.
A invasão do Iraque, a questão da Síria, Líbia, a crise na península Coreana, Sudão do Sul, Venezuela, RDC e o crescimento de focos de terrorismo, só para citar estes, demonstram as consequências de uma ordem que se transformou em desordem e fortificou alguns interesses dispersos em determinadas geografias do mundo
*Politólogo