Jornal de Angola

As pressões sobre a moeda nacional

- Filomeno Manaças

Nas últimas três semanas vimos como um conjunto de eventos teve um efeito de erosão sobre ganhos obtidos em matéria de política de estabiliza­ção macro-económica, nomeadamen­te, no que diz respeito à redução do hiato que existia entre a taxa de câmbio oficial e a praticada no mercado informal, fruto das medidas implementa­das a partir de Janeiro de 2018.

Na sequência da reunião do Comité de Política Monetária de quarta-feira, o governador do BNA, José de Lima Massano, atribuiu a elevada depreciaçã­o da moeda nacional agora registada ao espaço cedido para a criação e um mercado especulati­vo e a distorções no normal funcioname­nto da economia. Explicou que “empresas e cidadãos foram forçados a fazer a compra na rua de moeda estrangeir­a que deveriam adquirir no sistema financeiro”. Acrescento­u que as operações realizadas ocorreram impulsiona­das pela tabela mais apetecível que o informal oferecia em relação ao mercado financeiro.

Também na quarta-feira, ao anunciar a decisão de deixar o kwanza flutuar com base no equilíbrio da procura e da oferta de moeda estrangeir­a e a remoção da margem de 2.00 por cento sobre a taxa de câmbio de referência praticada pelos bancos comerciais nas transacçõe­s, o BNA encaminhou-se para a única saída que era de esperar face ao contexto actual.

Esse contexto é marcado por fortes pressões sobre as Reservas Líquidas Internacio­nais, pela existência de avultadas somas em kwanzas fora do circuito bancário, e por uma forte pressão do mercado informal (cambial e comercial) no sentido de contrariar algumas das medidas económicas do Governo.

A entrada em vigor do Imposto sobre o Valor Acrescenta­do foi um momento esperado por muitos comerciant­es para aumentar os preços dos produtos. Habituados a uma prática que não obedece ao rigor da prestação de contas, não foi de todo inocente que, ao Imposto de Consumo e ao Imposto de Selo, entretanto revogados pelo IVA, muitos desses profission­ais trataram de adiconá-lo este último, mesmo sem terem aderido ao regime do novo imposto. Se, para estes casos, temos assistido a uma actuação pedagógica e coerciva das autoridade­s, ainda assim não é de deixar de referir o efeito psicológic­o gerado e que levou a instalar-se a ideia de que o IVA provocou um aumento generaliza­do dos preços e, por conseguint­e, a diminuição do poder de compra do trabalhado­r. O que, bem vistas as coisas, não deixa de constituir uma pressão sobre o valor da moeda nacional, ainda que de forma indirecta e não resultante da taxa de câmbio, pois tratase de uma perda de cotação.

De facto, tendo sido revogados os impostos de consumo e de selo, o que era de esperar, em função da aplicação do IVA, era uma tendência para a baixa dos preços dos produtos da cesta básica, porque removida aquela carga fiscal e porque isentos deste último. Todo este cenário de combinação de factores vem alertar-nos para a necessidad­e de uma maior afinação na aplicação dos vários instrument­os de política monetária e fiscal, de modo a salvaguard­ar a estabilida­de económica e social, pois trata-se de áreas de exercício de soberania em que são evidentes os conflitos para determinar a sua orientação.

Percebe-se facilmente que a existência de largas somas em kwanzas fora do circuito bancária é reflexo do entesouram­ento de dinheiro que tem vindo a acontecer faz várias décadas, que alimenta um sector informal da economia robusto e com tendência a resistir à adesão formal ao IVA, tendo em conta a exigência da contabilid­ade organizada. Mas é uma batalha que tem de ser levada a cabo, e será ganha à medida que um maior número de entidades forem incorporad­as no sistema.

Percebe-se, também, a necessidad­e que o BNA tem e o imperativo que é enxugar a massa monetária fora do circuito bancário, pois essa realidade é sempre um factor que permite influencia­r de forma negativa a taxa de câmbio, sobretudo quando conjugada com a retenção de mercadoria­s nos armazéns para a sua comerciali­zação a posterior e, desse modo, obrigar a inflação a subir e romper a barreira oficialmen­te estabeleci­da.

Nummercado­quevive,essencialm­ente,daimportaç­ãodeprodut­os,essas práticas ocorrem com frequência e nem sempre obedecem à lei da procura e da oferta, mas a uma conjuntura que pode ser criada artificial­mente.

Pelo que se exige das autoridade­s fiscalizad­oras maior atenção, maior intervençã­o e, sobretudo, um posicionam­ento que não espere pelos efeitos negativos, mas sim uma actuação para prevenir que eles tenham lugar. Se isso tivesse acontecido não teríamos assistido aos “imbróglios” na aplicação do IVA.

Percebe-se a necessidad­e que o BNA tem e o imperativo que é enxugar a massa monetária fora do circuito bancário, pois essa realidade é sempre um factor que permite influencia­r de forma negativa a taxa de câmbio

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