Indígenas não querem Jaenine Áñes
As populações indígenas responsabilizam a autoproclamada Presidente interina de ser a responsável pela violência e mortes
Milhares de indígenas continuam, desde segundafeira, a realizar marchas e vigílias nocturnas, uma estratégia de pressão para forçar a renúncia da autoproclamada Presidente interina da Bolívia, Jeanine Áñez, que, por sua vez, denunciou um plano para a matar. Os protestos mobilizam agora mais indígenas de diferentes províncias da Bolívia.
Milhares de indígenas continuam, desde segunda-feira, a realizar marchas e vigílias nocturnas, uma estratégia de pressão para forçar a renúncia da Presidente interina da Bolívia, Jeanine Áñez, que, por sua vez, denunciou um plano para a matar.
O Governo boliviano anunciou, na segunda-feira, que Jeanine Áñez cancelou uma viagem a um acto de massas no departamento (província)natal de Beni, 600 quilómetros a nordeste de La Paz, devido a ameaças de morte.
“Identificámos um grupo criminoso que queria atentar contra a Presidente. Foi difícil convencê-la de que corria risco. Querem interromper este processo de recuperação da democracia”, revelou o ministro de Governo, Arturo Murillo.
Em La Paz, milhares de indígenas participavam em marchas massivas com vigília nocturna nas imediações do Palácio Presidencial.
Os protestos mobilizam agora mais indígenas de diferentes províncias e concentram o lema do protesto na renúncia da Presidente, Jeanine Áñez, acusada de dar luz verde à violenta repressão policial.
Na segunda-feira, à medida que a marcha descia a ladeira que circunda a sede do Governo, o coro aumentava: “Áñez, assassina, queremos a tua renúncia.”
“Diziam que Evo Morales era um ditador, mas agora estamos a viver a verdadeira ditadura. A actual Presidente emitiu um decreto supremo através do qual autoriza o Exército e a Polícia a matarem os meus irmãos”, denunciava à Lusa a vendedora informal Luz Vega, de 57 anos.
No fim-de-semana foi noticiado, extra-oficialmente, um decreto que blinda as forças de segurança e a autorizar os militares a controlarem a ordem pública, eximindo-os de responsabilidades penais.
A imprensa boliviana é outro dos alvos dos manifestantes, que a acusam de apoiar o novo Governo e ocultar a repressão policial.
“Imprensa vendida”, gritavam no protesto. “A imprensa boliviana não diz a verdade sobre a quantidade de mortos e as circunstâncias dessas mortes”, acusa Luz Vega. “Por favor, expliquem a verdade ao mundo.”
Nos últimos dias, registou-se um aumento do número de mortos como consequência de violentos enfrentamentos entre manifestantes pró-Evo Morales e agentes de segurança do Exército e da Polícia.
No pior episódio de violência, nove camponeses cultivadores de coca foram mortos e 169 ficaram feridos quando tentavam entrar em Cochabamba, 400 quilómetros a sudeste de La Paz, na sexta-feira.
“Queremos a renúncia dessa suposta Presidente autoproclamada. Há muitos mortos, tanto em Cochabamba, como em La Paz. Queremos denunciar ao mundo inteiro o que a imprensa boliviana oculta. Vamos continuar com esta estratégia de pressão até ao final”, avisava Itamay Uruche, um típico “poncho vermelho” de 57 anos, da província Los Andes, a 50 quilómetros de La Paz.
Os camponeses indígenas que protestam contra o actual Governo de Jeanine Áñez e a favor do anterior de Evo Morales são conhecidos como “ponchos vermelhos” no caso dos homens e como “cholas” no caso das mulheres, com as típicas saias.
“Eu tenho saia, senhor. Eu defendo a minha raça. Esta Presidente está a matarnos. Com o nosso ex-Presidente, essas coisas não aconteciam”, compara, entre lágrimas, a “chola” Virgínia Choque, de 58 anos.
A advogada constitucionalista Ana Cisneros, de 41 anos, aproximou-se da marcha com cuidado. Ana, ao contrário de uma “chola”, é uma “choca”, isto é, uma mulher branca. Nesta Bolívia dividida em classes, em raças e em geografia, não demora até Ana receber o primeiro aviso.
“Não queremos ‘chocas’ nesta marcha”, gritava um manifestante.
“Creio que aqui houve um golpe porque a Polícia amotinou-se e o Exército pediu a renúncia a Evo Morales. Vejo que a direita está a tentar voltar e tenho medo porque não lhes importa o povo. No campo, estão a matar os meus irmãos com balas de verdade”, advertia Ana.
“Obrigado por se unir ao povo, doutora”, dizia agora outro manifestante.
Porém, o também advogado, Adrián Valencia, de 30 anos, interrompe a tónica das declarações para pedir que se conte o outro lado dessa moeda.
“Escutei tudo o que disseram, mas agora vou dizer a verdade: não houve golpe nenhum. Houve, sim, uma renúncia devido às manifestações contra a evidente fraude de Evo Morales. Todos aqui sabem da fraude, mas não tocam no assunto”, apontou Adrián.
“Apelamos à imprensa internacional porque a boliviana virou-nos as costas. Chega de gás lacrimogéneo e de balas”