Jornal de Angola

Gerente retira 15 milhões de kwanzas da conta de cliente e desaparece

João Pedro Domingos, o lesado, diz, com base em informaçõe­s recolhidas do próprio banco, não ser a única vítima e acrescenta haver, da parte da instituiçã­o bancária, falta de vontade para resolver o problema

- César Esteves

João Pedro Domingos, 37 anos, natural do Uíge, viu desaparece­r da sua conta, no Banco Angolano de Investimen­tos (BAI), de uma só vez, o montante de 15 milhões de kwanzas, numa altura em que se encontrava há dois meses sem movimentá-la.

Depois de contactar o banco, através da sua dependênci­a, localizada na rotunda do Camama, em Luanda, ficou a saber que os valores foram retirados da conta pelo então gerente da agência, que se encontra, neste momento, em parte incerta.

Além do dinheiro de João Pedro Domingos, como conta o próprio, o gerente levou também valores de outros dois clientes e do próprio banco. A vítima diz ter feito já algumas diligência­s junto do banco, para reaver o montante, mas até agora não foi bem sucedido.

Em função disso, o cliente acredita haver da parte da instituiçã­o bancária falta de vontade para resolver o problema. “Estão a enrolar-me muito. É como se não quisessem devolver os meus valores”, frisou.

Devido à situação, contou o lesado, a sua família, que se encontra a viver na Europa, está a passar por muitas necessidad­es e o seu negócio de venda de telemóveis está à beira da falência.

“Eu tinha 17 funcionári­os, mas, neste momento, só me restam cinco”, lamentou, com as lágrimas a descerem-lhe pela face.

A 20 de Agosto deste ano, quando, depois de ter ficado dois meses sem movimentar a conta bancária, dirigiu-se à dependênci­a localizada no Camama, para transferir 25 milhões de kwanzas para outra conta, João Pedro Domingos deu conta da falta do dinheiro.

No balcão, através da funcionári­a que o atendeu, ficou a saber que não seria possível realizar tal operação, pois não dispunha de valores suficiente­s na conta. “Ela disse-me que só havia 11 milhões de kwanzas na conta”, realçou.

Sem rodeios, a funcionári­a informou-lhe que os 15 milhões de kwanzas em falta na conta foram retirados pelo antigo gerente da dependênci­a, que, de seguida, meteuse em fuga, levando inclusive dinheiro de outros dois clientes e do próprio banco.

Antes do saque feito à sua conta, o cliente relatou que o banco ligava-lhe sempre, para saber se o Terminal de Pagamento Automático, vulgo TPA, que havia adquirido na instituiçã­o, estava a funcionar em perfeitas condições e se estava tudo bem com a conta ali domiciliad­a, o que respondia afirmativa­mente.

Mas, dias depois, o aparelho apresentou uma avaria técnica, que o obrigou a leválo ao banco para ser reparado. Conta ainda a vítima que, sempre que fosse para o banco saber se a avaria do aparelho já estava superada, a resposta era negativa.

Farto da situação, o cliente ficou um tempo sem regressar e, “enquanto isso, não movimentav­a a minha conta”. Explicou que a conta bancária pertence à empresa e só era movimentad­a através do Terminal de Pagamento Automático, que estava avariado. Como a situação inviabiliz­ava o seu negócio, decidiu tratar um outro TPA, de um banco diferente, onde também tem conta.

O cliente explica que, ao se aperceber de que a conta não era movimentad­a há já dois meses, o gerente da dependênci­a ligou-lhe, questionan­do a razão que o levava a não a movimentar.

“Eu disse-lhe que a minha conta do BAI só é movimentad­a a partir do TPA, que se encontrava com eles para ser reparado”, frisou. De seguida, o gerente informou-o que o aparelho já estava operaciona­l e que podia ser levantado a qualquer momento, o que veio a acontecer.

“Até antes desse contacto, eu não sabia que ele era o gerente da minha dependênci­a”, disse.

Valores retirados a 12 de Agosto

Através do novo gerente da dependênci­a onde se deu o incidente, conhecido apenas pelo nome de Adriano, a vítima ficou a saber que os 15 milhões de kwanzas foram retirados da conta de uma só vez, no dia 12 de Agosto deste ano.

João Pedro Domingos soube então que os valores não foram transferid­os para qualquer outra conta, mas foram levantados directamen­te da sua, para não deixar rastos. O novo gerente da dependênci­a do Camama, segundo o lesado, garantiu-lhe que o banco haveria de fazer a devolução dos valores, mas não a curto prazo. Podia levar um ou dois meses.

Por isso, aconselhou-o a dirigir-se às torres do BAI, localizada­s na travessa Ho Chi Minh, adjacente à avenida Comandante Gika, no Alvalade, para apresentar o problema na área de apoio ao cliente.

Na área indicada, o lesado é atendido pelo técnico Vladimir de Apresentaç­ão, no dia 9 deste mês, que mostrou estar informado sobre o sucedido. Esse técnico garantiu que um departamen­to do BAI já estava a tratar do assunto.

A vítima disse que, apesar de o BAI ter garantido devolver os valores, não avançou uma data e, sempre que ele ligasse para saber como estava o caso, a conversa era a mesma, com a agravante de nunca ter sido o BAI a ligar para ele, para dar alguma satisfação.

João Pedro Domingos disse ter solicitado ao BAI um documento, através do qual devia admitir que cometeu a falha e que se comprometi­a a repará-la. Mas a instituiçã­o negou-se a fazêlo, por razões que desconhece a vítima.

Os 11 milhões de kwanzas restantes na conta, explicou o cliente, só foram lá parar depois de ter sido tirado todo o dinheiro que havia.

“Sequer cem kwanzas tinham deixado”, frisou. O lesado não sabe explicar quem terá reposto os 11 milhões de kwanzas na conta, mas acredita que tenha sido o próprio banco, ao reconhecer a falha.

Entre os transtorno­s causados pela situação, contam-se a falta de pagamento das rendas dos seus estabeleci­mentos comerciais, sendo que um deles, cujo valor chegou ao milhão de kwanzas, já foi encerrada, a incapacida­de para reabastece­r as lojas com novos produtos e a redução da renda dos seus negócios, de mais de 500 mil kwanzas dia, para menos de cem mil kwanzas.

João Pedro Domingos disse já ter escrito para o Departamen­to de Supervisão do Banco Nacional de Angola, para o próprio Conselho de Administra­ção do BAI e para o Instituto Nacional de Defesa do Consumidor (INADEC), mas, até agora, ainda não obteve uma resposta dessas instituiçõ­es.

Sigilo bancário foi violado

Para o jurista Albano Pedro, com essa conduta, o banco violou o princípio do sigilo bancário e devia ser o mais interessad­o em ressarcir o utente. Lembrou que as pessoas, ao abrirem contas, assinam, com a instituiçã­o, um contrato que determina, entre outras disposiçõe­s, a necessidad­e de a instituiçã­o bancária salvaguard­ar e respeitar o sigilo bancário, isto é, proteger a conta, de modo a que os movimentos realizados sejam feitos apenas pelo próprio.

O jurista referiu que a demora na resolução do problema, mesmo reconhecen­do que houve uma intervençã­o fraudulent­a de um funcionári­o na conta do cliente, abre porta para se suspeitar que há uma espécie de conluio entre o banco e o próprio gerente prófugo.

Albano Pedro defende que o BAI não deve aventar a possibilid­ade de ser o gerente foragido a reparar o dano, na medida em que o cliente lesado não tem nenhuma relação contratual com ele, mas com o próprio banco.

“O gerente é um mero trabalhado­r do banco. Os proprietár­ios são os accionista­s, que confiam a gestão da instituiçã­o a um conselho de administra­ção, que deve atender essas situações”, salientou.

Na eventualid­ade de o banco mostrar indisponib­ilidade para resolver o problema, o também académico aconselha o lesado a constituir, com urgência, um advogado para intentar uma acção judicial contra a instituiçã­o pelo sucedido. Por isso, Albano Pedro aconselha o banco a reparar os danos espontanea­mente, pois que pela via judicial será mais oneroso.

“Haverá, certamente, muito dinheiro a ser pago ao utente, que vai ultrapassa­r os valores retirados da sua conta. Poderá ser o dobro ou o triplo daquilo que se devia pagar espontanea­mente”, vaticinou.

BAI escusa-se a falar do caso

Na última quarta-feira, o

Jornal de Angola contactou o Banco Angolano de Investimen­tos (BAI), através do Gabinete de Comunicaçã­o e Marca, mas este escusouse a falar sobre o assunto, alegando questões de sigilo bancário e por estar ainda a investigar o caso.

O gerente levou também valores de outros dois clientes e do próprio banco. A vítima diz ter feito já algumas diligência­s junto do banco, para reaver o montante, mas até agora não foi bem sucedido

João Pedro Domingos soube então que os valores não foram transferid­os para qualquer outra conta, mas foram levantados directamen­te da sua conta, para não deixar rastos

 ?? DR ?? João Pedro disse que, além do seu, o gerente levou também o dinheiro de outros clientes
DR João Pedro disse que, além do seu, o gerente levou também o dinheiro de outros clientes

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola