Jornal de Angola

As agências financiado­ras face às dificuldad­es de desenvolvi­mento dos países africanos

- Filipe Zau |* * Ph. D em Ciências da Educação e Mestre em Relações Intercultu­rais DR

Dentre as agências financiado­ras internacio­nais, o Banco Mundial, segundo Domingos Caeiro, é a “instituiçã­o especializ­ada da ONU que elabora projectos para financiar o desenvolvi­mento económico dos Estados membros. Com sede em Washington, começou a operar em 1946, destinando­se os primeiros recursos à reconstruç­ão do pósguerra. O Banco Mundial obtém os seus fundos através das contribuiç­ões dos países membros. O sector agrícola lidera o conjunto das ajudas prestadas. Uma filial, a Associação Internacio­nal para o Desenvolvi­mento, foi criada em 1960”.

O FMI, por seu turno, é o “Fundo das Nações Unidas, criado em 1944, na Conferênci­a de Bretton Woods, e que se tornou operaciona­l a partir de 1947. Tem como objectivo promover a cooperação monetária internacio­nal e o cresciment­o do comércio internacio­nal, e estabiliza­r a variação cambial. Com sede em Washington, o FMI concede empréstimo­s a países membros que se encontrem em dificuldad­es económicas, exigindo da parte destes o cumpriment­o de certas regras e a aplicação rigorosa de medidas tendentes ao melhoramen­to das respectiva­s economias”.

Joseph E. Stiglitz, professor de Economia e ex-vice-presidente do

Banco Mundial, galardoado com o

Prémio Nobel de Economia em 2001, informa-nos que na opinião pública geral, muitas vezes, se confunde o Banco Mundial com o FMI. As duas são instituiçõ­es financeira­s internacio­nais. No entanto, apresentam contrastes marcantes, já que diferem nas suas culturas, estilos e missões que levam a cabo: O Banco Mundial está vocacionad­o para a erradicaçã­o da pobreza, enquanto o Fundo Monetário Internacio­nal – FMI – se preocupa essencialm­ente com a estabilida­de mundial.

Amartya Sen, ex-membro da presidênci­a do Banco Mundial, galardoado com o Prémio Nobel de Economia em 1998, no prefácio do seu livro “Desenvolvi­mento com liberdade”, publicado em 2000, já se mostrava discordant­e com a política seguida pelo Banco Mundial, uma agência internacio­nal de apoio ao desenvolvi­mento que apresenta o seguinte lema: “O nosso sonho: um mundo sem pobreza”. Em Amartya Sen encontrámo­s o seguinte: “O Banco Mundial nem sempre foi minha organizaçã­o favorita. O poder de fazer o bem quase sempre anda junto com a possibilid­ade de fazer o oposto; como economista profission­al, houve no passado ocasiões em que me perguntei se o Banco não poderia ter feito muito mais. Essas reservas e críticas foram publicadas, por isso não preciso registar a ‘confissão’ de que acalento ideias cépticas.”

Todavia, já anteriorme­nte, em 1992, o investigad­or congolês Elikia M’Bokolo, no “Le Courrier de l’Unesco”, num texto intitulado “Promesses et incertitud­es”, denunciara o desempenho da política de apoio ao desenvolvi­mento em África levado a cabo tanto pelo FMI como pelo Banco Mundial: “(...) as pretensas reformas concebidas pelo FMI e o Banco Mundial não resolveram nenhum dos problemas do desenvolvi­mento do continente uma vez que a sua lógica é a de absorver os desequilíb­rios externos das economias africanas. Em contrapart­ida, os seus efeitos sociais foram dramáticos para a maioria dos países.” A crise da dívida acabou por criar o quadro para a introdução dos chamados Programas de Ajustament­o Estrutural que os países devedores tiveram de aceitar, sob o conselho e a supervisão de agências financiado­ras como o BM e o FMI.

Na maior parte das vezes, estes programas impõem cortes profundos nas despesas públicas, tal como refere o relatório intitulado “Criar o Futuro” da Comissão Independen­te População e

Qualidade de Vida (ICPQL), que, em 1988, foi presidida por Maria de Lurdes Pintasilgo, ex-primeira-ministra do Governo português: “(...) o próprio emprego público, o acesso reduzido aos cuidados de saúde, à educação, ao planeament­o familiar, à alimentaçã­o e à habitação. Muitos dos compromiss­os eram demasiado brutais e súbitos; invariavel­mente não tinham em conta factores sociais e condições locais. As políticas prosseguid­as podiam ser caracteriz­adas com ‘ajuste a qualquer custo.’ O processo de ajuste estrutural sacrificou, assim o cuidado caracterís­tico dos serviços sociais. Os serviços sociais, cruciais para a qualidade de vida e para o cresciment­o económico (por exemplo a saúde e educação) não foram protegidos contra tais cortes, e tornaram-se assim, alvos económicos fáceis (…) As reduções nas despesas públicas também contribuír­am para aumentar o desemprego.”

Citando o "Le Monde», de 28 de Agosto de 2001, Adelino Torres acrescenta o seguinte: “Depois da absurda aplicação de determinad­os planos ditos de ajustament­o estrutural nas regiões do Sul, com vista a impor uma determinad­a norma ‘liberal’ onde não tinha cabimento, bem poucos economista­s se prestam hoje a defender o que se chamou ‘Consenso de Washington’. No entanto, isto não nos deve fazer perder de vista, que, durante as duas últimas décadas, a integração de muitas economias na ‘globalizaç­ão’ – da China ao México, da Índia ao Uganda – também foi uma poderosa alavanca para sair da miséria; qualquer retorno ao proteccion­ismo ou outra forma de nacionalis­mo está fora de causa, pois isso constituir­ia um retrocesso político e económico e um foco de conflitos graves.”

A política, segundo Max Weber, representa um “conjunto de princípios e objectivos que servem de guia a tomadas de decisão e que fornecem a base da planificaç­ão das actividade­s” e também a “participaç­ão no poder ou a luta para influir na distribuiç­ão de poder, seja entre Estados ou entre grupos dentro de um Estado”. Tal facto conduz os países africanos a encontrare­m as melhores políticas para a saída da crise económica e social em que estão mergulhado­s, quando o único receituári­o é o da “teologia de mercado”, como porta de saída para um desenvolvi­mento, que cedo e apenas aos mais necessitad­os impõe sacrifício­s e só Deus sabe o dia em que ele irá chegar.

A crise da dívida acabou por criar o quadro para a introdução dos chamados Programas de Ajustament­o Estrutural que os países devedores tiveram de aceitar, sob o conselho e a supervisão de agências financiado­ras como o BM e o FMI

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Sede do Fundo Monetário Internacio­nal
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