Denunciados no Rwanda maus-tratos a crianças
As autoridades do Rwanda visadas num relatório internacional são acusadas de alegados maus-tratos a crianças que se encontram internadas num centro de acolhimento em Kigali
A Organização não-Governamental Human Rights Watch (HRW) pediu, segunda-feira, “o encerramento imediato” de um centro de trânsito, no Rwanda, após denúncias de detenções arbitrárias e tratamento abusivo das autoridades sobre crianças retiradas das ruas.
“As autoridades do Rwanda alegam que estão a reabilitar as crianças de rua, mas estão a detê-las em condições desumanas e degradantes, sem julgamento e sujeitas a agressões físicas e abusos”, adiantou o director da HRW para a África Central, Lewis Mudge, citado pela BBC.
O alerta da organização de defesa dos direitos humanos surge no dia em que decorre, em Genebra, a revisão periódica do Ruanda pelo Comité das Nações Unidas para os Direitos das Crianças.
A HRW apela, por isso, ao Comité das Nações Unidas para que exija “o encerramento imediato do Centro de Trânsito de Gikondo”, em Kigali, capital do Rwanda, onde, sustenta a organização, “se mantêm crianças abusadas e detidas arbitrariamente” por períodos de até seis meses.
Na base do alerta está o relatório “Enquanto vivermos da rua, vão bater-nos: Detenção abusiva de Crianças no Ruanda”, elaborado pela HRW, que entrevistou 30 menores, entre os 11 e 17 anos e que passaram pelo centro de Janeiro a Outubro de 2019.
A HRW considera que, desde 2017, o novo enquadramento legal e a estratégia do Governo para erradicar a delinquência “têm procurado legitimar e regular a detenção nos chamados centros de trânsito”.
“Esta nova legislação oferece cobertura à continuação da detenção arbitrária e das violações contra os detidos, incluindo crianças”, acrescenta.
De acordo com a nova legislação, as pessoas com comportamentos considerados desviantes pelas autoridades do Rwanda, tais como prostituição, uso de drogas, mendicidade ou venda informal, podem ser mantidas em centros de trânsito até dois meses, sem qualquer justificação legal.
Relatos das vítimas
Foram recolhidos relatos de crianças agredidas pela Polícia, quando foram detidas e que não tiveram conhecimento da acusação, acesso a um advogado ou direito a visitas de familiares.
Vinte e oito das trinta crianças disseram ter sido fisicamente agredidas, em Gikondo, onde foram mantidas em celas sobrelotadas, por vezes juntamente com adultos.
As crianças são forçadas a partilhar colchões e cobertores infectados com piolhos, podem lavar-se apenas uma ou duas vezes por semana, têm acesso limitado à casa de banho e falta de cuidados médicos. As autoridades do Rwanda, que ratificaram a Convenção dos Direitos das Crianças, em 1991, disseram, num relatório para o comité da Organização das Nações Unidas (ONU), que “as crianças de rua não são tratadas como criminosos, antes são colocadas em centros de trânsito onde permanecem durante um curto período antes de lhe serem aplicadas medidas correccionais”.
A prática, contrapõe a HRW, não existe processo judicial para determinar a legalidade das detenções, nem o tempo passado no centro ou a forma como as crianças são libertadas ou transferidas.A libertação das crianças do centro aparenta ser também arbitrária, com algumas a dizerem ter sido transferidas para outros centros e outras que foram simplesmente libertadas com o aviso de que serão novamente detidas se regressarem às ruas. “O tratamento das crianças em Gikondo viola a Carta Africana e a Convenção dos Direitos das Crianças”, considera a HRW, defendendo o encerramento do centro.
“O Governo do Rwanda tem de fechar Gikondo e acabar com as práticas arbitrárias de detenção. Devem deixar de usar os chamados centros de reabilitação e trânsito para livrar a capital das crianças de rua e substituir esse sistema abusivo por assistência e apoio”, defende a Human Rights Watch.