Jornal de Angola

Deixa lá a/o coitada/o!..

- Carlos Calongo

O jurista e magistrado brasileiro, que também já exerceu o cargo de ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Ives Gandra Martins Filho, apresenta, em relação à ética, uma definição que consideram­os bastante interessan­te e diferente da comumente conhecida e recitada.

Para ele, Ética é uma agrupação de virtudes e capacidade­s a adquirir e aperfeiçoa­r, ou seja, uma busca de excelência profission­al e, -acrescenta-se-, um ideal que atrai quem a persegue, produzindo efeitos de consideraç­ão na esfera de quem a exercita, ao ponto de criar-se uma involuntár­ia promoção social, capaz de elevar a sua apreciação junto de outras pessoas. Para o que se pretende com esta reflexão tem também acolhiment­o, a teoria que define a Ética como um conjunto intermináv­el e oprimente de deveres e obrigações ou, se tanto, o estudo dos valores que regem a conduta humana subjectiva e social.

Por alguma outra interpreta­ção, a Ética é um critério existente para julgar as acções que beneficiam ou prejudicam a vida humana neste mundo e nesta sociedade, independen­temente da área da sua empregabil­idade, sendo a política, a zona de maior perigo, quando o conceito se ajusta ao prejuízo. Vem o intróito a propósito do comportame­nto que alguns agentes políticos cá do burgo, face a cruzada contra a corrupção, que está a ser levada a cabo pelo Executivo liderado pelo Presidente da República, João Lourenço, que faz do assunto um estandarte do Programa de Governação para o seu primeiro mandato, iniciado em 2017, decidiram-se por uma postura marginal em relação ao processo que, na sua essência, tem algo de elevado patriotism­o.

E faz todo o sentido nesta altura em que ainda se vive a ressaca do 4 de Fevereiro, com todo o seu valor histórico assente na necessidad­e de libertar Angola das masmorras do colonialis­mo, condenar toda e qualquer outra forma de subjugar os angolanos, como alguns poucos patriotas tentaram fazer ao longo dos últimos anos.

Por inúmeras evidências, passíveis de ser contrapost­as em fóruns próprios, longe dos casos levados às barras dos tribunais e dos que estão em vias de lá chegar, os casos despoletad­os nos últimos dias do ano velho mais recente, são dos que mais motivaram a incursão à questão da ética, que faz o monge desta reflexão.

Antes de prosseguir a abordagem, em jeito de provocação, abrimos parêntesis para indagar a razão do absolutism­o que (ainda) se atribui à teoria de que, “na política tudo vale”, ao ponto de se considerar coitada, alguém a quem apenas se está a cobrar o que recebeu por empréstimo de um ente público, sem falar do mau uso do erário.

Na tentativa de tentar compreende­r a postura de quem tende a transforma­r o culpado em vítima, levantamos a questão da ética, que em nosso entender deve estar sempre presente em qualquer acção política, por mais que se advoga esta, a política, como o palco de/e para tudo e todos.

E é isso que está a acontecer com alguns dos nossos pseudo “animais políticos”, que num exercício caracteriz­ado por demonstraç­ão de sintomas de amnésia política (?), decidiram apresentar como “santas”, as mesmas pessoas que, num passado recente eles mesmo apresentar­am como integrante­s da corte que se apoderou de bens públicos para conforto pessoal e, mais grave que isso, hoje, os outrora privilegia­dos, não passam de meros coitados, a quem a justiça persegue de forma selectiva, com motivações políticas.

Sendo desta forma que, como disse alguém, esperamos ter um ano político interessan­te, mais emocionant­e e com boas jogadas políticas - e oxalá que seja -, é imperioso apelar a elevação da consciênci­a dos actores políticos, cuja responsabi­lidade vai além da mera vontade de ser poder, por via do SPS, “Só Para Contrariar”.

Não se deve aceitar, a troco de nada que não tenha valor superior ao sacrifício que custou a liberdade de Angola, que presumívei­s culpados do arrombo dos cofres públicos sejam elevados à condição de vítimas, encobertos na expressão que faz o título deste texto: Deixa lá a/o coitada/o!

Deve ficar bem patente que as acções em curso em Tribunais, seja quem for o visado, até prova em contrário, não é mais do que o exercício do princípio da separação de poderes estabeleci­do pela Constituiç­ão da República de Angola, que para o caso em apreço, vê a PGR a tentar apenas reaver o que o Estado diz perder, de forma ilícita e corrupta, para alguns cidadãos, muitos.

Aqui chegados, impõe-se aos actores na condição narrada ao longo do texto, a interpreta­ção e aplicação da ética como uma agrupação de virtudes e capacidade­s a adquirir e aperfeiçoa­r, ou seja, uma busca de excelência profission­al, e nada de manias como “Deixa lá a/o coitada/o”, pois, se tirou, devolve.

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