As experiências feitas pelo mundo na tentativa de o livrar da Covid-19
Na Alemanha, um hospital já iniciou transfusões de sangue de recuperados para doentes activos. No Japão, começa agora a produção de um medicamento que os cientistas garantem ser eficaz contra a Covid-19. Em vários países testam-se diferentes terapias no c
É uma corrida contra o tempo. Com a chegada da vacina ainda longe no horizonte, várias equipas de investigadores espalhados pelo mundo estudam terapias alternativas capazes de auxiliar o combate à pandemia da Covid-19. Todas elas são baseadas em medicamentos ou tratamentos já existentes, que comprovaram ser eficazes para determinadas doenças e que os especialistas procuram que surta efeito contra o novo coronavírus. Eis algumas em discussão.
Com sangue
E se o segredo estiver nos doentes recuperados? A pergunta deu origem ao trabalho de vários países em busca de uma terapêutica com base na transfusão de sangue. Uma vez recuperado do Covid-19, o plasma do doente poderia transmitir os anticorpos necessários para ajudar à recuperação de outros utentes. A terapêutica ainda está só na fase experimental, mas, na opinião da presidente do Instituto Português do Sangue e Transplantação (IPST), “permitirá a um dador recuperado salvar um doente infectado”. O que “encerra em si uma solidariedade muito interessante”, disse Maria Antónia Escoval, em entrevista ao Diário de Notícias.
Portugal já estuda o uso do sangue como forma de salvar os seus doentes. O IPST diz já ter sido “criado um grupo de trabalho, ainda restrito, mas para este efeito, que tem como missão elaborar protocolos e harmonizar procedimentos para depois serem discutidos com a Direção-Geral da Saúde (DGS) e o Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge (INSA), que estão ao corrente do que estamos a fazer”. Passada esta fase, a equipa procede “à fase de discussão com os hospitais que têm as maiores colheitas e que, no fundo, são mais representativos em termos de transfusão”.
Países como a China, Itália e Espanha já estão a recorrer a esta terapêutica em algumas das suas regiões. Ainda este fim de semana, o Hospital Universitário Erlangen, no sul da Alemanha, recebeu autorização das autoridades de saúde para avançar com a transfusão de sangue no combate ao surto. Há uma semana, o hospital apelou aos recuperados que fossem doar sangue e mais de 200 pessoas apresentaram-se para a doação. De acordo com a agência Lusa, o professor alemão Holger Hackstein explicou que “a doação de plasma dura 45 minutos e não é mais do que uma doação normal de sangue”.
“Não estamos a ficar para trás”, garante Maria Antónia Escoval. “Estamos a preparar-nos para a podermos usar como mais uma das opções disponíveis no tratamento a esta epidemia”, embora ainda não seja possível “avançar com uma data precisa para o seu início” nos hospitais portugueses. Além disso, explica a presidente do IPST, a colheita de cada utente “só poderá ser feita a partir de um período de 28 dias após o doente ter registado dois testes negativos” e terá de obedecer a critérios rigorosos de seleção de doentes dadores.
Esta não é a primeira vez que a experiência é recurso de combate a uma epidemia. Aconteceu também com a SARS, em 2002, a MERS, em 2012, mostrando bons resultados.
Antiparasitário
Uma equipa de investigadores australianos anunciou a descoberta de um medicamento capaz de eliminar o vírus em apenas dois dias. Chama-se ivermectina e trata-se de um antiparasitário, utilizado para a eliminação de piolhos. E é até produzido em Portugal, pela farmacêutica Hovione. Uma única dose bastará, garantem os especialistas.
“Descobrimos que mesmo uma dose única poderia eliminar todo o RNA viral dentro de 48 horas e, além disso, às 24 horas há uma redução realmente significativa”, explicam.
O estudo, publicado na revista científica Antiviral, foi liderado pelo Biomedicine Discovery Institute (BDI), da Monash University, em Melbourne (Austrália), e o Peter Doherty Institute of Infection and Immunity (Doherty Institute).
Considerada “uma droga segura”, já foi aprovada por diversas agências de medicamentos a nível internacional. Mas nunca foi testada em humanos, embora se tenha mostrado eficaz in vitro contra vírus como o HIV, dengue, influenza e zika. Falta “determinar agora se a dose que pode ser usada em humanos será eficaz”.
Uma intenção reforçada pelo director da farmacêutica portuguesa responsável pela produção deste medicamento, a Hevione. Em declarações à Rádio Renascença, Marco Gil diz que “neste momento, têm de ser feitos estudos de fase três - já em pacientes e terá de ser descoberta a dose terapêutica, para apurar se, de facto, essa dose está dentro dos limites de toxicidade com que pode ser usado este produto”. O director estima que demore entre seis a nove meses para chegar a este resultado.
Novo fármaco
Para se combater um vírus, é preciso decifrá-lo, saber como nasceu e como sobrevive. Foi este trabalho que esteve na base de uma descoberta de investigadores de vários países sobre um fármaco que garante bloquear os efeitos da doença da Covid-19, enquanto administrado na fase inicial de infecção.
Chegam do Instituto de Bioengenharia da Catalunha, em Espanha, do Instituto Karolinska, na Suécia, do Instituto de Biotecnologia Molecular da Academia de Ciências da Áustria e do Instituto de Ciências da Vida da Universidade de British Columbia, no Canadá. E dizem ter conseguido decifrar de que forma é que o SARSCov-2 interage e infecta as células humanas do rim. Conhecimento necessário para poderem avaliar o potencial deste medicamento, que se encontra em fase clínica de testes, num laboratório de Barcelona.
Estudos recentes demonstraram que, para infectar uma célula, os coronavírus utilizam uma proteína, denominada S, que se une a um receptor das células humanas denominado ACE2. Ora, tendo em conta que essa união é a porta de entrada do vírus no organismo, evitála pode ser uma possível terapêutica.
“Estas descobertas são prometedoras para um tratamento capaz de deter a infecção num estádio inicial deste novo coronavírus”, comentou Núria Montserrat, investigadora espanhola, em declarações à agência espanhola Efe.