Os Papas que “cambiaram” o cadeirão máximo do Vaticano
São passados sete anos desde que Bento XVI decidiu renunciar ao Papado. A intenção foi manifestada no dia 11 de Fevereiro de 2013, na Sala del Concistoro do Palácio Apóstólico, numa reunião, de manhã, que coincidiu com o Dia Mundial do Doente
O encontro
seria para anunciar a data da canonização de três mártires católicos: António Primaldo e companheiros, Laura Montoya Upegui e Maria Guadalupe Garcia Zavala, mas Bento XVI aproveitou o ensejo para informar aos presentes que iria renunciar ao Papado.
A decisão veio a efectivarse, a seu pedido, apenas no dia 28 de Fevereiro do mesmo ano. Bento XVI apontou falta de força, devido à idade, para desempenhar as funções, como a causa principal que o levou a tomar a decisão.
“Depois de ter examinado repetidamente a minha consciência diante de Deus, cheguei à certeza de que as minhas forças, devido à idade avançada, já não são idóneas para exercer adequadamente o ministério petrino”, consta da sua declaração de renúncia.
A notícia da renúncia de Bento XVI, eleito Papa num dia como hoje (19 de Abril de 2005), apanhou milhares de fiéis católicos desprevenidos.
Embora o Sumo Pontífice tenha apontado falta de força, devido à idade, para renunciar ao cargo, para muitos, sobretudo estudiosos em assuntos religiosos, a razão oficial continua um verdadeiro mistério.
Num documentário intitulado “O Papa do fim do mundo”, referindo-se ao actual Papa, emitido pelo canal “História”, especialistas em questões religiosas apresentam outras versões que entendem estar na base da renúncia de Bento XVI.
Para os académicos, Bento XVI evitou viver uma velhice de muito sofrimento, como aconteceu com João Paulo II.
Por outro lado, acrescentam, a decisão para renúncia terá resultado, também, das crises que se haviam multiplicado dentro da Igreja, como a crise com o mundo Islâmico, Hebreu, da Ciência e até o vazamento de documentos, muitos dos quais mostrando uma Cúria dividida, corrupção e falta de transparência dentro do Banco do Vaticano.
Segundo relatos históricos, a igreja não registava, desde Gregório XII, isto é, em 1415, um Papa que renunciasse.
Chegada ao poder
A chegada de Bento XVI ao cadeirão máximo do Vaticano resultou de um gesto praticado pelo actual Papa Francisco, seu concorrente directo no conclave que o elegeu Sumo Pontífice.
Com a notícia da morte de João Paulo II, no dia 2 de Abril de 2005, os católicos acabavam de ficar sem o seu líder espiritual. Com isso, um novo Papa teria de ser eleito. Em 18 de Abril de 2005, o conclave para eleger o novo Papa é convocado e 115 cardeais de todo o mundo são trancados dentro da Capela Sistina, situada dentro do Vaticano e famosa pela sua arquitectura inspirada no Templo de Salomão do Antigo Testamento.
Ela é igualmente conhecida mundialmente por causa do extenso afresco de Michel Angelo no seu tecto.O trabalho foi feito a pedido do Papa Júlio II e é considerado não só um marco da pintura da Alta Renascença, mas também uma das mais famosas obras da história da arte. É considerado um dos maiores tesouros da Santa Sé.
De acordo com o documentário do canal “História”, dois nomes soavam mais altos, nessa altura, entre os favoritos à sucessão de João Paulo II. Por um lado, estava o cardeal Joseph Aloisius Ratzinger, que viria a adoptar o nome de Bento XVI, e, por outro, estava o cardeal Carlos Maria Martini, considerado um dos mais progressistas da história da Igreja. Este último não podia ser Papa, porque sofria da doença de Parkinson, uma doença degenerativa crónica do sistema nervoso central, que afecta principalmente a coordenação motora.
Os sintomas manifestamse de forma lenta e gradual ao longo do tempo. Na fase inicial da doença, os sintomas mais óbvio são tremores, rigidez, lentidão de movimento e dificuldade em caminhar.
Com a eliminação automática de Martini, consta do documentário, o olhar de um sector de cardeais centralizou-se sobre o cardeal argentino Jorge Mário Bergólio, o actual Papa Francisco. As votações acontecem. Bergólio consegue 40 votos. Ratzinger lidera a votação, mas não consegue obter os 2/3 ou 2/3+1, para se sagrar Papa.
“Depois de ter examinado repetidamente a minha consciência diante de Deus, cheguei à certeza de que as minhas forças, devido à idade avançada, já não são idóneas para exercer adequadamente o ministério petrino”
Era necessária uma nova votação. É aqui que começa a “permuta” entre os papas. O documentário salienta que Bergólio decide renunciar e pede aos cardeais que votaram nele a passarem os votos para Ratzinger. Com este gesto de Bergólio, Ratzinger obtém os votos necessários e sagra-se Papa.
O documentário, que narra o percurso de Francisco até chegar a Papa, conta que ele decidiu ficar pelo caminho, porque sabia que jamais alcançaria a maioria dos votos. A sombra da ditadura na Argentina pairava sobre ele como um passado funesto. Uma contemporânea de Bergólio, que fala neste documentário, afirmou que ele era um candidato elegível, mas a interferência de um dossier que dizia ter colaborado com a ditadura militar atrapalhou tudo.
Antes da realização do conclave, circularam, entre vários cardeais eleitores, documentos que comprometiam Bergólio, no caso de sacerdotes jesuítas sequestrados e torturados durante a ditadura na Argentina. Estes documentos diziam que ele os tinha entregado.
Entretanto, consta do documentário que cinco anos depois, isto é, em 2010, o actual Papa é chamado para declarar como testemunha na causa dos sacerdotes.
Com a reabertura dos arquivos, novas testemunhas são convocadas no caso e contam novas histórias sobre ele e suas acções durante os anos escuros na Argentina. Essas histórias, longe de o condenar, mostraram um pastor que, em muitas ocasiões, ajudou pessoas perseguidas a fugir do país para o exílio.
Com a imagem renovada, Bergólio tem a estrada livre para voltar a concorrer ao cadeirão máximo do Vaticano. A oportunidade não tarda a chegar. Em meio às crises no Vaticano, Bento XVI decide renunciar ao papado. Bergólio concorre ao novo conclave e é eleito Papa. Fez história ao ser o primeiro jesuíta a chegar ao cargo e escolheu Francisco como o seu novo nome.
Como pode notar, caro leitor, há aqui uma grande coincidência. Bento XVI chega ao poder por intermédio de um gesto de Francisco e este último, por sua vez, chega igualmente às funções de Papa, porque Bento XVI renunciou ao Papado. É curioso, não acha?