Jornal de Angola

Lojas fechadas e peças vendidas às escondidas

- Augusto Cuteta

Basta o automobili­sta circular pela recém-reaberta rua Dr. Agostinho Neto, que liga a Avenida Pedro de Castro Van-Dúnen “Loy” ao Largo Avô Kumbi, para um grupo de jovens, quais sentinelas, à berma da estrada, correr atrás do veículo a anunciar que tem à sua disposição todo o tipo de acessórios.

Os jovens gritam para dentro do veículo, ainda que os pára-brisas laterais estejam fechados. Além desse chamariz para atrair o suposto cliente, o automobili­sta é “perseguido” até deixar claro que não vai às compras, ainda que seja só com um abanar da cabeça, em gesto de negação.

A partir daí, os intermediá­rios, conhecidos por “matocheiro­s”, aglomerado­s em grupos de pessoas que se identifica­m como vendedores de peças, mecânicos, electricis­tas auto, balatadore­s, entre outros profission­ais, reduzem a correria atrás do veículo e desistem, deixando o automobili­sta seguir viagem, em paz!

Mas, essa paz é efémera. Uns metros mais adiante, outro grupo aparece e “canta a mesma música” de ter peças e todo tipo de acessório para a marca e modelo da viatura em que segue o circulante. E, é assim, ao longo de todo o percurso, até chegar-se àquele que já foi considerad­o o maior mercado de peças automóveis a céu aberto.

Já na rua direita do Mercado dos Correios, nas imediações do Hospital Materno Infantil do Golfe, o número de jovens é ainda maior. Se os expatriado­s, verdadeiro­s donos do negócio, se mostram à distância, os nacionais entram em cena, indicam os becos e ruelas onde devem os compradore­s esperar, enquanto eles, os “matocheiro­s”, buscam pelas peças.

Nesse momento, o cliente espera pelos acessórios que solicitou ao vendedor, que correu à alta velocidade para uma das ruelas do bairro Golfe, em mais ou menos 30 minutos.

Ao longo de toda a extensão da rua principal do mercado, até as imediações da ponte do Balumuka, a presença, em massa, de efectivos da Polícia Nacional e das Forças Armadas é notória. Apesar disso, o negócio das peças acontece pelo interior do bairro, com inúmeros visitantes a cada hora que marca o relógio.

“Os clientes mais regulares possuem até os números de telefone dos proprietár­ios das lojas ou dos miúdos matocheiro­s, para facilitar as coisas”, disse um mecânico que espera pelas peças de um Toyota Hiace em concertaçã­o na oficina montada em casa, no Capolo 1.

Apesar da grande presença das Forças da Ordem, o negócio continua, como realça o senhor. “Dependemos disso. Parar é complicado para as nossas famílias”, rebateu um outro, que faz trabalhos de electricid­ade auto, na mesma oficina do primeiro.

Oficialmen­te, as lojas do Mercado dos Correios estão encerradas, devido ao Estado de Emergência. Quem passa por aquelas bandas vê portas trancadas, algumas com fortes correntes e cadeados, inclusive, e sem funcionári­o algum. Com um ou outro carro em circulação, a rua principal fica mesmo às moscas.

A agitação é no interior do bairro, nas ruas ou travessas adjacentes às lojas, que eram residência­s vendidas ou arrendadas a comerciant­es. A transforma­ção dessas antigas casas em espaços comerciais ganhou ainda mais corpo com o encerramen­to do antigo mercado de peças, há uns dois anos.

Moradores da zona acreditam que, enquanto durar o Estado de Emergência, as centenas de lojas ficam fechadas, mas “nós e quem passar por perto daqui sabe que, às escondidas, as vendas prosseguem”, numa altura em que a presença das forças militares e policiais parece não intimidar as manobras dos comerciant­es e de matocheiro­s.

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VIGAS DA PURIFICAÇíO | EDIÇÕES NOVEMBRO Intermediá­rios interpelam possíveis compradore­s na via pública

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