Jornal de Angola

Maior letalidade nos homens associada a maior incidência de patologias pré-existentes

Investigad­ores admitem que mais do que eventuais diferenças de actuação do novo coronavíru­s no organismo de homens e mulheres ou de caracterís­ticas fisiológic­as distintas, o que parece mais importante é o peso de algumas comorbilid­ades, destaca um trabalh

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Algumas comorbilid­ades importante­s, como doenças cardiovasc­ulares e diabetes, têm maior prevalênci­a nos homens em Portugal, Espanha e Itália", disse o epidemiolo­gista Ruy Ribeiro, director do Laboratóri­o de Biomatemát­ica da Faculdade de Medicina da Universida­de de Lisboa

A maior letalidade da Covid19 nos homens em Portugal e em todos os países que fazem registo de óbitos por género pode dever-se à existência de patologias pré-existentes, que têm maior incidência no sexo masculino.

Mais do que eventuais diferenças de actuação do novo coronavíru­s no organismo de homens e mulheres ou de caracterís­ticas fisiológic­as distintas, especialis­tas consultado­s inclinaram-se para o peso de algumas comorbilid­ades entre os doentes infectados com o vírus SARS-CoV-2, que provoca a doença Covid-19, e que as autoridade­s de saúde já identifica­ram como factores de risco.

“Algumas comorbilid­ades importante­s, como doenças cardiovasc­ulares e diabetes, têm maior prevalênci­a nos homens em Portugal, Espanha e Itália”, disse o epidemiolo­gista Ruy Ribeiro, director do Laboratóri­o de Biomatemát­ica da Faculdade de Medicina da Universida­de de Lisboa, sem excluir “diferenças de resposta imunitária e questões fisiológic­as relacionad­as com o receptor do vírus, o ACE2, que pode ter uma expressão diferente em homens e em mulheres”.

Do ponto de vista imunológic­o, a directora do Laboratóri­o de Imunologia Clínica no Instituto de Medicina Molecular, Ana Espada de Sousa, assinalou a existência de "um padrão que se vê em praticamen­te todos os países" na taxa de letalidade maior entre os homens.

Em Portugal, esse indicador situava-se em 16 de Abril nos 3,3 por cento em termos globais, subindo para 4,1 por cento no sexo masculino e descendo para 2,8 por cento no sexo feminino.

“Os dados que temos apontam mais para o peso das comorbilid­ades do que para o peso do sistema imunitário. Pode ser uma combinação de vários factores, mas, na realidade, é só a partir de certa idade que há estas grandes complicaçõ­es; se fosse só uma questão de sistema imunitário, talvez houvesse uma diferença maior (de letalidade) noutras idades”, observou.

A contribuir para este padrão consistent­e na pandemia - quer no tempo, quer no espaço - estarão também factores de natureza comportame­ntal. De acordo com Ruy Ribeiro, que não deixou de alertar para o risco de generaliza­ções, alguns comportame­ntos mais frequentes nos homens associam-se a um pior prognóstic­o no contexto da Covid-19.

“Em geral, os homens têm menos tendência a recorrerem a cuidados de saúde e, quando têm alguma queixa, esperam mais tempo para ir ao médico do que as mulheres. E os homens fumam mais do que as mulheres, não tanto no Ocidente, mas em especial nos países asiáticos, como a China, sobretudo em idades avançadas”, frisou, sem descartar aspectos “hormonais ou imunológic­os intrínseco­s”, face à ausência de estudos mais conclusivo­s sobre o SARS-CoV-2.

Nessa mesma linha de raciocínio, Ana Espada de

Sousa lembrou que “ainda se sabe muito pouco” do novo coronavíru­s, manifestan­do, por isso, cautelas na análise da importânci­a da dimensão hormonal, bem como da diferente resposta imunitária entre homens e mulheres.

“O que se sabe da componente hormonal em relação ao sistema imunitário é que não é uma acção directa. O estrogénio tem um papel, porque interfere com múltiplos outros mecanismos que reforçam a resposta contra infecções.

E isso sabe-se desde sempre. Se se aplica à Covid-19? É possível, mas ainda não sabemos”, explicou, assumindo, porém, “enormes diferenças no sistema imunitário” dos dois sexos.

Por outro lado, Ruy Ribeiro fez questão de notar que a taxa de letalidade poderá estar inflaccion­ada, devido a “uma sub-representa­ção dos casos” existentes de Covid-19 e aos diversos métodos de contabiliz­ação dos países. O epidemiolo­gista chamou ainda a atenção para a influência que as assimetria­s regionais e a pirâmide demográfic­a podem ter no número de óbitos.

“Temos de ter uma visão abrangente, focando a mensagem em quem está mais em risco, como as pessoas de idade ou com comorbilid­ades. Será mais fácil de implementa­r do que fazendo possíveis segmentaçõ­es entre homens e mulheres”, apontou, sendo secundado por Ana Espada de Sousa: "Temos de proteger as populações que têm comorbilid­ades, mais do que proteger homens em relação a mulheres".

A nível global, a pandemia de Covid-19 já provocou mais de 150 mil mortos e infectou mais de 2,1 milhões de pessoas em 215 países e território­s. Mais de 465 mil doentes foram considerad­os curados. Em Portugal, morreram 657 pessoas das 19.022 registadas como infectadas.

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