Quarentena traz sossego ao Kudimuena
Embora a maior incidência fosse de madrugada, os assaltos ocorriam também ao longo do dia, de acordo com o morador. A violação de mulheres de várias idades e o homicídio, para evitar testemunhos, faziam parte da estratégia dos meliantes, impondo assim o m
Moradores da zona do Kudimuena, bairro Prenda, distrito urbano da Maianga, vivem momentos de tranquilidade durante o período da quarentena, pois cessaram temporariamente os assaltos às residências. Até final de Março, meliantes semeavam terror e luto, na calada da noite. A situação era de tal ordem que obrigou alguns munícipes a mudarem de bairro, em busca de zonas que oferecem segurança e tranquilidade às suas famílias.
Situada a dois quilómetros e meio da ponte do Zamba II e a quinhentos metros da administração da Samba, a área do Kudimuena tem sido epicentro de uma onda de crimes perpetrados por meliantes armados que pela madrugada assaltam residências, com a finalidade de se apossarem de objectos de valor.
Carlitos Diogo, jovem nascido no Prenda, disse ao Jornal de Angola que até aos últimos dias que antecederam o Estado de Emergência, os habitantes do pequeno povoado não tinham sossego. Tendo como alvo preferencial o roubo de dinheiro, viaturas, televisores, telefones e cartões multicaixa, a acção dos assaltantes incluía a tortura dos moradores visados a fim de conseguirem os seus intentos, ou mesmo por pura crueldade.
Embora a maior incidência fosse de madrugada, os assaltos ocorriam também ao longo do dia, de acordo com o morador. A violação de mulheres de várias idades e o homicídio, para evitar testemunhos, faziam parte da estratégia dos meliantes, impondo assim o medo na comunidade. A reportagem do Jornal de Angola apurou que além do reforço do patrulhamento policial, o confinamento dos cidadãos, que limita obrigatoriamente a movimentação de pessoas e bens, sobretudo no período nocturno, tem contribuído em grande medida para a eficácia do combate e consequente diminuição da criminalidade no bairro.
"A prevenção, por conta da Covid-19 tem sido uma aliada à tranquilidade que a zona vive, pois,os crimes violentos deixaram de existir. E a falta de movimento nas ruas tem facilitado a acção de patrulhamento da polícia e dificultado desta forma as acções dos meliantes", testemunhou Carlitos Diogo.
Por tudo isso, o morador apela à acção redobrada da polícia, sobretudo no tocante aos patrulhamentos na localidade, pois os habitantes receiam que os assaltos retornem quando for levantado o Estado de Emergência. O nosso interlocutor revelou que mudou de bairro em 2017, depois de ter sobrevivido a três tentativasde assalto à sua residência, na zona do Kudimuena.
O último dos três intentos dos marginais foi determinante para a sua decisão de mudança de residência, confessou. “Só tenho meninas em casa e nesse dia estava de serviço. Por volta da uma da manhã, a esposa ligou aos gritos, informando que estavam a tentar arrombar mais uma vez o portão. Entrei em pânico, abandonei o serviço e cometi o erro de ir directo ao local do assalto.Acinquenta metros da minha residência ouvia o barulho do arrombamento e quando me aproximei, um dos meliantes que estava de plantão num canto, manipulou uma AKM e tive que correr para baixo, gritando por socorro aos vizinhos, até ser amparado pelo segurança de uma residência, próximo da Rua da Samba”.
A sua fuga e os gritos de socorro da família a partir do interior da residência, frustraram em certa medida as intenções dos meliantes que tiveram de se retirar.Carlitos Diogo assegura que as três tentativas de assalto criaram traumas às filhas, o que os levou a retirarem-se da casa própria e viver de aluguer noutra zona de Luanda, com melhor segurança.
Polícia reformado que integrou a unidade policial da antiga 8ª esquadra, actual 20ª Esquadra do Prenda, Man Calas, como também é conhecido, acredita que os meliantes que assaltam a zona do Kudimuena são indivíduos do bairro, associados
Numa manifestação de pura violência, um dos assaltantes partiu uma garrafa, usando parte da mesma para ferir as vítimas. Não parou a tarefa macabra até atingir com violência o pescoço do desditoso Joselson André que viria a falecer a caminho do hospital. “Era um bom rapaz que se converteu a Cristo há quatro anos. Nos tempos livres dedicava-se à evangelização e sensibilização de jovens que cometiam crimes diversos e consumiam drogas, a abandonarem tais práticas" referiu um morador
a elementos provenientes do Rocha Pinto. Alimenta ainda a esperança de voltar à casa própria, quando a tranquilidade voltar a reinar na zona.
Jovem de 23 anos morto em assalto
Joselson André, 23 anos de idade, foi uma das vítimas mortais mais recentes de que há registo. No início do mês de Março foi atingido com um objecto contundente (caco de garrafa) no pescoço, durante o assalto a uma residência.
Moradores da zona confirmam que o infortúnio aconteceu quando o jovem foi abordado, cerca das 23 horas,por oito indivíduos munidos de espingardas da marca AKM e facas, na casa de um dos seus irmãos da igreja. Na noite do infausto acontecimento, a vítima mortal, também conhecida por “Bebu o Evangelista” estava reunido com os irmãos da congregação religiosa. Surpreendidos e encurralados pelos meliantes, foram obrigados a deitar - se ao chão do quintal, tendo em seguida os meliantes exigido a entrega de todos os pertences.
Numa manifestação de pura violência, um dos assaltantes partiu uma garrafa, usando parte da mesma para ferir as vítimas. Não parou a tarefa macabra até atingir com violência o pescoço do desditoso Joselson André que viria a falecer a caminho do hospital. “Era um bom rapaz que se converteu a Cristo há quatro anos. Nos tempos livres dedicava-se à evangelização e sensibilização de jovens que cometiam crimes diversos e consumiam drogas, a abandonarem tais práticas" referiu um morador.
Após solicitar o anonimato, por temer pela própria vida, o nosso interlocutor conta que "durante o assalto, o Bebu reconheceu um dos integrantes da quadrilha”. Presume-se que esta terá sido a razão que levou os marginais a tirarem a vida ao jovem.
Fuga atrapalha acção dos marginais
Poucos dias antes, também no passado mês de Março, António José de 36 anos de idade foi surpreendido em casa a 1h30 da madrugada por dez indivíduos encapuzados, com armas de fogo do tipo AKM e pistolas de diversos calibres. A nossa reportagem interpelou António, poucos minutos após a chegada do mesmo à 20ª esquadra da Polícia Nacional (ex-8ª), situada no bairro Prenda, onde foi apresentar queixa.
Visivelmente traumatizado, contou que os meliantes usaram pedras enormes para arrombar as duas portas de ferro, que separam o pequeno quintal da sala. “Temia pela minha esposa e filha de sete anos. Levaram mais de vinte minutos a arrombar a primeira porta, fazendo durante este tempo vários disparos.
Enquanto derrubavam com violência a porta, gritei pedindo socorro aos vizinhos. Infelizmente ninguém pode fazer nada.”
“Para nos aterrorizar, quando já estavam a arrombar a porta da sala,proferiam palavras ameaçadores, dizendo que não adiantava gritar por socorro porque tinham a missão de nos matar”. Sem possibilidade de escapar pelas janelas da sala, ou do quarto, por estarem gradeadas, António José relatou que “quando estavam prestes a derrubar a porta que dá para o nosso quarto, fizeram mais disparos. Sem outras soluções, olhei para o tecto e disse à esposa que tinha que fugir em busca de ajuda. Não sei de onde veio a força e a coragem. Escalei até ao tecto e parti uma das chapas de lusalite, saindo escassos segundos antes dos bandidos entrarem no quarto. Encontraram apenas a esposa e a filha e apercebendo-se da minha fuga, resolveram perseguir-me de imediato pelo tecto”. Nessa madrugada, o assalto estendeu-se à mais três residências, num perímetro de quase 200 metros quadrados, controlado pelos meliantes.
António fugiu vestido apenas de roupa interior. Enquanto era perseguido, sobre os tectos de chapas de zinco e lusalite, entrelaçados por uma confusão de fios de energia eléctrica e escuridão, o assaltante munido de uma espingarda de marca AKM intimava-o a parar, ameaçando disparar contra si. A escuridão acabou por ser aliada importante, ajudando-o a escapar. Aterrou no quintal de um vizinho, onde se escondeu até a situação acalmar.
Em casa, os meliantes enfurecidos com a fuga, espancaram a esposa e a filha de sete anos. Só não fizeram pior, porque a esposa apresentou-lhes 100 mil kwanzas, montante que serviria para pagar a renda de casa, por mais seis meses. Além do dinheiro, levaram um televisor plasma, botija de gás e dois telefones. Retiraram-se por volta das 2h20 minutos, depois de terem tentado invadir três casas no mesmo perímetro, sem sucesso.
Quarenta minutos depois, agentes da Polícia Nacional destacados na esquadra móvel da zona do EMG, que fica a dois quilómetros de distância, apareceram, tomando nota do ocorrido. Ainda sob choque e visivelmente abatido, António manifestou a intenção de mudar de bairro naquele mesmo dia, em busca de segurança e tranquilidade em outras zonas de Luanda ou no interior do país. No dia seguinte, a nossa reportagem constatou que a casa de um quarto, sala, cozinha e casa de banho onde António vivia com a família, estava abandonada.