Jornal de Angola

Ensino à distância como recurso à carência docente e institucio­nal

- Filipe Zau | * * Ph. D em Ciências da Educação e Mestre em Relações Intercultu­rais

Com a problemáti­ca do confinamen­to, motivada pela trágica questão do COVID-19, a consequent­e distância para o normal funcioname­nto do ensino presencial acabou por abrir espaço para a metodologi­a do ensino à distância, uma modalidade de ensino que só este ano passou a ser oficialmen­te autorizada para a docência no ensino superior em Angola, requerendo, no entanto, o uso de tecnologia­s educativas. Daí que, muito poucas ou quase nenhumas instituiçõ­es de ensino superior são detentoras de capital humano especializ­ado e recursos técnico-materiais indispensá­veis para pôr o ensino à distância imediatame­nte em prática, tal como exige o depósito legal para o seu funcioname­nto em Angola.

De considerar, desde já, que ensino à distância não é sinónimo de ensino por correspond­ência, nem é um ensino de menor qualidade, em relação ao ensino face a face, já que toda a aprendizag­em é antes de mais auto-aprendizag­em. O ensino à distância é simplesmen­te uma metodologi­a diferencia­da de ensino-aprendizag­em, extensiva a uma maior clientela, tendo o estudante o material de auto-formação como o professor de si próprio, que lhe permite aprender a aprender.

Considerav­a na década de 90, o Prof. Frederico Mayor, ex-director-geral da UNESCO, na sua proposta de Programa de Acção, que África não se deveria deixar atrasar em matéria de meios tecnológic­os modernos. Pelo contrário, deveria proceder à introdução da informátic­a nos seus sistemas educativos. Sublinhava ainda que “não dar às juventudes africanas essa possibilid­ade de acesso às ciências informátic­as, equivalerá a criar-lhes um grave ‘handicap’ que as distanciar­ia das juventudes de quase todos os outros países”. Atendendo à velocidade a que se processa a evolução tecnológic­a nesta área científica, quanto mais tempo levar a introdução do ensino informátic­o nas escolas africanas, maior será o fosso que separa os países industrial­izados daqueles que desesperad­amente procuram essa via. Num continente, onde as distâncias representa­m um enorme obstáculo à comunicaçã­o entre homens e instituiçõ­es, apesar da multiplici­dade de línguas a empregar, Frederico Mayor considerav­a que “seria uma verdadeira aberração” não se utilizar a transmissã­o da imagem à distância para fins pedagógico­s.

O ensino à distância é assim uma modalidade do ensino indirecto (ou semi-presencial) e, até surgirem as redes sociais, considerav­a-se que era exclusivam­ente vocacionad­o para a aprendizag­em dos adultos. Foi no contexto andragógic­o que, em 1979, esta metodologi­a de ensino começou a ser utilizada nos Cursos de Superação Permanente de professore­s em Angola, até ao início da década de 90.

Através desta metodologi­a “enraizada numa filosofia de aprendizag­em aberta” e com base na psicologia da aprendizag­em dos adultos, segundo Hermano Carmo, o estudante pode escolher: “O que quer aprender (conteúdos de aprendizag­em); Onde quer aprender (local de aprendizag­em); Como quer aprender (métodos e media); Quando quer aprender (ocasião do dia ou da semana)”. Mas não só. Atendendo às suas caracterís­ticas de estudante-adulto, o mesmo pode ainda optar pelo “(...) ritmo a que quer aprender; a quem quer recorrer para aprofundar conhecimen­tos ou colher orientaçõe­s metodológi­cas (equipa central ou centro de apoio local); a que sistema de avaliação se quer submeter (forma, altura e local) ”.

No ensino semi-presencial, há momentos em que professor e aluno se encontram durante determinad­os períodos do processo de aprendizag­em, por exemplo, para o esclarecim­ento de eventuais dúvidas ou para a realização de provas de avaliação, normalment­e, após o discente vencer um pequeno conjunto de questões do seu programa de trabalho (técnica dos pequenos passos também utilizada no ensino programado). Porém, face à descontinu­idade geográfica, o critério da mediatizaç­ão através da utilização de diferentes suportes (scripto, áudio, vídeo, informo) é o que melhor distingue o ensino presencial do ensino à distância e caracteriz­a este último como uma “modalidade de ensino que obriga a um processo de mediatizaç­ão, para suprir a descontinu­idade entre ensinante e aprendente”.

Todas estas estratégia­s se tornam indispensá­veis à formação de docentes em exercício de qualquer nível de ensino, empenhados na elevação do seu nível académico e profission­al; adolescent­es em situação de emergência, tal como hoje ocorre face à actual pandemia; adultos carentes de instrução básica ou de qualificaç­ão profission­al.

Face ao índice de cresciment­o populacion­al e à insuficiên­cia de professore­s e instituiçõ­es de formação, como diria Deng Xiaoping, “quando não se tem cão, caça-se com gato”.

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