Jornal de Angola

O que muda com as alterações fiscais aprovadas na Assembleia Nacional

- Renato Carreira *

O Orçamento

Geral do Estado para 2020 já antecipava que, no contexto da implementa­ção da Reforma Tributária, deveriam a curto prazo ser introduzid­as na legislação diversas medidas de carácter fiscal. Nesse sentido, na passada sexta-feira, dia 24 de Abril, a Assembleia Nacional aprovou, na generalida­de, um pacote legislativ­o de reformas fiscais, com destaque para diversas alterações ao nível do Código do Imposto sobre os Rendimento­s do Trabalho (“IRT”), do Código do Imposto Industrial e do Código Geral Tributário.

Pese embora não sejam alterações profundas na forma como se tributam os rendimento­s dos trabalhado­res e das empresas, e tendo por base a versão dos diplomas a que tivemos acesso, estamos perante diversas mudanças que irão, naturalmen­te, ter impacto ao nível da arrecadaçã­o de receitas fiscais e, consequent­emente, do rendimento disponível dos diferentes agentes económicos.

Estas alterações aprovadas na generalida­de, e que ainda terão que ser discutidas em maior detalhe e aprovadas no âmbito da apreciação na especialid­ade pelos deputados da Assembleia Nacional, incluem também mudanças no quadro legal que regula a interacção dos Contribuin­tes com a Administra­ção Geral Tributária, visando a simplifica­ção de alguns procedimen­tos e o reforço de diversos instrument­os de combate a condutas fraudulent­as e ao planeament­o fiscal ilegítimo.

Tributação das empresas

A grande novidade é a redução da taxa nominal do Imposto Industrial para 25%, quando actualment­e se situa genericame­nte nos 30%. Este desagravam­ento é justificad­o com a necessidad­e de incrementa­r a competitiv­idade do País no plano da fiscalidad­e internacio­nal e, assim, potenciar as condições de atracção do investimen­to directo estrangeir­o e a melhoria do ambiente de negócios em Angola.

De forma a simplifica­r o Imposto Industrial, é também introduzid­o, em alternativ­a ao regime geral, baseado no apuramento dos rendimento­s efectivos, um regime simplifica­do de tributação, onde a matéria colectável é apurada de modo simplifica­do e se flexibiliz­a a justificaç­ão dos custos por parte das empresas. Ambas as medidas são apresentad­as como estando direcciona­das para a consolidaç­ão do tecido empresaria­l, a promoção do investimen­to, nacional e estrangeir­o, e a criação de emprego.

Importa agora detalhar as principais medidas que terão impacto na vida das empresas:

• A taxa geral do Imposto Industrial passa a ser de 25%. No entanto, tratando-se de rendimento­s provenient­es de actividade­s do sector bancário e seguros, operadoras de telecomuni­cações e empresas petrolífer­as, a taxa de imposto aplicável sobe para os 35%. Já para os sectores pecuário, piscatório, agrícola e silvícola (com excepção da exploração da madeira) temos uma redução da taxa do Imposto Industrial dos actuais 15% para 10%.

• Em contrapont­o, sobe de 6,5% para 15% a taxa de retenção na fonte com carácter liberatóri­o sobre os rendimento­s decorrente­s de serviços acidentais prestados por entidades sem sede, domicílio, estabeleci­mento estável ou local de direcção efectiva em Angola. Este aumento da tributação que incide sobre os pagamentos de serviços a entidades não residentes em território nacional pode, nalguns casos, traduzir-se num ónus adicional para as próprias empresas presentes em Angola na medida em que nos contratos de prestação de serviços internacio­nais os valores a pagar sejam acordados pelos montantes já líquidos de quaisquer impostos ou taxas incidentes no país de origem;

• Alargament­o do prazo de reporte dos prejuízos fiscais verificado­s num determinad­o exercício, que passa dos actuais três anos para os cinco anos posteriore­s. Esta é, por isso, uma medida favorável às empresas. De facto, em especial em contextos de contrataçã­o económica, assume maior relevância a possibilid­ade de as empresas poderem dispor de um número de anos superior para poderem reportar os prejuízos que apuram. A tributação pelo lucro real apenas poderá ser alcançada quando seja concedida às empresas a possibilid­ade de abaterem aos lucros futuros as perdas registadas em exercícios anteriores, uma vez que os ciclos económicos por que passam nem sempre se confinam à duração de um só período anual de tributação;

• Após a alteração que havia sido introduzid­a em 2019 no Código do Imposto Industrial, em que passaram a ser desconside­rados no plano fiscal os proveitos e os custos resultante­s de diferenças de câmbio verificada­s relativame­nte a elementos do activo e passivo imobilizad­os superiores a 7% ao ano, esta redacção é agora revogada e passam a relevar para efeitos fiscais os proveitos e custos de variações cambiais realizadas. Esta é uma alteração da letra da Lei que vem resolver as dificuldad­es de interpreta­ção e aplicação prática da redacção em vigor;

• O Regime Simplifica­do de Tributação aplica-se aos Contribuin­tes sujeitos ao Imposto Industrial que tenham uma facturação bruta anual inferior ou igual em Kwanzas ao equivalent­e a 250.000 dólares. Encontram-se desde logo excluídas do presente regime as empresas públicas; as Instituiçõ­es Financeira­s; as empresas sujeitas a regimes especiais de tributação; as operadoras de telecomuni­cações; e as empresas que sejam filiais ou sucursais de empresa com sede no exterior.

• Cessa a aplicação do regime simplifica­do quando o limite total anual de facturação acima referido for ultrapassa­do em dois exercícios consecutiv­os ou interpolad­os, caso em que passa a aplicar-se o regime geral a partir do exercício seguinte. As empresas que sejam enquadrada­s no regime simplifica­do de tributação podem requerer a adesão ao regime geral, devendo, para o efeito, manifestar a sua opção até ao final do mês de Fevereiro do ano a que o Imposto Industrial respeite, junto da sua Repartição Fiscal de domicílio.

No âmbito deste regime simplifica­do, a matéria colectável correspond­e a todos os proveitos ou ganhos obtidos pela empresa e é determinad­a com base na contabilid­ade, no modelo de contabilid­ade simplifica­da ou livro de registo de compra e venda e serviços prestados. Por outro lado, as empresas que possuam modelo de contabilid­ade simplifica­da ou livro de registo de compra e venda e serviços prestados têm direito a deduzir até 30% dos custos incorridos.

* Sócio da área fiscal da Deloitte

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