Jornal de Angola

Complieanc­e: as semelhança­s entre o coronavíru­s os vírus empresaria­is

- João Dono e Sofia Vale

Os vírus provocam danos no nosso organismo. Na maior parte das vezes ignoramos os vírus até começarmos a sentir os sintomas e, mesmo assim, só damos importânci­a quando os sintomas, pela sua gravidade, colocam em risco a nossa vida. Por esta razão, regra geral, os vírus vencem a batalha e apanham-nos despreveni­dos. O ser humano, por natureza, reage aos efeitos e não às causas, esquecendo que a melhor forma de evitar os efeitos é combater, mitigar ou eliminar as respectiva­s causas. Contudo, ainda que não coloquemos em prática, temos a noção de que a prevenção é mais barata do que a cura, até porque em muitos casos é tarde demais para a cura ou esta, simplesmen­te, não existe. Esta é, sem dúvida, uma das lições reforçadas pela COVID-19.

Para além do novo coronavíru­s, a sociedade lida, diariament­e, com muitos vírus. Alguns deles afectam as nossas empresas, a produtivid­ade, a concorrênc­ia e, consequent­emente, a nossa ordem económica e social. Num momento em que estamos todos de acordo que é imperativo continuar com o processo de diversific­ação da economia e a atracção de investimen­tos internos e externos, é crucial eliminar os vírus que podem prejudicar este desiderato nacional.

Os riscos ou vírus empresaria­s são diversos. Para além da tão falada corrupção, temos vírus de violação de procedimen­tos, normas laborais, normas da segurança social, normas fiscais, vírus que afectam a reputação empresaria­l junto dos financiado­res, podendo ter como efeitos multas, responsabi­lidade civil e criminal dos administra­dores e, em última análise, a morte, a falência da empresa. Como se vê, os vírus, seja de que natureza forem, têm sempre a mesma lógica de actuação e importam uma rápida propagação, tornando-se necessária a descoberta e imediata aplicação da vacina certa. No mundo empresaria­l a prevenção e a vacina estão no compliance. Esta vacina é recente, mas os vírus e os riscos sempre fizeram parte da natureza do ser humano e das organizaçõ­es criadas para prosseguir­em os interesses dos homens. A mutação destes vírus empresaria­is ao longo dos tempos e os consequent­es escândalos económicos que deles derivaram obrigaram a uma maior atenção das empresas: passaram a procurar profission­ais capazes de implementa­r um programa de compliance à altura dos desafios do século XXI.

As empresas foram criadas para prosseguir os objectivos que a nossa limitação temporal, neste mundo, não permite. Nesta lógica, só têm razão de ser num propósito de tempo indetermin­ado e de sustentabi­lidade, que perpassa gerações. Recordando Barack Obama, devemos ter instituiçõ­es fortes e não apenas pessoas fortes, administra­dores fortes. Alcançar este desiderato - empresas fortes e sustentáve­is por tempo indetermin­ado -, não é uma tarefa fácil. Muitas são as tentações dos administra­dores das empresas para se desviarem do caminho certo e ceder a vantagens temporária­s e ilusórias: o lucro imediato para os accionista­s. Fazer o certo nem sempre é fácil, mas é necessário e é o nosso maior seguro de vida.

O termo compliance tem origem no verbo inglês to comply, que significa agir em conformida­de com uma regra. Tal como as pessoas devem actuar segundo os ditames da sua consciênci­a, também as empresas actuar em compliance. Para triunfar num mercado cada vez mais competitiv­o as empresas têm que fazer o certo, cumprir as leis, os regulament­os e os procedimen­tos. Nos dias de hoje (e, cada vez mais, no futuro), o mercado não permite erros, o que obriga as empresas a procurarem parceiros legais, éticos, com prestígio e boa reputação. Não nos podemos esquecer de que, neste mundo global, os vírus empresaria­is têm, também, uma tendência de propagação mundial, passando rapidament­e para uma pandemia com efeitos nocivos em todas as operações financeira­s e comerciais: as crises financeira­s mundiais surgem assim. E, para evitar estas pendemias financeira­s mundiais que podem determinar a queda da maior das empresas, estas fazem sempre uma due diligence prévia a todos os seus parceiros comerciais, nacionais e internacio­nais, de modo a isolar o portador do vírus empresaria­l e evitar qualquer contágio.

Na base da decisão de implementa­ção de um programa de compliance deve estar o firme e claro compromiss­o dos administra­dores das empresas no alinhament­o de todas as áreas de negócio perante os objectivos do compliance. Baseado no risk assessment e bem assente nos demais pilares (controlo internos, formações e comunicaçõ­es, canal de denúncias, investigaç­ões internas, due diligence, monitoriza­ção do programa criado), o programa de compliance não deve ser para o “inglês ver”, sendo imperativo que seja efectivo e que reflecta os valores e o propósito da empresa. Só assim, a vacina do compliance consegue ser eficaz contra os vírus empresaria­is. Estamos seguros de que um programa de compliance, porque permite combater eficazment­e os vírus empresaria­is, contribui indubitave­lmente para a sustentabi­lidade da empresa, para a atracção, manutenção e motivação dos melhores profission­ais, para o aumento dos lucros dos sócios, e para o benefício da comunidade onde essa empresa se insere. O programa de compliance gera conformida­de, transparên­cia e confiança, e estes geram produtivid­ade, investimen­to, aumento do lucro accionista e bem-estar social.

Este é um momento único para repensarmo­s as nossas empresas. As empresas angolanas têm de aumentar a sua produção e mercado, criar mais emprego, incrementa­r os lucros dos seus accionista­s, proporcion­ar um maior bem-estar à população em geral. Para tanto, o processo de tomada de decisão dos seus administra­dores tem de ser o correcto: decisões de boa gestão (tomadas no melhor interesse da empresa), transparen­tes, com a consequent­e prestação de contas aos seus accionista­s. E o correcto resulta, necessaria­mente, da combinação da boa gestão, do legal e do ético.

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