Complieance: as semelhanças entre o coronavírus os vírus empresariais
Os vírus provocam danos no nosso organismo. Na maior parte das vezes ignoramos os vírus até começarmos a sentir os sintomas e, mesmo assim, só damos importância quando os sintomas, pela sua gravidade, colocam em risco a nossa vida. Por esta razão, regra geral, os vírus vencem a batalha e apanham-nos desprevenidos. O ser humano, por natureza, reage aos efeitos e não às causas, esquecendo que a melhor forma de evitar os efeitos é combater, mitigar ou eliminar as respectivas causas. Contudo, ainda que não coloquemos em prática, temos a noção de que a prevenção é mais barata do que a cura, até porque em muitos casos é tarde demais para a cura ou esta, simplesmente, não existe. Esta é, sem dúvida, uma das lições reforçadas pela COVID-19.
Para além do novo coronavírus, a sociedade lida, diariamente, com muitos vírus. Alguns deles afectam as nossas empresas, a produtividade, a concorrência e, consequentemente, a nossa ordem económica e social. Num momento em que estamos todos de acordo que é imperativo continuar com o processo de diversificação da economia e a atracção de investimentos internos e externos, é crucial eliminar os vírus que podem prejudicar este desiderato nacional.
Os riscos ou vírus empresarias são diversos. Para além da tão falada corrupção, temos vírus de violação de procedimentos, normas laborais, normas da segurança social, normas fiscais, vírus que afectam a reputação empresarial junto dos financiadores, podendo ter como efeitos multas, responsabilidade civil e criminal dos administradores e, em última análise, a morte, a falência da empresa. Como se vê, os vírus, seja de que natureza forem, têm sempre a mesma lógica de actuação e importam uma rápida propagação, tornando-se necessária a descoberta e imediata aplicação da vacina certa. No mundo empresarial a prevenção e a vacina estão no compliance. Esta vacina é recente, mas os vírus e os riscos sempre fizeram parte da natureza do ser humano e das organizações criadas para prosseguirem os interesses dos homens. A mutação destes vírus empresariais ao longo dos tempos e os consequentes escândalos económicos que deles derivaram obrigaram a uma maior atenção das empresas: passaram a procurar profissionais capazes de implementar um programa de compliance à altura dos desafios do século XXI.
As empresas foram criadas para prosseguir os objectivos que a nossa limitação temporal, neste mundo, não permite. Nesta lógica, só têm razão de ser num propósito de tempo indeterminado e de sustentabilidade, que perpassa gerações. Recordando Barack Obama, devemos ter instituições fortes e não apenas pessoas fortes, administradores fortes. Alcançar este desiderato - empresas fortes e sustentáveis por tempo indeterminado -, não é uma tarefa fácil. Muitas são as tentações dos administradores das empresas para se desviarem do caminho certo e ceder a vantagens temporárias e ilusórias: o lucro imediato para os accionistas. Fazer o certo nem sempre é fácil, mas é necessário e é o nosso maior seguro de vida.
O termo compliance tem origem no verbo inglês to comply, que significa agir em conformidade com uma regra. Tal como as pessoas devem actuar segundo os ditames da sua consciência, também as empresas actuar em compliance. Para triunfar num mercado cada vez mais competitivo as empresas têm que fazer o certo, cumprir as leis, os regulamentos e os procedimentos. Nos dias de hoje (e, cada vez mais, no futuro), o mercado não permite erros, o que obriga as empresas a procurarem parceiros legais, éticos, com prestígio e boa reputação. Não nos podemos esquecer de que, neste mundo global, os vírus empresariais têm, também, uma tendência de propagação mundial, passando rapidamente para uma pandemia com efeitos nocivos em todas as operações financeiras e comerciais: as crises financeiras mundiais surgem assim. E, para evitar estas pendemias financeiras mundiais que podem determinar a queda da maior das empresas, estas fazem sempre uma due diligence prévia a todos os seus parceiros comerciais, nacionais e internacionais, de modo a isolar o portador do vírus empresarial e evitar qualquer contágio.
Na base da decisão de implementação de um programa de compliance deve estar o firme e claro compromisso dos administradores das empresas no alinhamento de todas as áreas de negócio perante os objectivos do compliance. Baseado no risk assessment e bem assente nos demais pilares (controlo internos, formações e comunicações, canal de denúncias, investigações internas, due diligence, monitorização do programa criado), o programa de compliance não deve ser para o “inglês ver”, sendo imperativo que seja efectivo e que reflecta os valores e o propósito da empresa. Só assim, a vacina do compliance consegue ser eficaz contra os vírus empresariais. Estamos seguros de que um programa de compliance, porque permite combater eficazmente os vírus empresariais, contribui indubitavelmente para a sustentabilidade da empresa, para a atracção, manutenção e motivação dos melhores profissionais, para o aumento dos lucros dos sócios, e para o benefício da comunidade onde essa empresa se insere. O programa de compliance gera conformidade, transparência e confiança, e estes geram produtividade, investimento, aumento do lucro accionista e bem-estar social.
Este é um momento único para repensarmos as nossas empresas. As empresas angolanas têm de aumentar a sua produção e mercado, criar mais emprego, incrementar os lucros dos seus accionistas, proporcionar um maior bem-estar à população em geral. Para tanto, o processo de tomada de decisão dos seus administradores tem de ser o correcto: decisões de boa gestão (tomadas no melhor interesse da empresa), transparentes, com a consequente prestação de contas aos seus accionistas. E o correcto resulta, necessariamente, da combinação da boa gestão, do legal e do ético.